30/09/2017

begin again: capítulo 7


Nove anos antes

Está escuro aqui. Sombrio e úmido, barulhento e vivo. O suor paira no ar como uma névoa. Dançamos loucamente, nosso cabelo chicoteando pelo rosto em mechas molhadas e embaraçadas. Gotas de suor salpicam nossa testa e em cima dos nossos lábios. Corpos pressionam ao meu redor de todos os lados quando levantamos nossas mãos no ar, rindo, gritando e dançando com a batida hipnótica.
Adoro todos eles. Adoro todo mundo aqui. Não consigo entender como as guerras acontecem, como existe ódio, porque essas pessoas são perfeitas, bonitas, incríveis. Não conheço a maior parte delas, mas quando cruzamos olhares, sorrimos com dentes à mostra, e uma onda de emoção percorre meu corpo. Meu coração está tão cheio que acho que poderia explodir.
Sinto braços enlaçarem minha cintura, um corpo duro pressionando minhas costas. Derreto-me nele, coloco as mãos para trás, passo os dedos no cabelo curto, molhado. Sinto nitidamente seu perfume. A pele macia, almíscar misturado com o aroma fraco do pós-barba. Ele sobe as mãos pela minha cintura, roçando os dedos até meu tórax, depois sustenta meus seios, pressionando os polegares nos meus mamilos já duros. Quando arqueio as costas numa resposta ofegante, posso sentir sua ereção pressionada à lateral do meu quadril. Ele começa a beijar a pele sensível de meu pescoço e acho que estou prestes a explodir.
Eu o amo.
É só nisso que consigo pensar quando ele se esfrega em mim e giro a cabeça até que meus lábios encontrem os dele. São macios, suaves e se mexem lentamente na minha boca e praticamente imploro para ele deslizar a língua para dentro. Ele não tem pressa, respirando em mim, provando minha pele, murmurando, nos meus lábios, palavras que não consigo entender.
De repente, ele me gira até nossos corpos estarem apertados um contra o outro de frente, unidos numa coisa só pelas pessoas que nos circundam por todos os lados. Enlaça os dedos pelo meu cabelo úmido, inclinando minha cabeça até que se encaixe na dele como uma luva. E nos beijamos e nos tocamos e giramos por longos minutos ou horas ou dias até ficarmos sem fôlego, necessitados. Sabemos que devemos sair ou transar aqui mesmo nessa balada. Ele encobre minhas mãos nas suas e me puxa pela multidão. É como andar na lama grossa; estamos lutando contra a maré e, mais do que algumas vezes, temos de parar e sair de novo. Cada vez sinto meu coração bater um pouco mais rápido, quando os dedos de Joseph apertam lugares que pulsam, ondulam e imploram que ele me dê mais.
Toda vez que nos beijamos, cores explodem em minha mente como fogos de artifício, que sinto me queimarem desde meu couro cabeludo até a ponta dos meus dedos do pé.
De alguma forma, voltamos para o quarto dele. Joseph acende as luzes e pisco rapidamente, pois o brilho fere meu cérebro. Vou andando com passos incertos, mas meu caminho é impedido por uma miríade de telas meio pintadas apoiadas nas paredes, gaveteiros e até mesmo um estrado de cama. A profusão de cores toma meus sentidos de assalto e me faz querer chorar.
Então ele me toca de novo. Me puxa em cima de sua cama meio arrumada, chutando os cobertores amassados para baixo, e assim ficamos apenas nós e o colchão, a paz e o amor. Ele passa horas para me despir, leva longos minutos para beijar e lamber cada polegada recém-exposta da minha pele. Quando seus olhos encontram os meus, vejo a concentração por trás de sua expressão vítrea, como se ele estivesse determinado a não perder um único pedaço do meu corpo. Seus lábios são lentos, macios, gentis e provocam uma sensação do paraíso. Quando estamos nus, ele pressiona o corpo no meu e parece que somos feitos de carne líquida, fundindo-nos um ao outro, e o conceito de “nós” parece ser algo externo. Somos nós, eu, ele, Joseph e Demi, uma só pessoa, um só corpo, um só coração, um só fôlego.
Assim que ele entra em mim, sinto cada centímetro seu deslizar no meu interior. Agarro-me a ele com força, minha boca pressionada contra a sua, beijando-o, sentindo-o, aceitando-o. Quando ele desliza dentro de mim, com gritos ásperos e sem fôlego, sei que vai ser melhor do que qualquer droga.
E logo estamos indo e vindo, com corpos líquidos, músculos doloridos. Sua respiração é a minha quando nossas bocas se movem juntas, e o prazer é tão intenso que quase dói. Então, quando os fogos de artifício explodindo por trás das minhas pálpebras bem fechadas se misturam nas sombras, sinto os lábios dele na minha bochecha, macios, suaves. Gemidos cálidos roçam minha pele.
– Demi.
Amaneira como ele diz faz meus olhos arderem. Reverente. Assombrado.
Somos todos braços e pernas entrelaçados. Unidos pelo amor louco e melado de tão doce. Centenas de pequenas descargas elétricas pulsam quando ele sai de mim, meu corpo ainda zunindo de prazer. Adormecemos, uma confusão de pele quente e suspiros profundos, nossos corpos encharcados de suor. Quando acordamos de manhã, a luz pálida da madrugada infiltrando-se pelas cortinas semicerradas, ainda estamos retorcidos um no outro, como se fôssemos uma única pessoa.
Antes mesmo de ficarmos totalmente sóbrios, consigo sentir que tudo mudou. Já não sou a garota que eu costumava ser.
Porque, agora, sou a garota dele.

um capítulo especial de Jemi a nove anos atrás, e aí gostaram?
me digam o que acham nos comentários, ok?
você já ouviram o hino que é o álbum da Demi? estou apaixonada.
e essa história da música ruin the friendship ser para o nick? estou passada.
espero muito que vocês gostem, volto em breve.
respostas do capítulo anterior aqui.

