Mar de incerteza
Na manhã seguinte, Joseph preparou um bule de café na esperança de que a bebida forte afastasse seus pensamentos de Demi. Caminhando até uma janela, viu o céu tomado por nuvens cinzentas e ameaçadoras. Elas combinavam perfeitamente com seu astral. Sentia uma crescente agitação pela falta de autocontrole enquanto lembranças dos doces lábios de Demi se enredavam por seus pensamentos. O aroma do perfume dela permeava seus poros e o intoxicava. Embora o corpo ainda zumbisse de prazer pelo encontro, a mente estava presa num emaranhado de emoções. Uma batida à porta interrompeu seus devaneios acalorados. Ao abri-la, deu de cara com Trevor e seu sorriso largo. Estava num estado de espírito bem melhor que o de Joseph.
Demi acordou com a sensação de ter engolido um punhado de pregos. A garganta ardia, como se estivesse em carne viva enquanto imagens das imprudências da noite anterior dançavam em sua mente. Espalhando-se feito bolas de gude, os pensamentos só faziam as têmporas explodirem numa terrível dor de cabeça. A culpa pelo que havia feito com Alex e com seu relacionamento ardia quase tanto quanto seu desejo acalorado e insaciável por Joseph.
– Caramba, cara, você está com uma aparência de merda – comentou Trevor, acomodando-se no sofá com as longas pernas esticadas à frente.
Joseph se serviu de uma xícara de café e se empoleirou numa banqueta na cozinha.
– Não consegui dormir.
– Sinto muito, meu chapa. Eu dormi como um bebê, nos braços de Fallon.
– Pelo visto, correu tudo bem.
– Mais do que bem – replicou ele, a vitória estampada no rosto. – Na verdade, gostei muito dela. Tem uma personalidade divertida, bacana e, para melhorar, é meio doidinha. Quero dizer, gosta das duas coisas.
Levantando uma das sobrancelhas, Joseph deu um sorriso cretino.
– Sua irmã também gosta das duas coisas.
Trevor estremeceu.
– Você tinha que acabar com meu bom humor? – Joseph deu de ombros. Trevor o encarou por vários segundos, parecendo ler alguma coisa em seus olhos. – E então, vai me contar o que está acontecendo entre você e a Demi?
– Não tem nada acontecendo entre mim e Demi – interrompeu ele, ríspido.
– Cara, a gente se conhece há catorze anos. Senti que havia alguma coisa rolando entre vocês dois e a noite de ontem só confirmou isso.
Joseph se levantou e caminhou até a janela enquanto pensava no que dizer. A resposta foi lenta e apreensiva:
– Eu caí feio.
– Cara, não me diga que você trepou com ela.
Ele se virou e o fuzilou com os olhos.
– Não, eu não trepei com ela, Trevor!
– Bem, então que diabos está rolando?
Mordendo o lábio, Joseph caminhava pela sala como um animal enjaulado. Não sabia explicar como se sentia em relação a Demi. Também não sabia como Trevor o enxergaria depois que confessasse tudo. A única coisa que sabia é que não conseguia identificar muito sentido nas próprias emoções e que, naquele momento, não se importava. Sentia o que sentia.
Fim de papo.
– Cara, desembuche.
Josepg passou as mãos pelos cabelos com alguma rispidez e o fitou da outra ponta da sala.
– Acho que estou me apaixonando por ela.
Com reprovação no olhar, Trevor ficou boquiaberto. Ele se levantou e se aproximou de Joseph.
– Você tem consciência de que Alex é nosso amigo, não tem?
Joseph franziu o rosto.
– Que tipo de pergunta é essa?
– Ora vamos, Joseph. Como você foi se apaixonar pela namorada de um amigo nosso?
– Eu a conheci antes de saber que ela era namorada de Alex – respondeu ele entre dentes cerrados. Ele foi até a bancada e virou o restante do café.
– Espere aí, eu pensei que você a tivesse conhecido naquela noite, na boate.
Joseph deixou escapar um suspiro profundo, levando a mão à nuca.