26/09/2017

begin again: capítulo 6


Pub

– Tem certeza de que não quer vir? Drew não vai se importar com uma pessoa a mais se eu ligar para ele. – Simon fecha a valise e olha para mim com expectativa. – Deixo você segurar minha arma.
– Bela oferta.
Ele está sendo mais doce do que o habitual. Sei que está ansioso há muito tempo para o fim de semana com seus garotos. Vão caçar tetrazes, ou algo parecido. Eu realmente não estava prestando atenção.
– Vá você e se divirta. Selena me convidou para ficar lá no fim de semana. – eu estava ansiosa, tanto quanto Simon estava pela caçada.
– Vou sair depois do almoço no domingo. – ele levanta a maleta da cama e se inclina para frente para me abraçar. Quando se afasta, há um leve sorriso no rosto. – Tente não se meter em nenhuma confusão.
– Quanta confusão eu posso conseguir em um fim de semana?
– Muita. – ele parece melancólico. Por um momento, eu me pergunto se realmente confia em mim. Desde que nos casamos, não fiz nada para causar problemas a nenhum de nós. Deixei aquela garota para trás há anos, embora, às vezes, especialmente nos últimos tempos, eu sinta falta dela. Simon simplesmente sorri e dá um beijo rápido na minha bochecha. Quando estou na porta e o vejo subir no carro esporte, fico me perguntando por que meu estômago se revira. Talvez eu vá sentir mais falta dele do que me dou conta.
Depois que Simon vai embora, tomo um banho rápido e visto uma roupa. Poucos minutos depois das 20h, saio de casa e vou para a estação de metrô no final da nossa rua. A plataforma está cheia de gente, algumas vestidas como eu, para uma noite casual, outras ainda com o visual de trabalho, indo para casa depois de um longo dia. É um microcosmo de cidade grande: pessoas e nacionalidades de todos os tipos, todas apertadas no espaço pessoal umas das outras.
O George & Dragon, uma alusão a São Jorge e o dragão, fica na beira de uma praça verde arborizada. O edifício vitoriano é decadente e está caindo aos pedaços. A placa pintada do pub, representando o momento em que São Jorge finalmente dá o golpe de misericórdia se balança suavemente na brisa noturna. Assim que abro a porta pesada de madeira, sou atingida pelo ar quente cheirando a mofo e pelo barulho de uma dúzia de conversas. Passando os olhos pelo salão, procuro por Selena, tentando não parecer muito fora de lugar.
O George é um tipo de pub sujo e rude. Não sucumbiu à valorização imobiliária da região que o circunda, embora a clientela seja uma interessante mistura dos frequentadores habituais e de alguns jovens modernos. Os mais velhos se sentam no bar público, evitando cuidadosamente o salão, que é onde estou agora, olhando para o palco no canto, que já está montado para a banda.
Bateria, guitarra e microfone estão todos pacientemente à espera de que seus donos retornem.
Faz muito tempo que estive em algum lugar como este. Desistir de bares temerários foi um efeito colateral do meu casamento tanto quanto me certificar de sempre depilar as pernas e nunca soltar gases perto de Simon. No entanto, acho que senti falta disso. Uma onda de expectativa nervosa enche minhas veias conforme vou me infiltrando na multidão de gente bebendo.
Eu os vejo em uma mesa no canto mais distante. Nicholas está sentado ao lado de Selena, seu braço casualmente dependurado no encosto da cadeira, a outra mão em volta de um copo de cerveja cheio de água. Tenho um carinho por Nicholas. Ele e Selena me acolheram em suas vidas num momento em que eu estava no fundo do poço. Naquela época, eles falavam comigo durante a noite, antes de gentilmente me cobrirem com uma manta de algodão macia durante minhas crises de choro até eu pegar no sono. São boas pessoas; fico um pouco com raiva de mim mesma por tê-los negligenciado. Vivi com eles por mais de um ano, após conseguir fugir de uma casa invadida. Foi provavelmente o melhor ano da minha vida.
Até eu conhecer Simon, lembro-me.
É Nicholas quem me vê primeiro. Um sorriso enorme divide seu rosto atrevido e ele se levanta, caminha até mim e me envolve em um abraço de urso assim que estamos próximos o bastante. Retribuo o afago, sentindo um misto de alívio e alegria. Realmente faz tempo demais.
– Por onde você andou, boneca? Senti sua falta – diz ele.
– Também senti a sua. – estou quase rindo. Ele é um sujeito excêntrico e gosta de se aproveitar desse fato tanto quanto possível. – Desculpe, me sinto muito mal por fazer tanto tempo que não nos vemos.
Sinto Nicholas encolher os ombros.
– Não se preocupe com isso, você andou ocupada. Mundos diferentes. Eu entendo.
Quando me afasto, me sinto arrependida. Porque ele está certo de muitas formas. Simon não estaria aqui nem pintado de ouro, mas eu me sinto em casa. Animada e nervosa. Jovem.
E gosto disso.
– Ei, você mudou o cabelo. – eu me estico para tocar seu topete preto e com gel. Está duro como uma tábua. No resto da cabeça, o corte é rente ao couro cabeludo. – Ficou ótimo.
– Você também mudou. – Nicholas dá um passo para trás e me mantém no comprimento do braço. Ele está me examinando, mas de uma forma que não parece sexual ou pervertida. Conheço essa postura, ele está se certificando de que estou bem. – Você ficou sóbria de verdade. Nada mal.
Adoro a forma como deslizamos facilmente para nossa velha rotina, como se eu não tivesse desaparecido da face da Terra dele por um ano. Acho que o fato de nós dois vermos Selena todos os dias, mesmo que não víssemos um ao outro, manteve a conexão ativa.
– Quando você vai tocar?
– Acho que daqui a uma hora. Quer uma bebida?
Sorrio.
– Eu aceito uma cerveja, por favor. – não me lembro da última vez em que bebi uma cerveja. Não me sinto bem com isso, parece quase ilícito. Como uma criança vasculhando o armário de bebidas dos pais.
– Vá lá e se sente, eu levo. – com um gesto de cabeça, ele indica a mesa onde Selena e os outros estão sentados. Começo a andar em direção a eles, sorriso ainda nos meus lábios, mas então eu paro de súbito onde estou. Inclinando-se sobre a mesa, alguns assentos, em frente à Selena, olhando para mim com os olhos semicerrados, não está outro senão Joseph Jonas.
Meu pulso acelera instantaneamente. Minha garganta se contrai até que seja doloroso sugar o ar por ela. Quando dou por mim, estou respirando mais rápido para compensar. Durante todo o tempo, fico paralisada no lugar, me perguntando o que diabos ele está fazendo aqui e por que diabos está olhando para mim desse jeito. Então Selena se vira e me olha, com um sorriso largo, e balanço um pouco a cabeça, tentando encontrar algum sentido no meu cérebro, algum movimento para meus membros.
É claro que ela gostaria de convidar Joseph para ir ao pub. Ele é um novo colega, recém-chegado na cidade e o projeto perfeito para ela e Nicholas assumirem. Se ele for algo parecido com o que costumava ser, artístico e carismático, os dois devem ter se apaixonado por ele.
É tão fácil.
De alguma forma, consigo me impulsionar e cruzar o salão. Inclino-me para baixo e abraço Selena, tentando não sentir ressentimento, me lembrando de que ela não faz ideia do fato de Joseph ser o cara que virou meu mundo de cabeça para baixo até que acabei parecendo um pano de prato úmido e usado. É claro que ela sabe o que aconteceu, ela é uma das poucas com quem eu me abri, mas acho que não cheguei a dizer o nome dele. Pois bem, por que eu deveria me sentir zangada por ela tê-lo convidado?
Fazia muito tempo que eu não me sentia assim tão confusa.
– Aqui, fique com esse. – Joseph se levanta e me oferece seu assento. Por alguma razão, seu gesto cavalheiro dói. Me faz querer ranger os dentes.
– Não se preocupe, vou pegar um banquinho. – olho em volta fracamente. O pub está lotado. Não há um lugar vago em parte alguma.
Ele não pretende aceitar um não como resposta, em pé, pegando a bolsa das minhas mãos. É grande e está pesada com as roupas e itens de higiene para a minha noite na casa de Selena. Ele a coloca no chão ao lado de seu assento agora vago. Engulo a irritação e me sento, espremendo-me na bordinha da cadeira.
– Posso dividir. – aponto para baixo, para a metade vazia da cadeira que estou oferecendo a ele.
Ele nega com a cabeça.
– Fico em pé numa boa.
– Ah, deixe disso, minha bunda não é tão grande. – assim que digo isso, Selena grita uma risada. Joseph sorri e balança a cabeça novamente, mas desta vez mais como se estivesse achando graça do que negando. Com dignidade, ele se senta ao meu lado, passando o braço esquerdo pelo encosto da cadeira, esticando a perna direita para se apoiar no chão. Ele está sentado perto. Tão perto que nossos quadris estão se tocando, e nossas coxas estão pressionadas uma contra a outra.
Dá para sentir o perfume de seu pós-barba, o hálito leve da cerveja que exala de seus lábios. O calor de seu corpo irradia através do tecido fino de sua camiseta. Provoca reações estranhas em mim. Meu coração ainda está disparado e minha boca secou. Os pelos nos meus braços estão em pé. Já dividi cadeiras antes, afinal, sou pequena e sou sempre a primeira a ter que me apertar, mas isso é diferente. Tento assumir o controle.
– Tudo bem?
– Estou bem, e você? – ele mexe o braço, e seus dedos roçam acidentalmente minha nuca.
– Desculpe.
– Não foi nada. – porque não foi. Consigo lidar com isso. Estou mais velha, casada. Não sou mais aquela garota que caiu aos pés de um estudante de arte bonito. – Não tem muito espaço aqui.
Nicholas me passa uma garrafa de Peroni, e noto sua testa franzir quando ele me vê sentada tão perto de Joseph. Estendo a mão esquerda para pegar a bebida, já que a direita está presa pelo corpo de Joseph, ainda que involuntariamente. Quando envolvo os dedos na garrafa, sinto-o se mexer ao meu lado.
– Você se casou. Aliança bonita. – não é uma pergunta, mas responde a várias das minhas. A maneira como ele fala, a entonação em sua voz, me diz que ele se lembra de mim. Embora seja difícil de acreditar que alguém pudesse se esquecer do que aconteceu naquele verão. Eu sei que não posso.
– Estou casada há dois anos.
– Onde está seu marido? – ele está fazendo aquilo de estreitar os olhos para mim. Repuxa sua testa e a deixa franzida numa careta. Linhas horizontais criam vincos em sua pele.
Começo a corar. Odeio que eu tenha quase vergonha de contar a ele sobre Simon. De admitir que me casei com um homem mais velho.
– Ele está fora. – não vou dizer que saiu para caçar tetrazes. Não vou. Talvez eu devesse ter orgulho de quem ele é, de quem nós dois somos, mas o choque entre meu passado e meu presente está deixando tudo esquisito.
– Que pena.
Faço que sim.
– Verdade.
– Ele é legal?
Começo a rir, porque essa é fácil.
– Claro que é. Se não fosse, eu não teria me casado com ele. De qualquer forma, você o conheceu na galeria.
Joseph franze todo o rosto em um esforço para se lembrar. Fico olhando para ele por um instante, absorvendo a imagem do maxilar talhado, das sobrancelhas grossas. Se é que é possível, ele apenas ficou mais glorioso com a idade.
Ele ainda está em silêncio, e fico com pena dele.
– Simon é o pai de Elise Gordon. Ele é dono da sua galeria. – tento ignorar a forma como as sobrancelhas grossas disparam para cima. Sinto que ele está me julgando. Começo a balbuciar para preencher o momento desconfortável. – Nós nos conhecemos em uma festa beneficente da clínica. Você iria gostar dele, eu acho. – mas que merda. Eu nem conheço esse cara que está sentado ao meu
lado. Não mais. Que direito eu tenho de supor que ele gostaria do meu marido ou não?
– Ele a faz feliz?
É a pergunta mais estranha. Dita baixinho, de uma forma que acaricia minha pele. Seu sotaque não diminuiu ao longo dos anos, desde que nos vimos pela última vez. Lembro-me do jeito como ele costumava sussurrar em meu ouvido.
A lembrança me faz querer suspirar.
– Ele cuida de mim. – não é mentira. Simon gosta de mim. Ele cuida de mim. Estou contente.
– Que bom.
Viro-me para olhar Joseph. Seus olhos de um verde profundo miram diretamente os meus. Nossos rostos estão a apenas centímetros de distância e posso sentir o calor de sua respiração na minha pele. Talvez eu esteja lendo todos os tipos de coisa na expressão dele que provavelmente não estão ali: acusações, recriminações, desculpas. Cada uma delas me faz ansiar por coisas que não posso ter. Ele está perto, muito perto. É como se estivesse me dominando, núcleo por núcleo. E, assim como anos antes, meus pensamentos são preenchidos por ele. Então, nossa conversa silenciosa é interrompida pelo primeiro acorde de uma guitarra, reverberando dos alto-falantes, e eu me vejo soltando um suspiro de alívio. Porque a emoção que percorre minhas veias parece mais potente do que qualquer droga que já tomei, e sinto que ele está me deixando desnuda.
Conforme a noite passa, vou ficando cada vez mais bêbada, encontrando consolo no fundo de uma garrafa de cerveja e em cada estalo de uma nova tampa. Selena me olha com preocupação e, de vez em quando, mostro um sorriso tranquilizador, tentando fazê-la entender que minha embriaguez não tem nada a ver com o abuso da substância e tudo a ver com fuga.