– Não! É complicado. Ela foi fazer uma entrega no meu escritório. Tentei pedir o telefone dela... – ele fez uma pausa, o estômago revirando enquanto recordava a primeira vez que vira Demi. Até mesmo agora, pensar nela o deixava sem ar. – Ou, talvez eu tenha tentado dar meu telefone a ela. Não lembro direito. Isso foi em junho. Fui até o trabalho dela no dia seguinte para vê-la e fomos apresentados alguns dias depois.
Trevor caminhou de volta para o sofá e afundou no assento.
– Olha, cara, vou ser brutalmente sincero com você. – Joseph o espiou do outro lado da sala. – Alex está planejando se casar com ela... em breve.
Mais uma vez, quase sem ar, Joseph engoliu em seco e se recostou na bancada.
– Ele lhe disse isso?
– Com certeza mencionou alguma coisa para você, não?
– Mencionou, mas não achei que estivesse falando sério. – uma dor visceral lhe revirava o estômago ao mesmo tempo que o peito se apertava diante daquela ideia. – Além do mais, ele não a ama. Você acredita mesmo que ele parou de sacanagem com a Monica? Eu não acredito.
– Conhecendo Alex como conheço, você deve ter razão. Mas para lhe dizer a verdade, não penso nisso. O que ele faz é problema dele. A Demi está com ele pelos motivos dela e, até onde me diz respeito, ela escolhe enxergar o que quer. Simples assim.
– Bem, não é tão simples assim para mim – rebateu Joseph, erguendo a voz.
– Mas tem que ser. Você precisa acabar com o que quer que esteja acontecendo entre vocês dois.
– Não acho que consiga. – hesitando, ele respirou fundo e baixou um pouco a voz. – Era para ela estar comigo.
– Cara, isso só pode acabar em desastre. Joseph, sério, você precisa pensar no que está fazendo. Pense bem. Ela também ama o Alex.
– Ela não o ama, nada – zombou ele. – Só está confusa, ou algo assim. Ele até pode ser meu amigo, mas, assim como faz com todo o resto, ele fode com a cabeça dela e a arrasta para dentro de algum senso deturpado de necessidade.
– Não. É você que está fodendo com a sua cabeça achando que ela não o ama. Preste atenção no que está dizendo, cara. Repense e escute, com honestidade, o que está falando. – embora Joseph não tivesse dito nada, seus olhos endureceram como estilhaços de vidro. – Olha, cara, eu só estou sendo sincero. É uma situação ruim. Eu sei que é, e você também sabe.
– Não estou negando que seja uma situação ruim! – Joseph jogou as mãos para o alto, as palavras explodindo como um trovão. – Por acaso tenho cara de babaca? Uma cobra é uma cobra, não importa o número de vezes que troque de pele! Ele não presta para ela!
Bufando, Trevor foi até a porta. Ele se virou e olhou para Joseph.
– Você é como um irmão para mim, cara, mas acho que está tentando transformar Alex em vilão por causa das suas necessidades pessoais. E, para falar a verdade, está me colocando numa posição bem escrota. Já dá para perceber que essa merda vai feder e eu não quero tomar parte nenhuma nisso.
Ora, cacete! A última coisa que ele queria era colocar Trevor no meio da confusão. Sentando-se outra vez, Joseph olhou para o amigo do outro lado do cômodo, a derrota em seus olhos pesada feito chumbo.
– O que eu faço?
– Precisa esquecê-la. Essa merda toda é um erro. E o mais importante: precisa se lembrar de que Alex é seu amigo. – Trevor soltou o ar pesadamente e balançou a cabeça antes de sair. – Ligo para você mais tarde, meu chapa.
O conselho era simples. Apenas a esqueça. As palavras não podiam ser mais verdadeiras. Aquilo podia ser um tremendo erro, mas o homem que as recebia não conseguia enxergar isso. Recusava-se terminantemente a fazê-lo. Demi jamais seria um erro para Joseph, não importava quantas pessoas ele pudesse magoar incluindo ele próprio. Tudo o que ele e Demi podiam ser era real. Dizer que era para ela estar ao seu lado não foi apenas um impulso no calor do momento. Não era apenas uma sensação. Desde a primeira vez que seus olhares se cruzaram, ele sentira isso nas profundezas da alma, bem no fundo de sua essência. Ela era feita para ele em todos os sentidos. Embora fosse a própria definição de inacessível, sua mente e seu coração gritavam para que ele atirasse tudo ao vento e deixasse as coisas se incinerarem por completo. Dessa forma, mergulharia num mar de incertezas para fazê-la sua, e temia que nenhum amigo ou inimigo fossem capazes de impedi-lo. Apenas rezava para que a mulher que ocupava seus pensamentos o correspondesse.
***
Com a respiração superficial e trêmula, ela ergueu a cabeça e espiou pelo quarto. Alex não estava na cama. Suspirou aliviada quando os olhos passaram pela mesinha de cabeceira. Junto com um bilhete explicando que voltaria em breve, ele deixara também duas aspirinas e um copo d’água, que ela bebeu com avidez. O líquido frio e os comprimidinhos mágicos lhe ofereceram algum alívio, embora nem de longe fosse o que ela necessitava de fato. Gemendo, fitou, infeliz, a luz esmaecida que se insinuava pelas cortinas da janela. Puxou as cobertas outra vez acima da cabeça. Queria que a imagem de Joseph sobre ela, beijando-a, acariciando-a e sentindo seu sabor se transformasse num borrão, derretesse, retrocedesse, fosse banida para algum lugar onde ela nunca mais a encontrasse.
Impossível!
No entanto, quanto mais revivia o inegável prazer que ele lhe causara, mais Demi o desejava. Aquele beijo dominante, porém suave, as carícias ternas, porém enérgicas, ah, Deus o jeito como os dedos haviam cavado dentro dela... tudo lhe atiçava os sentidos com o doce sabor daquilo que ele seria realmente capaz. Nem mesmo a pior das ressacas poderia impedir seu corpo de querer mais. O cheiro do perfume dele nos seus cabelos ajudava ainda menos na hora de afastar quaisquer pensamentos que quase a levavam ao orgasmo, bem ali, sozinha na cama.
Apesar de tudo isso, a cabeça estava sob ataque, assaltada pela voz da mãe. Alex é um bom rapaz, Demi. Agarre-o e nunca mais deixe-o ir embora.
Lembrou-se com perfeição de todas as vezes em que Alex a ajudara quando a mãe estivera doente. Demi praticamente perdera a razão antes de ela morrer. Paralisada de medo e incapaz de ajudar nos dias derradeiros, não fora ela quem fizera a vigília da mãe. Tampouco fora sua irmã, Dallas, que havia sofrido um acidente quase fatal alguns dias antes. Fora Alex. Ele auxiliara a mãe dela vezes sem fim. Ele segurara seus cabelos enquanto ela vomitava num urinol, ao passo que Demi permanecia sentada, sedada, numa poltrona do outro lado do quarto, em completo estado do choque diante do que acontecia à sua volta. Além de pagar as contas do hospital e arcar sozinho com os custos do funeral, ele dera condições para que Demi e Dallas ficassem com o pouco que restara do seguro de vida.
E é assim que eu retribuo?
Os pensamentos fizeram brotar lágrimas quentes e impotentes enquanto ela escorregava da cama e caminhava de má vontade até o banheiro. O que ainda restava do álcool se revirava em sua barriga vazia. Foi então que ela se deu conta de que ainda vestia as roupas da noite anterior. Estremeceu ao arrancá-la do corpo, desejando queimá-la junto com a lembrança do que havia acontecido.
A fim de livrar a pele da maquiagem acumulada e do perfume de Joseph em seus lábios, jogou água morna e ensaboada no rosto, sentindo mais uma vez o estômago se revirando de tanta culpa. Olhou para o espelho sentindo nojo, raiva e ódio mas naquele momento decidiu que não iria se chafurdar sob o próprio escrutínio pelos seus atos. Estava bêbada, era essa sua história e haveria de se ater a ela. Sóbria, era certo que nada daquilo teria acontecido. O corpo talvez desejasse Joseph, mas não havia a menor chance de sua mente querer a mesma coisa. Mesmo com todo o prazer que representava, ele não passava de um companheiro em forma de serpente para o demônio sexual que habitava sob a pele dela. Pelo menos, era isso que Demi tentava dizer ao seu cérebro confuso naquela manhã de domingo.
Debruçada sobre a pia, ela quase morreu de susto ao sentir um toque suave em seu ombro.