Assim que Nicholas começa a segunda metade de seu repertório, estou dançando na minha cadeira, aliviada por Joseph ter se mudado para um dos bancos agora vagos do outro lado da mesa, me dando espaço para respirar, para me mover, para sentir. Minha pele ainda formiga com a memória de sua proximidade, o que aumenta ainda mais meu barato. Estar perto dele faz com que me sinta com 19 anos outra vez. É algo que amo e que odeio.
– Está tudo bem? – Selena puxa a cadeira para perto da minha. – Você não está parecendo você mesma.
– Estou bem. Ótima. – mostro outro sorriso, mas não apaga a expressão preocupada no rosto dela.
– Você não costuma beber tanto. Pelo menos não ultimamente.
– Eu não costumo ter de me sentar ao lado de Joseph Jonas. – lamento as palavras assim que escapam dos meus lábios. Selena inclina a cabeça para a esquerda, me examinando com olhos sóbrios. Eu me remexo sob seu olhar.
– O que está acontecendo, Demi?
Dou uma olhada em Joseph, do outro lado. Ele está conversando com um amigo de Nicholas. Parece tão confortável, tão tranquilo. Existe uma certa aura em torno dele que atrai a gente. Por sorte, está longe o bastante de mim para eu falar sem que ele ouça.
– Eu estou fodida – admito, apoiando a cabeça na palma das minhas mãos.
– O que está acontecendo entre vocês dois?
– Nada. – dou um sorriso áspero. – Não agora.
Seus olhos se arregalam.
– Quando? Aconteceu alguma coisa na clínica?
Nego com a cabeça. Não estou tentando ser enigmática, só estou tendo dificuldade para encontrar as palavras certas.
– Antes. Na faculdade.
Selena conhece minha história. Ela me conhece.
– Joseph? Foi ele que... – sua voz some. Ela não precisa dizer mais nada, nós duas sabemos o resto da frase. Confirmo vigorosamente com a cabeça. Ela levanta o copo e vira o resto de sua Coca-Cola. – Ai, merda.
Eu a acompanho e termino minha quarta garrafa de Peroni. A cerveja esquentou de ficar em cima da mesa por um tempo, mas engulo mesmo assim. Gosto de sentir a cabeça zonza. Muito melhor do que o pânico e o nervosismo.
– Por que você não disse nada antes? – Selena sibila. – Você deveria ter me dito.
– Achei que eu poderia lidar com isso.
– Mas você não pode. Não sozinha. Essa situação toda, as lembranças, os sentimentos. Ah, Demi... – sua voz some de novo quando Nicholas se aproxima e a beija. Mordendo os lábios como se ela estivesse com medo de dizer qualquer coisa. Do jeito que o resto dos caras está rindo com Joseph, eles não fazem ideia do que está acontecendo aqui. Eu gostaria de deixar assim.
– Mais tarde – prometo. O jeito como ela me olha diz que ela vai me cobrar depois.
A festa continua pela noite. Somos expulsos do bar à uma da manhã e nos vemos caminhando de volta para o apartamento de Selena e Nicholas. Mesmo nas primeiras horas da madrugada a cidade parece viva, as ruas estão cheias de energia e expectativa. Nicholas e Selena foram na frente da van que levava os instrumentos, deixando-me com alguns dos amigos... e com Joseph Jonas. Ele está vestindo um moletom cinza-ardósia, fechado até o pescoço, além de jeans e Nike Air. Parece estranho olhar para ele e saber que já me apaixonei por esse cara, que passei horas embaixo dele, em cima dele e ao lado dele. Às vezes, estávamos tão chapados que nem conseguíamos saber que parte do corpo pertencia a quem.
– Quanto tempo faz que você trabalha na clínica? – ele pergunta.
– Já tem alguns anos. Comecei como voluntária, mas depois tive a sorte de receber uma oferta de emprego. Não paga muito, mas eu adoro. – dou de ombros. Nem me importo mais em fingir que não o conheço. Estou bêbada demais para isso.
– Acho que você não precisa do dinheiro. Com um marido rico e tudo mais. – suas palavras doem. Olho para ele, confusa. Ele está olhando para mim com aqueles olhos estreitos novamente.
– Eu não quis me casar com ele por causa do dinheiro – respondo.
– Então por quê?
Os outros se afastaram, estão lá na frente. Estamos ficando para trás. Percebo que estou me encolhendo para me afastar dele.
– Porque Simon cuida de mim. Ele nunca vai me ferir, ele me ama. – não
preciso acrescentar mais nada, a implicação está aí. Ele é tudo o que Joseph não era. Quando eu mais precisei dele. 
Quando ele precisou de mim.
– Você acabou de me dizer por que ele se casou com você. Não foi por isso que você se casou com ele. – sua voz é quase baixa demais. Tenho de me esforçar para ouvi-la. – Naquele verão... Deus, Demi. Tudo mudou. Eu esperava que você tivesse partido para uma aventura, seguido suas paixões. Em nenhum momento achei que você fosse se acomodar.
Giro a cabeça bruscamente, sentindo a raiva circular pelas minhas veias.
– Você não sabe nada sobre mim e Simon. Nada. – minha voz está carregada de fúria. – Uma pessoa morreu, Joseph. Não sei você, mas eu não superei isso tão facilmente. – está difícil de respirar. Memórias daqueles dias de verão, há nove longos anos, assaltam meus pensamentos. A dor, a saudade, as escolhas idiotas que eu fiz. O choque, o medo e a ambulância. Tudo aquilo foi culpa nossa. Naquele verão eu perdi tudo. Incluindo a mim mesma. – Percebi que você nunca mais me ligou. Você simplesmente desapareceu.
– Não desapareci. Eles me mandaram embora, exatamente como fizeram com você. Fiquei transtornado com tudo aquilo, nem conseguia pensar direito. Eu queria ligar para você, falar com você, ver se você estava bem. Mas depois que você fingiu não me conhecer...
Estou enjoada. A náusea começa a apertar meu estômago com garras ferozes.
– Eu não sabia o que fazer. Meu pai estava com muita raiva. Tudo estava uma merda. E você simplesmente apareceu com a porcaria do seu baseado na boca. – Paramos de andar. No meio de uma rua iluminada de Nova York , olhamos fixamente um para o outro com jeito acusatório. Envolvo os braços na minha barriga, como se isso fosse me proteger dele.
– Você partiu meu coração quando disse que não me conhecia. Passei as primeiras semanas em uma porra de uma bebedeira sem-fim. – Joseph desvia os olhos dos meus e baixa-os para os pés. Sua expressão muda. De repente, ele parece um menino, perdido, com medo, sozinho. – E então também acabei no hospital. Sempre que penso naquela época, em Digby, mexe comigo tudo de novo.
Lágrimas fazem minhas pálpebras arderem. Minha garganta está tão apertada que mal dá para pronunciar as palavras, mas de alguma forma eu consigo.
– Comigo também.