– Meu Deus, Alex, você me assustou – disse Demi, a voz tímida e repleta de um pânico agudo que ela tentava desesperadamente esconder.
Será que ele sabe? Será que estou diferente? Ai, Deus, será que ainda estou com o cheiro de Joseph?
Ele deu um sorriso gentil, o tom de voz baixo, até mesmo tranquilizador.
– Você está tremendo, gata. – ele afastou os cabelos grudados no rosto dela. – Vamos entrar no banho, está bem?
Engolindo o ácido que não parava de se acumular em sua garganta, Demi assentiu enquanto tirava a calcinha, o corpo todo tremendo. Largou a peça no chão e tirou o sutiã, sem desviar os olhos dos de Alex. Pegando-a pela mão, ele a conduziu até o chuveiro e abriu a água. Fez um gesto para que ela entrasse. Com a respiração irregular por causa do nervosismo, ela o viu se despir. Pegando o sabonete, passou-o pelo corpo, apressada, na tentativa de se livrar do que restava da saliva de Joseph em seus poros. Entrando no chuveiro, Alex pressionou o peito contra as costas dela enquanto lhe massageava os ombros. Respirando muito fundo, ela deixou a cabeça pender para trás, tentando aproveitar ao máximo o calor da água.
– Selena já acordou? – perguntou ela, tentando puxar conversa.
– Acho que não. A porta do quarto dela ainda está fechada. – ele continuou a massagem. – Deve ter se levantado do sofá, porque era lá que estava desmaiada quando entrei ontem à noite.
– A que horas vamos encontrar seus pais? – perguntou ela, relutante.
– Temos que nos arrumar assim que terminarmos aqui. – Demi assentiu. – E então, você estava bem chapada ontem à noite.
Ela estendeu a mão para pegar o xampu e mordeu o lábio.
– É, estava, sim.
– O que você fez, Demi? – a voz dele soou dura o bastante para fazê-la sentir um arrepio na espinha.
Tentando recuperar o fôlego, ela se virou para olhá-lo.
– O... o que você quer dizer?
Com os olhos grudados nela, Alex ergueu a mão e para lhe acariciar o queixo.
– Você mentiu para mim.
Com o coração aos pulos, Demi balançou a cabeça, lutando contra as lágrimas.
– Eu... não menti para você.
Ele pegou o xampu, despejou um pouco na mão e fez espuma. Com os olhos ainda colados aos de Demi, juntou os cabelos dela e se pôs a lavá-los.
– Encontrei Joseph ontem quando cheguei.
Tentando esconder o pânico que ela sabia estar estampado em seu rosto e desejando se afogar, engasgar, sufocar um grito ou, quem sabe, até mesmo morrer bem ali, naquele chuveiro, Demi o encarou de volta, incapaz de formar uma frase. Um nó se formou na garganta, quase a deixando sem ar.
– Ele me contou que vocês não foram à Cielo.
Engolindo o tal nó, o oxigênio voltou a circular em seus pulmões com uma forte rajada.
– Ah – disse ela, sem fôlego. – É, a gente decidiu ir a uma festa na casa de um conhecido da Fallon.
– Certo, você mentiu.
– Eu não menti, Alex – sussurrou ela, enxaguando o xampu dos cabelos, ciente de que estava ocultando uma mentira bem maior. – Foi uma mudança de última hora. Só isso. Puxando o corpo dela para junto do seu, Alex deslizou a boca pela curva do queixo dela.
– Tudo bem, uma mudança de última hora sobre a qual não fui avisado. – ele passou os braços ao redor da cintura dela. – E se eu tivesse ido à Cielo, Demi? Eu teria achado que alguma coisa tinha acontecido com você.
– Você tem razão – concordou ela.
Era o mínimo que podia fazer, considerando... bem, considerando tudo. Sabia que ele poderia ter dado um telefonema para saber como ela estava, mas não iria testar a sorte.
– Eu devia ter telefonado. Bebi demais e, sinceramente, nem pensei nisso. Sinto muito. Da próxima vez, eu ligo.
Parecendo satisfeito, Alex entregou o sabonete a ela e se virou, colocando as mãos no azulejo.