amores, resolvi postar hoje pois amanhã não irei conseguir passar por aqui.
Nicholas apareceu e eu amo a amizade deles.
teve momento Jemi e lembranças não muita boas do passado dos dois.
me digam o que acham nos comentários, ok?
espero muito que vocês gostem, volto em breve.
respostas do capítulo anterior aqui.

24/09/2017

begin again: capítulo 5


Hoje

Encontro-me com Daisy num café, em uma manhã úmida de terça-feira. Ela está sentada do lado de fora, em uma mesa bistrô de aço inoxidável sob o toldo. Um cigarro fumado pela metade está preso entre os dedos, e ela o leva aos seus lábios secos e rachados. Quando suga o filtro, suas bochechas se curvam para dentro. Quando ela expira, a fumaça se combina com o vapor que dança no ar.
– Gostaria de um café? – paro ao lado dela. Ela olha para cima, quase surpresa.
– Posso tomar uma Coca-Cola em vez disso? Estou de ressaca.
Quando volto para fora, ela terminou o cigarro. Está com o celular na mão, debruçada sobre ele. Seu cabelo liso e sem vida cobre os olhos. Coloco a Coca diante dela e minha xícara de café cheia demais em cima da mesa. Balança um pouco, o café transborda e derrama na superfície metálica, escorrendo na direção da extremidade do tampo.
– Como você está? – sento-me e tomo um gole de café. Está tão quente que queima meus lábios.
– Bem.
– E Charlotte?
Daisy desvia o olhar do telefone, o branco dos olhos está amarelado e há sombras escuras abaixo deles. Parece que ela passou semanas sem dormir.
– Ela está bem.
Ignoro o tom defensivo em sua voz. Ela me conhece por tempo suficiente para entender que não estou julgando. Também não sou a conselheira, apenas estou ali como amiga.
– Ela parecia melhor ontem, quando eu a vi – digo.
Daisy dá de ombros e abre a lata de Coca-Cola. O recipiente solta um silvado quando ela puxa o anel, e bolhas escapam da pequena abertura.
– Ela mal está falando comigo.
– Ela passou por muita coisa.
– Eu também.
Não sei como falar com Daisy quando ela está assim. Defensiva, lacônica, zangada com o mundo. Ela está sentindo pena de si mesma e quando está nesse estado de espírito não há como chegar até ela. A preocupação com Charlotte corrói meu estômago. Engulo outro gole de café. Com leite, açucarado exatamente do jeito que gosto. Mesmo depois de todos esses anos, tento manter meus estimulantes suaves. A droga mais forte que tomo hoje em dia é cafeína.
– Darren voltou.
Meu rosto perde o entusiasmo. Darren é seu namorado vai-e-volta e, mais importante, ele é um traficante. Não é pai de Charlotte, não sei se Daisy sequer sabe quem é , mas ele está no cenário por tempo suficiente para eu saber que significa más notícias. Péssimas notícias.
– Você já contou à Selena? – sei que a clínica tem de manter a confidencialidade dos pacientes, sempre que possível, mas também temos a obrigação de nos certificar de que Charlotte esteja em segurança. Vamos ter de envolver o serviço social novamente. Com certeza isso vai alienar Daisy e jogá-la nos braços de Darren. É um dilema de lógica circular e odeio essa situação, mas não existe outro jeito.
– Não. – ela toma mais um gole de Coca-Cola. Seus dentes são amarelos por causa das drogas e da falta de higiene. Sem pensar, passo a língua pelos meus próprios dentes incisivos. – E não vou contar – ela acrescenta.
– Você sabe que vou ter de contar a alguém.
A raiva cintila pelos olhos dela.
– Não vai porra nenhuma. Era para você ser minha amiga.
– Eu sou sua amiga. Você sabe minha opinião sobre Darren. Também sabe como Charlotte se sente. Da última vez que ele apareceu, ela acabou sozinha em casa por dois dias antes que alguém a encontrasse. – não acredito que voltamos a isso. Darren é um parasita. É como se ele tivesse um sexto sentido. Sempre que Daisy começa a melhorar, ele aparece e a seduz novamente. Ele a alimenta com drogas como se fossem doces e ela deixa.
Daisy revira os olhos.
– Desta vez ele está mudado. Ele me prometeu que vai ficar limpo. Desistir de traficar e tudo mais. Quer dar outra chance a nós dois.
Sinto vontade de chorar. Conheço a tentação das promessas, a esperança de que dessa vez vai ser diferente. Vi tantas vezes ao longo dos últimos anos. Nunca essas promessas foram mantidas.
– Você acredita mesmo nisso?
Ela afirma com a cabeça, olhando para as mãos.
– Ele me ama. E eu o amo. Dessa vez vai dar certo.
Quando bebo o último gole de café, me pergunto quanto tempo vai demorar para tudo explodir no rosto dela. Quando acontecer, sei que vou estar lá para ajudá-la a limpar tudo, exatamente como da última vez. Não é por causa dela, mas por Charlotte. A menina merece ter um pouco de estabilidade na vida. Quando chego à clínica, estou doente de preocupação por Daisy e Charlotte e preciso falar com alguém. Com Selena. Ela sempre foi minha voz da razão, uma amiga quando eu não tinha mais ninguém a quem recorrer. Vê-la quase todos os dias na clínica é uma das razões pelas quais estou mantendo o controle ultimamente.
No entanto, ela está com um cliente, então vou até o escritório e ligo para a assistente social de Charlotte. Grace O’Dell tem experiência, trabalha com muitos dos nossos pacientes, e conseguimos construir um bom relacionamento com ela. É de um tipo sem noção e, quando conto sobre Darren, ouço-a suspirar pelo telefone.
– Não acredito que ela seja tão idiota. Minto, acredito sim. Vou colocá-la na minha lista de visitas de hoje. – ouço Grace folhear papéis. – Tem espaço para Charlotte no clube depois da escola?
– Claro. – temos um máximo de quinze vagas, mas posso encaixá-la. Com muita frequência, pelo menos uma das crianças falta. – Se eu arranjar alguém para buscá-la, você informa a escola?
– Informo, vou ligar agora. Pelo menos ela vai ter um pouco de normalidade na vida, pobrezinha.
– Vamos fazer o que pudermos. Odeio a ideia de que ela ainda tenha de ir para casa depois. – em vez disso, quero embrulhá-la e levá-la comigo. É um pensamento perigoso. Tento acabar com ele antes que possa criar raízes.
– Você não pode estar presente o tempo todo. Lembra-se do que eu disse? Se você não se desligar, vai acabar queimando. E isso não vai fazer bem a nenhum deles. Aliás, nem a você.
– Eu sei. – minha voz é baixa. Se eu fizesse do meu jeito, minha casa ficaria cheia dessas crianças. Mas o serviço social não funciona assim. Nem Simon. Ele
nunca me deixaria levá-los para casa.
– Quando você vai vir para o lado negro, hein? – há um tom de provocação em sua voz. Um sorriso tenta puxar o canto da minha boca, mas não funciona.
– A força é muito poderosa.
Grace ri.
– Alguns anos na universidade, jovem aprendiz Jedi. Aí você vai poder ser igual a mim. Máscara preta e tudo mais.
– Estou velha demais para ser aluna. – não digo a ela que já tentei antes. Que fui embora sob suspeita, com muito mais do que o rabo entre as pernas.
– Você é um bebê. Tem a vida inteira pela frente. Você daria uma boa assistente social, assim que nós a ensinássemos a não se apegar tanto.
– Você não poderia me ensinar isso.
– Quer tentar?
Conversamos por mais alguns minutos e eu desligo, sentindo a ansiedade ainda no fundo da barriga. É difícil não me sentir um pouco culpada por ter falado sobre Daisy, sabendo que isso quase certamente vai afastá-la de Charlotte outra vez. Não importa que sua mãe seja uma porcaria, Charlotte vai me odiar se descobrir. Abaixo a cabeça até apoiá-la nas mãos e deixo escapar um suspiro baixo. Meu corpo inteiro dói, como se eu tivesse passado a manhã fazendo exercícios físicos intensamente. Esfrego os olhos com as palmas das mãos.
– Oi.
Olho para cima. Minha testa franze quando vejo Joseph em pé na porta. Já está na hora? Cristo, onde foi parar o dia?
Não consigo me acostumar a vê-lo novamente.
– Oi. Você chegou cedo.
O canto de seu lábio se curva para cima.
– Eu queria ter a certeza de estar preparado. – ele olha para mim, depois faz um gesto para os próprios olhos. – Você está com rímel debaixo...
Ai, Deus. Esfregar os olhos deve ter me deixado parecendo uma palhaça. Passo o dedo sobre as pálpebras inferiores. Quando tiro a mão, o dedo está manchado de tinta preta.
– Obrigada.
Seu sorriso apenas se alarga.
– De nada.
Por um minuto, quero apagar aquele sorriso arrogante da boca dele. Senhor perfeitinho, droga. Seu cabelo é imaculado, seu rosto é bronzeado. Seu maxilar é levemente coberto de barba por fazer. Ele parece modelo.
E estou com a aparência péssima.
Isso não se encaixa nos meus planos. Eu queria ficar numa boa, calma, serena.
Em vez disso, pareço uma aberração. Murmuro para mim mesma e me levanto de trás da mesa. O movimento me faz relembrar dos meus bons modos.
– Gostaria de conhecer o lugar, enquanto ainda temos algum tempo? 
Joseph concorda com a cabeça. Ele ainda está sorrindo. Seus dentes são brancos e retos, como os meus. São reais ou restaurados no dentista? Minha mente está de repente cheia de perguntas. Será que ele ainda usa drogas? Conseguiu parar? 
Será que desmoronou como eu?
Eu me lembro de que nada disso é da minha conta. Ele é apenas um colega, um cara que concordou em nos fazer um favor. Ele não me deve nada. Por alguma razão, esse pensamento me deprime. Noto que ele em nenhum momento menciona termos nos conhecido no passado. Estamos fingindo sermos estranhos, mesmo que não sejamos nada disso. Seria engraçado se não fosse trágico.
Começamos a visita pelo piso térreo, e mostro a ele as salas de terapia que não estão sendo utilizadas, as salas de reuniões onde fazemos o clube depois da escola e a cozinha.
– Este é o lugar mais importante. – levanto os braços e indico o pequeno cômodo. – Temos tudo o que você possa querer. Café, chá, biscoitos... ombro amigo. Montes e montes de ombros amigos.
– Este lugar é incrível. Há quanto tempo você trabalha aqui?
– Cinco anos. – subimos as escadas, em direção ao escritório da administração. Aceno para a equipe. Elas parecem mais interessadas em babar por Joseph do que em retribuir meu cumprimento, não que eu possa culpá-las. Ele está vestindo uma calça jeans velha, suja de tinta, rasgada nos joelhos e desgastada nas bainhas. O tecido agarra seus quadris de um jeito perturbador. – E obrigada. Todos nós trabalhamos muito duro para deixá-lo assim.
– Posso perceber. – sua voz é baixa. – É muito impressionante.
Por alguma razão isso mexe comigo na hora. Ele ainda se parece com o Joseph que consumia todos os meus pensamentos tantos anos atrás. Mas, como eu, ele parece ter crescido. Gosto disso mais do que deveria. Gosto dele mais do que deveria.
– Acho que agora devemos aprontar as coisas na sala de arte. – de súbito, eu queria que as crianças já estivessem aqui. Elas são o melhor quebra-gelo, eu me sentiria muito menos desconfortável se estivessem por perto. Até mesmo meu corpo parece esquisito. Meus braços estão soltos frouxamente ao lado do corpo, e não sei o que fazer com as mãos. Fecho os punhos, como se fosse me dar forças.
– Parece uma boa ideia – diz ele. – Me mostre o caminho.

***

Dois sábados depois, Selena e eu dirigimos até Manhattan no mini arranhado dela. É cedo o suficiente para as ruas ainda estarem razoavelmente vazias. Ela aumenta o volume do rádio do carrinho e nós cantamos com os Arctic Monkeys, tentando não fazer comentários sobre o fato de que quase todas as suas letras parecem ser sobre drogas, bebidas ou ambos. Elas me lembram de quando eu era estudante. Tudo me lembra, no momento. Tenho flashbacks de épocas que tentei manter enterradas por tempo demais.
– Então, para onde devemos levá-la? – Selena bate a ponta dos dedos no volante.
Estamos paradas na faixa de pedestres, esperando uma senhora de idade passar. Ela está empurrando um carrinho, e espiando de dentro dele está um pequeno terrier escocês.
– Devemos ir ao parque – digo. – está um dia lindo e ela provavelmente precisa gastar um pouco de energia.
Charlotte está numa residência para grupos há cinco dias. Desde que Daisy brigou com Darren, acabou em um acidente e com o osso da bochecha quebrado. Ela jura que parece mais doloroso do que realmente é, mas a cada vez que olho, só consigo pensar em como ele deve ter batido forte para quebrar um osso tão espesso.
Me dá náusea saber que Charlotte viu todo o incidente.
– Nós poderíamos ir ao Battery Park.
– Talvez. – eu ansiava pelas colinas. Não há o suficiente delas em Nova York. 
Selena olha para mim de soslaio.
– Você está bem? Você parece toda confusa no momento.
É tão típico que ela perceba quando ninguém mais percebe. Para todas as outras pessoas, posso vestir uma persona como se fosse um velho casaco de inverno, mas Selena é perceptiva demais. Inclino-me para frente e abaixo o rádio.
– Eu não sei – admito.
– Está tudo bem com Simon?
Pisco algumas vezes.
– Está, por que a pergunta?
Ela encolhe os ombros.
– Você não falou muito sobre ele.
– Ele anda ocupado no trabalho. Se fosse dez anos mais jovem, provavelmente viraria a noite trabalhando.
Nós duas rimos. A imagem de Simon passar a noite apenas com a companhia de Red Bull é irreal.
– Aliás, eu iria perguntar se posso ir ao show do Nicholas na próxima sexta-feira. Simon vai estar fora e não gosto de ficar em casa sozinha.
Nicholas é o marido da Selena. Ele é impressor de profissão, mas ele canta no qual brinca um pouco e às vezes ele faz shows no pub local. Ele é superdescontraído e despretensioso. Gosto muito do Nicholas, principalmente porque ele me deixou morar com ele e Selena por um ano quando eu não tinha para onde ir. Senti falta de vê-lo. Nossos círculos são muito diferentes hoje em dia. Ele é tranquilo, legal e eu sou velha antes do tempo.
– É claro que a gente adoraria. – Selena está com um sorriso enorme no rosto e tento não deixá-la ver o quanto isso me faz sentir mal. Não me lembro da última vez que saí com ela. A maior parte do meu tempo é ocupada com Simon, ou saindo para jantar com clientes, ou hospedando-os na nossa casa. Não é que Simon não se dê bem com Selena e Nicholas, eles simplesmente não têm muito em comum. É bem difícil para todos nós quando estamos juntos. – Você poderia ficar lá em casa. Talvez a gente possa dar uma passada nos mercados de rua no sábado de manhã.
Um sorriso faz meus lábios se contorcerem. Não me lembro da última vez que fui aos mercados, a qualquer um. Eu adorava vasculhar as barracas quando era mais jovem, escolhendo peças vintage e misturando-as com o meu guarda- roupa.
– Vamos sim. – minha voz é resoluta e nos deixa com uma animação meio boba.
Ainda estou sorrindo quando chegamos a Carter House. Quando Charlotte desce as escadas, está vestindo jeans velho e um suéter alguns números menores do que deveria ser. Seu rosto se ilumina assim que ela nos vê. Ela corre para os meus braços, quase juntando as mãos atrás de mim, e enterro meu rosto em seu cabelo. Tem um leve aroma de fumaça, e me pergunto se Charlotte chegou a lavá-lo alguma vez desde que chegou aqui.
Quando a solto, ela sorri timidamente para Selena. Elas não têm oportunidade de interagir na clínica pois Selena geralmente está ocupada com os adultos.
– Oi, docinho. – Selena estica o braço e mexe no cabelo dela. As bochechas de Charlotte ganham um tom rosado. Selena não pareceu notar, e decide nos provocar:
– A Indiana Demi aqui acha que devemos sair para uma aventura.
Os olhos de Charlotte se arregalam.
– Que tipo de aventura?
– Ah, não sei, talvez caçar alguns tubarões, matar algumas bruxas, ou enfrentar alguns piratas para tomar o tesouro deles – diz Selena.
Dou um sorriso.
– Estou pensando que podemos cravar estacas em alguns vampiros e depois fazer um piquenique.
Charlotte franze a testa, fingindo considerar as opções.
– São vampiros malvados?
– Acho que são. Mas, se você quer ter certeza, a gente sempre pode perguntar a eles antes.
Ela agarra minha mão e praticamente me puxa para fora da porta. Selena fica para trás e assina a papelada.
– Que tipo de piquenique vamos ter, afinal?
Acaba sendo o tipo de piquenique em que compramos comida demais e depois ficamos olhando os pássaros darem rasantes, tentando pegar as migalhas dos nossos dedos. Nos sentamos em uma manta de lã xadrez no topo da colina e ficamos olhando para Manhattan lá embaixo. O ar é limpo e podemos ver todo o caminho até a cidade e, além, o horizonte familiar de Empire State reluzindo a distância.
Dias como esse me lembram de porquê eu amo tanto viver em Nova York. Allegra pega outro pãozinho de salsicha, tira a massa e a enfia na boca. Ela descarta a carne rosada, jogando-a no prato de papel na frente dela. Fora do escudo de massa, a salsicha parece mole e enrugada.
– Demi?
Viro-me para olhar para ela.
– Sim?
– Por que as pessoas usam drogas?
Fico em silêncio por um minuto. Sua pergunta parece ter arrancado o ar dos meus pulmões. Lanço um olhar para Selena, que me vê e dá de ombros.
Mensagem recebida: essa é toda minha.
– É um vício, Charlotte. Faz as pessoas se sentirem bem no começo, mas depois elas ficam tão acostumadas que simplesmente não conseguem parar.
– Por que não conseguem parar?
– Porque as fazia se sentir bem no começo.
Ela pega uma margarida da grama ao lado do cobertor e começa a arrancar as pétalas, uma por uma.
– Mas faz mal. Como pode fazer a pessoa se sentir bem?
Respiro fundo. O ar cheira a batatas-fritas com sal e vinagre, misturado a grama recém-cortada. Um típico dia inglês de primavera.
– As coisas podem ter uma sensação boa e ainda assim fazer mal. Como chocolate demais, ou ficar acordado até tarde quando a gente deveria estar dormindo. Mas drogas são piores, porque elas fazem as pessoas se sentirem péssimas e não conseguirem mais fazer as coisas direito.
Não quero dizer a ela que podem matar. Eu sei mais do que ninguém. Mas ela tem 8 anos e a mãe é dependente, não sei se já estou pronta para que ela some as informações e chegue ao resultado certo.
– O problema é que, quando a pessoa se vicia, é realmente difícil parar. É por isso que temos a clínica, para tentar ajudar as pessoas.
– Pessoas como a minha mãe?
– Sim.
Ela morde o lábio inferior.
– Então por que ela continua usando drogas? Por que vocês não estão ajudando ela?
– Nós estamos tentando. – minha voz enrosca na garganta. – Mas isso pode levar muito tempo. E às vezes as pessoas têm recaídas e pioram de novo.
Charlotte se inclina para mim, e dou a volta com a mão para acariciar seu cabelo. Mesmo sujo, é macio e sedoso.
– Algum dia minha mãe vai ficar bem?
Eu a puxo para mais perto.
– Não sei, Charlotte. Espero que sim.
Ela passa os braços ao meu redor.
– Eu também.

amores, quero saber o que estão achando da fanfic pois eu estou me sentindo insegura.
você estão gostando da fanfic? me digam pois é muito importante para mim.
agora só o capítulo, será que a Daisy irá se recuperar?
amo essa amizade entre a Demi e a Selena.
Demi tendo pensamentos do passado, essa Charlotte é tão fofa.
me digam o que acham nos comentários, ok?
espero muito que vocês gostem, volto em breve.
respostas do capítulo anterior aqui.