– Pode lavar minhas costas? – fazendo espuma com o sabonete, Demi atendeu ao pedido dele. – Não estou bem certo de que vai haver uma próxima vez. Você saindo com aquela maluca de novo...
– Mas, Alex, ela...
– Não estou a fim de discutir com você, Demi. Nunca a vi tão fora do ar. Tentei acordá-la, mas você nem se mexeu. – ele alongou a cabeça e os ombros. – Num determinado momento, achei que tivesse sofrido uma intoxicação alcoólica, até enfim murmurar alguma coisa. Ela obviamente não é uma boa influência para você. Fim de papo. Você não vai sair com ela outra vez.
Sem saber o que dizer, Demi deteve os movimentos. Virando-se, Alex empurrou a cabeça dela para trás, cuidadosamente, e a beijou nos lábios. Havia lágrimas silenciosas escorrendo pelas bochechas dela, mas Alex não conseguia vê-las por causa da água. Naquele exato momento, não tinha como contestar as palavras ridículas dele. Não conseguia. Não tinha a energia necessária. Não lhe sobrara quase nenhum espírito de luta. Não depois da gracinha autodestrutiva que aprontara menos de doze horas antes com o amigo dele. Quando Alex começou a fazer amor com ela, não foram só as mãos dele que lhe alisaram a pele. A culpa também estava ali, se manifestando dentro dela como uma doença. Ela usaria o que lhe restava de suas forças para evitar a vergonha esmagadora que ameaçava engoli-la por inteiro.
***
– Sim, na verdade, começo na semana que vem.
– Mas que fantástico! – continuou Lee, entrelaçando os dedos. – Fico contente pelo meu Alex ter conseguido um emprego em Greenwich Village para você. As escolas de lá são maravilhosas. – subitamente, o rosto de Lee se transformou de desgosto. – Mas devo dizer que fico horrorizada só de pensar que você chegou a cogitar um emprego em Bushwick, entre tantos lugares. É um horror, um horror absoluto.
Embora a declaração não a tivesse chocado, Demi estremeceu por dentro, mordendo a língua para não dar uma resposta malcriada. Lee era conhecida por só se cercar de gente que andava em carros que valiam uma pequena fortuna. Com seus cabelos pintados de louro em salões caríssimos, aplicações mensais de Botox e unhas de acrílico, Demi não sabia ao certo se ainda restava algo de original no corpo da mulher até mesmo os seios eram questionáveis. A única coisa verdadeira naquele “manequim” era o fato de ela ser uma senhora arrogante, interesseira e esnobe.
– Ora, Lee, estou certa de que Demi não tinha o menor conhecimento da demografia da cidade quando enviou seu currículo – opinou Richard, o pai de Alex. Passando uma das mãos pelos cabelos castanhos, ele se recostou na cadeira e a brindou com um sorriso amável. – Não estou certo?
Demi assentiu.
– Está, sim, Sr. Pettyfer. Eu simplesmente visitei o site do Departamento de Educação do Estado de Nova York e me candidatei a todas as vagas disponíveis no meu ramo.
Buscando a mão de Demi, Alex lançou um olhar fulminante para a mãe.
– Eu me responsabilizo por completo por não a ter prevenido sobre determinadas regiões. Ela não tinha a menor ideia de onde procurar.
Demi sorriu para ele, apertando sua mão com um pouco mais de força.
– Ah, Alex, meu amor, só você mesmo para defender a óbvia falta de pesquisa dela antes de se mudar de estado. – Lee deu um tapinha, com toda a doçura, nas costas do filho, mais ou menos no mesmo instante em que o sorriso de Demi desapareceu. – Era só o que teria sido necessário: um pouquinho de pesquisa para impedir...
Interrompendo-a, Demi controlou a voz, com todo cuidado, tentando manter a ponta de hostilidade ao mínimo.
– Caso não lembre, tinha muita coisa acontecendo na minha vida. Eu devo ter me esquecido no meio de... Bem, eu não sei... Da morte da minha mãe. – Demi coroou a réplica com uma adorável inclinação de cabeça.
– Ora, é claro que eu não me esqueci disso – falou Lee, jogando os cabelos por cima do ombro. – Eu só estava dizendo...
– Mamãe – advertiu Alex. – Já chega. – ele baixou os talheres e colocou os cotovelos na mesa, a expressão em seus olhos ordenando, com toda firmeza, que ela se calasse.
Com um arquejo, Lee se remexeu no assento e ajustou a gola do terninho Chanel que, de acordo com as suposições de Demi, devia ter custado o equivalente a dois meses do aluguel dela e de Selena.
Passando o braço por trás do encosto da cadeira da mulher, Richard olhou para ela:
– Isso, vamos deixar o assunto de lado.
Lee assentiu de má vontade e estendeu a mão para a taça de vinho tinto.
– Está bem.
Durante a meia hora seguinte, Demi permaneceu muda, tentando bolar algum plano para sair dali. Cegueira repentina, falência respiratória aguda e até mesmo uma parada cardíaca figuravam em sua lista de enfermidades imaginárias que serviriam de pretexto para sua partida. A tensão no ar era espessa como neblina. A enxaqueca entorpecedora causada pela ressaca só intensificava a necessidade de ir embora. Ficou grata quando o pai de Alex quebrou o silêncio, contando uma das suas piadas infames sobre uma prostituta e uma galinha.
Alex olhou para Demi depois que o garçom retirou os pratos.
– Gata, você vai pedir sobremesa, não vai?
Ela fez que não com a cabeça. Pensando bem, chegou a cogitar seriamente pôr mais uma garfada de comida na boca só para vomitar a mesa inteira e conseguir se safar do pesadelo. A ideia não era de todo ruim.
– Na verdade, vou, sim.
Enquanto esperava o tiramisù, Demi olhou para Alex e notou que ele começava a suar e que quase toda a cor estava sumindo de seu rosto. Se não estava enganada, a aparência dele estava tão ruim quanto as sensações que a permeavam. E isso era péssimo. Colocando a mão no rosto dele, Demi perguntou:
– Você está bem?
Ele assentiu e, com a mão trêmula, sacou o guardanapo de cima da mesa, secando o suor da testa. Demi lhe passou a água e, com alguns poucos goles, ele secou o copo. Ela olhou para os pais dele para sondar a reação de ambos em relação ao estranho comportamento do filho e viu os dois sorrindo como o Gato de Cheshire de Alice no País das Maravilhas.
Hein?
Quando seus olhos voltaram a Alex, ele se levantava da cadeira e uma das mãos deslizava não tão elegantemente para dentro do bolso da calça. Nos segundos seguintes, as visões e sons pareciam estar em câmera lenta.
Seu coração começou a saltar como um ratinho assustado correndo do predador.
Alex afastou a cadeira da mesa.
Tumtum....
Lentamente, se abaixou sobre um dos joelhos.
Tumtum...
Tumtum...
Sacou uma caixinha de veludo.
Tumtum...
Tumtum...
Linha isoelétrica...
Em algum lugar em meio a tudo aquilo que Demi estava testemunhando, sua mente nebulosa registrava outros clientes deixando escapar gritos de alegria enquanto observavam seu namorado.
Uma secura espessa que deixaria o deserto do Saara no chinelo se apossou de sua língua. Com a visão turva, varreu a multidão com os olhos, a maioria das pessoas exibia sorrisos largos e algumas apontavam para ela.
Um sujeito gritou: “Vai nessa, amigão”, finalizando com um assobio dado entre os dedos.
Fitando-o ajoelhado à sua frente, Demi se viu numa ansiedade infinita que fez com que ela gaguejasse a maior parte de suas palavras:
– Alex... o que... o que você está fazendo? – sussurrou ela.
Com a respiração acelerada, ele levou a mão de Demi à boca, deu um beijo suave e, com a voz baixa e trêmula, disse:
– Eu te amo, Demi.
Ele abriu a caixa, exibindo um anel de noivado com um diamante de lapidação quadrada que devia ter bem mais do que três quilates. Os olhos dele luziam com o que pareciam ser lágrimas.
– Você torna minha vida completa de todas as formas imagináveis. Você me daria a honra de se tornar minha esposa?
Ainda tentando processar o pedido e buscando desesperadamente um ritmo normal para sua respiração, Demi tomou o rosto dele entre as mãos, a voz mais baixa do que um sussurro:
– Alex, podemos conversar em particular, por favor?