20/09/2017

begin again: capítulo 4


Nove anos antes

– Ei, menina da chuva!
Virei a cabeça de maneira repentina e quase deixei cair os livros que estava equilibrando precariamente nos braços. O gramado está repleto de estudantes. O sol está forte. Faz calor o suficiente para que as meninas vistam shorts minúsculos e blusinhas. Parece que metade dos garotos tirou a camisa, revelando a pele pálida que está se tornando mais rosada a cada segundo. Não consigo ver de onde vem a voz, então, dou de ombros e continuo andando. Minha última aula acaba de terminar e estou voltando pelos corredores dos alojamentos. Vestida com jeans e uma blusa de manga comprida, estou com calor e com roupa demais para o clima.
– Por aqui. – Joseph enrola a língua nos erres e por algum motivo soa incrivelmente sexy. Olho para a esquerda e o vejo, sentado com um grupo de amigos na beira do lago. Cruzamos o olhar e ele sorri, fazendo meu estômago apertar.
Quero acenar, mas estou segurando livros demais. Em vez disso, balanço um pouco a cabeça para o lado e mostro um sorriso torto e cheio de dentes. Dou um chute mental em mim mesma por ser tão patética, mas é de Joseph Jonas que estamos falando. Deus dos Deuses, Rei dos Reis, e ele está falando comigo. Ainda está sorrindo. Começo a me sentir idiota, em pé aqui como uma pateta, então levanto as sobrancelhas, esperando passar uma mensagem de indiferença, uma expressão meio como “vejo você por aí”, e começo a me afastar.
– Espere aí. – ele se levanta e vem até mim numa meia corrida. Está segurando um baseado entre o indicador e o dedo médio. Quando para na minha frente, leva-o aos lábios. Ele solta o ar, e a brisa joga a fumaça em meu rosto.
– Você quer?
Dou de ombros e olho para os meus braços. Ele segue meu olhar e percebe como minhas mãos estão cheias. Girando o baseado entre os dedos, ele o ergue, coloca nos meus lábios e eu dou uma tragada. Um momento depois, vejo seus olhos e ele ainda está sorrindo para mim, não sei se é Joseph ou a droga que me deixa um pouco zonza. Ele coloca o baseado de novo na própria boca e depois pega meus livros, erguendo-os facilmente nos braços. Sem nem me perguntar se quero me juntar a ele, Joseph caminha de volta para seu grupo. Claro, eu vou atrás. Meio sem jeito, eu me sento ao seu lado. Seus amigos são a nata do campus, ou são ricos, ou são talentosos, ou uma mistura de ambos. É difícil não se sentir sem graça e prosaica em comparação.
Joseph coloca o baseado de volta em meus lábios, apesar de minhas mãos agora estarem livres. Minhas bochechas esquentam quando percebo que ele ainda está olhando para mim. Ele tem uma intensidade que me faz estremecer, mesmo que eu esteja fervendo dentro da blusa de mangas compridas e da calça jeans.
– Ela tem nome? – o garoto sentado do outro lado de Joseph olha para mim. Ou eu acho que ele olha, é difícil dizer quando ele está usando óculos estilo aviador e um boné que cobre os olhos.
– Ela se chama menina da chuva. – a voz de Joseph é baixa. Seus lábios se repuxam em um sorriso e parece ser só para mim.
– Nome estranho. – o rapaz enruga o nariz. – E especialmente inadequado para este tipo de clima. Mas acho que combina com você. – ele passa o braço ao lado de Joseph e aperta minha mão. – Sou Digby. 
Digby?
– Oi.
– Acho que vou chamar você pelo nome da deusa grega da chuva... que é...hum...
– Não existe deusa grega da chuva, idiota. – isso vem de uma garota deitada de bruços na nossa frente. Sua voz é profunda e rouca, parecendo pertencer a alguém que fuma sessenta cigarros por dia.
– Tem sim. É Íris.
A menina gutural ri.
– Ela é a deusa do arco-íris, não da chuva. Zeus é o responsável pela chuva.
– Eu não vou chamá-la de Zeus.
Graças a Deus pelas pequenas misericórdias.
– Meu nome é Demi – digo com uma vozinha. Todos param de falar e olham para mim. De repente, entendo como um animal de zoológico deve se sentir.
– Eu prefiro Íris – diz Digby.
– Bem, é melhor do que Zeus – diz a menina gutural.
Joseph se inclina um pouquinho para frente e encosta os lábios macios na pele sensível logo abaixo da minha orelha.
– Para mim você sempre vai ser a menina da chuva.

desculpe amores mas ficou um pouco pequeno o capítulo.
esse capítulo é mais um pouco do passado dos dois juntos.
um pouco também de como a Demi conheceu a Digby.
me digam o que acham nos comentários, ok?
espero muito que vocês gostem, volto em breve.
respostas do capítulo anterior aqui.