Quase na mesma hora o sorriso dele sumiu, mas antes que ele pudesse responder, a mãe se pronunciou.
Ela contorcia o rosto como se estivesse ofendida.
– É claro que você vai dizer sim para meu filho – irritou-se.
Richard lançou um olhar letal e silenciador para a esposa.
Sem resposta, Demi mordeu o lábio e baixou os olhos para as próprias mãos, que retorcia sobre o colo.
Alex se levantou, lentamente, oferecendo à mãe um olhar de escrutínio. Estendeu a mão e tomou a de Demi com todo carinho.
– Está bem, gata. – a voz saiu baixa e falhou. – Tem um salão de festas aqui que a gente pode usar.
Demi deixou escapar o ar. Com a cabeça baixa pela vergonha, ela o seguiu até os fundos do restaurante. De soslaio, viu os observadores se endireitarem em suas cadeiras e voltarem a atenção a suas refeições. Os sussurros discretos por todo o restaurante soavam alto em seus ouvidos, como uma fanfarra escolar.
Alex fechou a porta do salão, a pergunta silenciosa pairando no ar. A expressão de desalento em seus olhos dizia tudo enquanto ele caminhava devagar e de braços cruzados até uma janela.
A voz de Demi foi pouco mais do que um sussurro, mas ainda assim se fez ouvir na outra extremidade, onde ele estava imóvel.
– Eu só preciso de um pouco de tempo, Demi. É só isso.
Sem se virar para ela, ele respirou e a voz saiu tão baixa quanto a dela:
– Eu não entendo, Demi. Já conversamos sobre isso várias vezes. Achei que você me amasse.
Demi soluçou, apesar da resolução de que manteria as coisas sob controle.
– Meu Deus, Alex, é claro que amo você. Mais do que pode imaginar.
As palavras deixaram um sabor podre, enquanto pensamentos assombrosos da noite anterior lhe azedavam o estômago. A última coisa da qual precisava era pensar em Joseph, mas de nada adiantava.
Lá estava ele, acomodando-se em seus pensamentos. O sorriso... os olhos... a risada... Tudo nele só fazia aumentar a confusão. A teoria de Demi sobre sua mente não desejá-lo foi estilhaçada por completo. E, de uma hora para outra, o coração ficou mais pesado.
– Nós nem moramos juntos ainda. Achei que esse seria o primeiro passo antes do casamento.
Alex se virou para olhá-la.
– Eu queria que você fosse morar comigo quando veio para Nova York, Demi. Foi você que não quis assumir esse compromisso. – enquanto Demi tentava se recompor, ele atravessou o salão. Com a mão trêmula, acariciou o rosto dela. – Amo você. Este é o nosso próximo passo, meu amor. Por favor, me diga se isso tem alguma coisa a ver com o que seu pai fez com a sua família. Eu nunca faria isso com você, Demi. Juro por Deus.
A visão de Demi retornou a uma lembrança de quase vinte anos. Por mais que negasse ter qualquer recordação de seu pai... tinha, sim. Uma em especial: da manhã em que ele saiu de casa e da vida dela em definitivo. Sua mente era inundada por lampejos do rosto confuso da menininha de 5 anos erguendo a vista para fitar um vulto alto de alguém que, mesmo sendo tão novinha, Demi já sabia amar com paixão. Os bracinhos minúsculos se agarrando à perna dele, tentando fazê-lo ficar, invadiram sua memória como uma visita indesejada. Mesmo tentando e Deus sabia que tinha tentado, não conseguira segurar com força o bastante. Ele era forte demais para seu corpinho.
Ainda podia ouvir o choro torturante da mãe e da irmã enquanto ele as xingava com palavras bêbadas que seus ouvidinhos inocentes nunca deviam nunca ter testemunhado. Agarrando um ursinho de pelúcia, Demi o seguiu aos tropeços até a porta da frente, chamando. Era um dia de sol. Essa era outra coisa da qual se lembrava. O sol brilhava em cima dele, formando uma silhueta, como a do anjo que ela acreditava que ele fosse, enquanto se afastava e entrava no carro. Lembrava-se de ter pensado que ele voltaria. Mas não voltou. Independentemente de quantas vezes ela se sentara com seu chá de mentirinha e suas bonecas à sua espera, ele nunca apareceu. E ela passou a infância fazendo isso: esperando por uma pessoa que nunca mais retornaria. Ele desapareceu por completo. Sumiu feito um fantasma. A lembrança revoltante fez aflorar mais um monte de lágrimas nos olhos já inundados.