17/09/2017

begin again: capítulo 3

Remembrance of the past

Vamos à galeria de táxi, para que Simon possa beber um pouco. Por mais que ele adore dirigir o Jaguar, prefere uma taça de vinho. Odeio dirigir por Nova York, mesmo à noite.
– Elise me ligou hoje à tarde – diz Simon enquanto percorremos as ruas molhadas. – Ela acha que encontrou um artista.
– Sério? – meu sorriso é genuíno. Elise nunca foi minha maior fã, mas ela ama o pai, por isso ela me tolera. Não me importo, acho que sentiria o mesmo se estivesse no lugar dela. Para o mundo exterior, não sou melhor do que uma caçadora de recompensas. Uma esposa-troféu.
– Pelo visto, ele acaba de voltar de Londres. Também não é estudante, é um artista de mão-cheia.
Meus olhos se arregalam.
– Ele vai ter tempo para dar aulas na clínica?
– Elise diz que vai. Não falta dinheiro para ele. A cavalo dado não se olham os dentes, Demi.
Curvo os dedos em volta dos bíceps de Simon e aperto de leve. Não gosto de deixá-lo aborrecido. Ele trabalha duro, o mínimo que posso fazer é tornar sua noite agradável.
Quando o táxi para em frente à galeria, Simon sai primeiro. Ele abre um guarda-chuva antes de me ajudar a sair. Levei algum tempo para me acostumar ao cavalheirismo quando começamos a nos relacionar. Na época, eu estava mais acostumada a garotos, daqueles que tomavam mais do que ofereciam.
Apesar de nossas melhores intenções para chegarmos cedo, a exposição está em pleno andamento quando entramos no local. Um garçom para diante de nós e oferece uma bandeja cheia de bebidas. Simon pega duas taças e me entrega um vinho branco enquanto sorve o tinto.
– Nada mau. – ele toma mais um gole. – Elise fez a coisa certa e encomendou itens de qualidade.
Não respondo, em vez disso, tomo meu vinho. Já que Simon é quem está financiando toda a festa, por que diabos ela não encomendaria coisas de qualidade?
Simon para e fala com um grupo de amigos. Todos têm mais ou menos sua idade, são cinquentões, por aí. Fico ao lado dele, obediente, sorrindo quando ele me apresenta, ignorando as sobrancelhas levantadas e os olhares agudos. Eles olham para mim como se eu fosse uma vadia louca por dinheiro. Tenho vontade de responder que raramente gasto o dinheiro de Simon. Tenho meu próprio salário, embora insignificante, e também minha própria conta bancária. Nunca foi o dinheiro que me atraiu nele. Foi a proteção.
Engulo a bile que estava se juntando em minha garganta. As pinturas nas paredes da galeria me chamam. Vou flutuando até elas, fico o mais próximo que posso, admirando a composição, a cor, as pinceladas. Eu poderia me perder em sua beleza por horas. Sempre amei a arte. Não sou uma grande pintora, mas sou admiradora. Não uma grande conhecedora.
– O que você achou? – a voz nasalada de Elise, com um acento das classes altas, sussurra em meu ouvido. Viro para ela e sorrio.
– São fantásticos. Lindos. Está me matando não poder tocá-los.
– Que bom que você não tocou. Acabei de vender este aqui por quarenta mil.
Não sei por que estou chocada. Estou com Simon por tempo suficiente para saber em que tipo de coisas os podres de rico gastam seu dinheiro. Não posso deixar de pensar no que poderíamos fazer com essa quantia de dinheiro na clínica.
– Aposto que o artista está feliz.
Ela sorri.
– Ele está. E você também deveria ficar, porque eu o convenci a dar aula na clínica.
A respiração foge de mim numa lufada. O Senhor quarenta mil vai dar aula para nós? Nossas crianças carentes, desinteressadas, subnutridas? Não sei se fico satisfeita ou apreensiva.
Dou um risinho, embora o sorriso não chegue a atingir meus olhos.
– Será que ele sabe onde está se metendo?
– Por que não perguntar a ele? – ela me leva para o centro do salão, onde uma grande multidão se reuniu. Um murmúrio de conversa paira no ar. Fico à margem, um pouco envergonhada, quando Elise vai abrindo caminho, tentando separar a multidão como Moisés abriu o mar vermelho.
– Aí está você, Joseph. – a voz alta de Elise percorre o salão. – Eu gostaria que você conhecesse a Demi. Ela trabalha na clínica de que eu estava falando.
Vejo primeiro os olhos verdes. Brilhantes, intensos. Fazem meu coração fraquejar. Ele os aperta quando me vê. Meu estômago se aperta e torce como se estivesse sendo espremido por uma calandra.
Meu passado acaba de voltar para dentro da minha vida. Mal consigo respirar. Da última vez em que vi Joseph Jonas, fingi que não o conhecia. Eu estava sendo levada para longe do prédio da reitoria da universidade por meu pai, seus dedos agarrando meu pulso, lábios apertados e raivosos. Era começo da noite, e eu tinha duas horas para esvaziar meu quarto e deixar o campus, caso contrário, seria escoltada para fora por seguranças.
Tínhamos quase alcançado os salões de residência quando notei uma figura alta apoiada na varanda da frente. Ele parecia ter um cigarro na mão, mas no momento em que chegamos perto, percebi que não era um cigarro qualquer. O aroma de mofo e os olhos vermelhos dele o denunciavam.
Claro, meus olhos também estavam vermelhos, mas por uma razão completamente diferente. Meu choro havia ido e voltado pelos últimos dias. Um dilúvio quando respondi às perguntas do investigador, tentando falar sobre minha amizade com Digby e descrever o que aconteceu na noite em que ele morreu.
Menti entre dentes quando disse que não sabia de quem ele havia conseguido o ecstasy. Claro que eu sabia. Todos sabíamos. Joseph era basicamente o fornecedor naquela época.
Cada vez que eu choramingava, meu pai revirava os olhos. Ele havia deixado claro que preferia estar em qualquer lugar que não fosse ali. Estava me acompanhando apenas para se certificar de que eu não faria um papel ridículo, que eu não jogaria nossa família no ridículo.
– Você está bem? – Joseph se afastou da parede e caminhou em nossa direção.
Meu pai não disse nada, mas senti seus dedos apertarem meu braço. – Ando tentando ligar para você.
– Estou bem. – curto, conciso. Olhei para meu pai de soslaio. Ele estava olhando para nós, boquiaberto.
Joseph colocou o baseado na boca e respirou novamente. Jesus, ele queria morrer?
– Você não parece bem. Está com uma aparência péssima.
– Você conhece esse rapaz, Joseph? – A paciência do meu pai finalmente se esgotou. Eu tremia quando olhei para ele, com medo de praticamente tudo o que acontecera. Nos últimos dias eu havia visto um dos meus amigos mais próximos morrer, havia sido inquirida por jornalistas e policiais e, finalmente, havia sido levada na frente da reitoria. Eu estava exausta, acabada. Trêmula, nada mais do que uma pilha. Agora Joseph, que tinha dado a droga a Digby, estava fumando um baseado na frente do meu pai.
Talvez, se meu pai fosse outra pessoa, menos preocupado com as aparências e mais preocupado com a filha, tudo pudesse ter sido diferente. Talvez se eu tivesse sido mais forte, não a garota fragilizada que eu me tornara, poderia ter sido capaz de dar uma resposta apropriada. Em vez disso, olhei para os meus pés e balancei a cabeça. 
– Não, eu nunca o vi na vida.
– É um prazer conhecê-la. – Joseph estende a mão e me cumprimenta. Vejo seus dedos longos envolverem a palma de minha mão e sinto gotas de suor brotarem em minha pele. Preciso de todas as minhas forças para não o deixar sentir o tremor na minha mão, porque não quero que ele saiba o quanto estou chocada por vê-lo de novo.
– O prazer é meu. Elise me disse que você vai trabalhar com a gente. – não consigo olhar para ele. Em vez disso, olho para seus pés, notando como seus sapatos de couro preto são brilhantes. Parecem muito diferentes dos tênis que me lembro de ele calçar. Sempre surrados, salpicados de tinta. Como o resto dele.
– Eu gostaria. – sua voz é mais suave do que me lembro, mas a cadência de Dublin ainda está presente. – Acredito fortemente nisso.
– Nas drogas? – surpresa, olho para ele, meus olhos arregalados. Preciso inspirar fundo quando o vejo olhando diretamente para mim.
Ele ainda é lindo. Seu cabelo está um pouco mais curto, mas ainda tão escuro como tinta de jornal. Seu rosto perdeu os traços arredondados da juventude, substituídos por maçãs do rosto talhadas, sombreadas por um pouco de barba.
Mas eu o reconheceria em qualquer lugar. Aqueles lábios cheios e vermelhos, um ligeiro calombo no dorso do nariz. A cicatriz pequena ao lado da orelha direita que ele conseguiu quando criança, jogando futebol. Estão todos lá, um lembrete de tudo o que aconteceu há tantos anos. Tudo o que tentei esquecer.
– Quero dar algum tipo de retribuição. Recebi muitas coisas boas na vida. Outras pessoas não têm tanta sorte.
Minha mente está cheia de perguntas que não sei como expressar. Como ele passou esses anos, o que andou fazendo. Mas não dou voz a nenhuma delas, porque tenho muito medo. Medo de navegar para o passado e encalhar em um rio cheio de resíduos.
– Bem, ficaríamos muito agradecidos por sua ajuda. As crianças amam arte às quintas-feiras, é a aula favorita. – sinto-me melhor quando falo sobre a clínica. Mais pé no chão. Agora essa é a minha realidade, não aquelas memórias que estavam tentando ressurgir. – Eles não são Da Vinci nem nada, mas alguns parecem ter talento.
– Bom, Da Vinci eu também não sou.
Passo o olhar pela galeria.
– Você é muito bom.
Ele até fica corado.
– Obrigado.
É difícil não olhar para as bochechas vermelhas. Difícil esquecer a sensação de tocá-las com os dedos. Joseph não mostra o menor indício de que se lembra de mim, e estou realmente tentando não me decepcionar. Porque essa situação já é bastante constrangedora do jeito que está. Não preciso torná-la pior.
– Trouxe outro drinque para você, querida. – Simon me oferece um vinho branco. A taça está embaçada. Pequenas gotas de água correm na minha mão quando pego a bebida.
– Simon, este é Joseph, o artista que Elise encontrou. Este é Simon, o pai de Elise. Ele é dono da galeria.
Os dois homens trocam um aperto de mãos, e não posso deixar de compará-las. A de Simon é pálida e descarnada. Pelos grisalhos escapam sob os punhos da camisa.
– Prazer em conhecê-lo. Elise disse que você vai fazer maravilhas na clínica.
Uma aura de constrangimento desce sobre nós. Conversamos amenidades, brinco com meu vinho, olho para os meus pés, olho ao redor do salão. Simon e Joseph parecem muito mais à vontade, o suficiente para iniciar uma conversa sem mim. Isso me dá o espaço de que preciso para me acalmar. Lembro-me de que estou aqui como a esposa de Simon. A antiga Demi se foi. Não preciso mais ficar
assustada. É como se meu cérebro soubesse, mas meu corpo não, e pela primeira vez em anos sinto o aperto familiar no peito.
Respire. Apenas respire.
Há gente demais na sala. É como se estivessem se aglomerando ao redor de mim. Meu coração está acelerando tanto que quase dói.
– Preciso ir ao banheiro. – empurro minha taça na mão livre de Simon e quase corro pelo piso da galeria, tropeçando algumas vezes ao esbarrar em um convidado. Quando olho para trás, vejo os dois me fitando.
Meu marido e o homem que eu conhecia. O que me protege e o que me ensinou o que era paixão. Ele coloria meu corpo como se eu fosse uma tela em branco.
Algo há muito adormecido dispara faíscas dentro de mim quando me lembro de como era bom.

finalmente teve o encontro Jemi.
Demi teve algumas lembranças do passado.
terá muitas coisas reveladas ainda sobre o passado dos dois.
será que vai dar certo a Demi e o Joseph trabalhando juntos?
me digam o que acham nos comentários, ok?
espero muito que vocês gostem, volto em breve.
respostas do capítulo anterior aqui.