No entanto, aquelas recordações perturbadoras nada tinham a ver com o fato de ela não desejar um casamento precipitado. Estava com medo. Na verdade, estava apavorada. Precisava morar com Alex antes de tomar uma decisão. Pelo menos era assim que se sentia naquele momento. Pensando bem, talvez devesse ter ido morar com ele desde o início, mas não podia mudar o passado. Todavia, agora o passado chegava batendo à sua porta de muitas formas perversas. Embora não fosse permitir que a culpa pelo que fizera na noite anterior influenciasse a resposta que daria a Alex, certamente a fazia questionar seu juízo moral bêbada ou não.
– Não tem nada a ver com o meu pai – sussurrou ela, fitando os olhos castanhos. – Eu só preciso de alguns dias para pensar direito.
Apertando os lábios, Alex assentiu laconicamente.
– Está certo, vou lhe dar todo o tempo de que precisar.
– Está zangado comigo? – perguntou ela, derramando mais lágrimas.
Ele fez que não com a cabeça e secou o rosto dela, com carinho.
– Não estou zangado com você, Demi. Chocado e confuso, sim, mas não zangado.
Alex a puxou para seus braços e deu um beijo no topo de sua cabeça. O corpo de Demi tremia de encontro ao dele enquanto ela soluçava um pouco mais. Não queria enfrentar os pais dele em especial a mãe, tampouco queria percorrer o restaurante outra vez. A vergonha era esmagadora.
Sentindo a ansiedade dela de alguma forma, Alex lhe entregou o papel do serviço de manobristas e a acompanhou até uma saída na lateral do prédio.
Saindo até um pequeno beco, Demi se virou para olhá-lo, relutante. Encarando-a, Alex hesitou por um instante antes de buscar a bolsa dela que havia ficado na mesa. Os olhos dele continham uma tristeza que Demi sabia ter causado, e os ombros que antes mostravam tanta autoconfiança estavam caídos. O homem que ela aprendera a enxergar como muito seguro de si havia perdido alguma coisa naquela tarde de domingo de final de agosto. O coração dela se apertou ainda mais do que poderia ter imaginado. A expressão de dor nos olhos de Alex ficaria eternamente gravada em sua lembrança. Quando ele fechou a porta, as palmas das mãos de Demi estavam escorregadias de suor e seus olhos estavam vermelhos de tanto chorar, e o corpo doía com uma tristeza profunda muito particular.
Alguns dias... eu só preciso de alguns dias, e depois, darei a resposta a ele...
Joseph não saber o que fazer agora, será que ele vai seguir o conselho de Trevor e esquece-lá?
essa mãe do Alex é uma nojenta, e o pedido de casamento? Será que a Demi vai aceitar?
só sei que viram muitas bombas pela frente hahaha
essa mãe do Alex é uma nojenta, e o pedido de casamento? Será que a Demi vai aceitar?
só sei que viram muitas bombas pela frente hahaha
gostaram amores? até o próximo.
Graças a Deus ela não aceitou o pedido!!! Tadinhos, os dois sofrendo um de cada lado!!! Só não entendo pq o Alex ajudou ela tanto, principalmente com a mãe e apronta com ela direto? Ele parece gostar dela mas vive enrolado com aquela outra lá. Tomara que o Joe se junte com a Selena e desmascare esse infeliz de uma vez por todas.... Ele é um verdadeiro empata foda!!! Continuaaa!!!! Ansiosa para a maratona!!!
ResponderExcluirTerá uma surpresa sobre o casamento no próximo capítulo que iriei postar hoje. O Alex gosta dela, o problema que ele é louco ciumento e completa babaca e a Demi fica confusa de vez de ficar logo com o Joseph.
ExcluirA Selena gosta do Joseph do que do Alex, vamos ver se ela vai aprontar pro os dois ficarem juntos hahaha
Sobre a maratona talvez eu poste ela na sexta-feira, adiantei uns capítulos mas não é certeza.
bjs lindona <3