30/04/2016

sussurros na noite: capítulo 13 (Parte 2)


Sentada ao lado de Selena, enquanto enfrentavam o trânsito de fim de tarde a caminho de casa, Demi sentia-se como se a magia das últimas horas tivesse espargido sua beleza por toda a cidade de Palm Beach. Lá em cima, o céu era de um azul luminoso, as nuvens ainda mais brancas, mais macias. O mar estava mais majestoso, a praia mais bonita. As cores estavam mais vivas, os sons eram mais suaves, e o ar marinho que batia em seu rosto era como uma bênção, e não apenas uma brisa. 
No dia anterior, Selena e ela haviam sido duas pessoas estranhas que se consideravam adversárias. Agora, eram irmãs que pensavam uma na outra como aliadas. Olhou para Selena, e o sorriso que ela enviou-lhe em resposta estava repleto da mesma alegria e prazer que Demi sentia. 
— Não tivemos tempo de falar sobre você e Nicholas - Selena disse quando se aproximavam da casa. — O namoro de vocês é sério?
Demi hesitou, atingida pela súbita e desagradável percepção de que aquele novo, maravilhoso e frágil relacionamento com a irmã acabaria sendo comprometido, no futuro, pelas mentiras que ela e Nicholas eram forçados a lhe impingir. Se Nicholas não descobrisse nenhuma evidência capaz de incriminar Patrick, então ao menos Selena seria poupada da verdadeira razão de sua vinda a Palm Beach. Neste caso, Demi teria de inventar um motivo por ter mantido seu trabalho em segredo. Porem, se as evidências acabassem aparecendo, então Selena logo conheceria toda a extensão daquela farsa, e Selena tinha até medo de pensar em qual seria sua reação. 
De qualquer forma, Demi estava de mãos atadas. Não podia dizer nada que prejudicasse a investigação de Nicholas, portanto resolveu ater-se à verdade o máximo possível, para que Selena tivesse menos motivos para se sentir enganada, fosse lá qual fosse o desfecho com Patrick.
— Na verdade, somos apenas amigos - disse. — Eu estava... um pouco insegura com a ideia de vir para cá sozinha. Nicholas convenceu-me de que era a melhor coisa a fazer e... ofereceu-se para vir comigo. 
— Para lhe dar apoio moral - Selena concluiu. — Ele parece ser uma ótima pessoa. Alguém em quem a gente sabe que pode confiar.
Demi fez um lembrete mental de jamais guiar-se pelo julgamento de Selena acerca dos homens.
— E quanto a você e Joseph? - indagou, ansiosa em desviar o foco da conversa sobre si. - Patrick contou-me que vocês estão praticamente noivos. 
— Papai está determinado a fazer com que isso aconteça. Já lhe disse que não quero casar com Joseph, mas ele simplesmente não entende.
— Por que não quer se casar?
 Selena enviou-lhe um sorriso cativante. 
— Provavelmente porque Joseph é um homem belíssimo, brilhante e incrivelmente rico, e as mulheres caem aos seus pés. No entanto, ele também não quer casar comigo, por isso fizemos um acordo secreto que resolve todo o problema. 
— Que tipo de acordo? 
— Joseph não vai pedir-me em casamento - ela respondeu rindo, e fez a curva para os portões de entrada. Estes abriram-se automaticamente, sem que ela parasse para apertar nenhum botão, nem usasse qualquer tipo de dispositivo eletrônico. 
A atenção de Demi foi desviada para o sistema de segurança da casa, primeiro por pensar na segurança de Selena, e depois por perceber que tal informação também poderia ser muito útil para Nicholas. 
— Você nunca fica com medo, aqui?
— Medo de quê? 
— De ladrões, de pessoas que rondam à noite. Esta casa é do tamanho de um museu. Se eu fosse um bandido, calcularia que existe um bocado de coisas aí dentro que valem a pena ser roubadas.
— Estamos bem seguros - Selena afirmou. — Além das grades, temos raios infravermelhos cercando todo o perímetro do terreno. À noite, estes raios são ligados automaticamente com o sistema de alarme. Há também dez câmeras posicionadas em torno da propriedade. Você tem medo de ladrões?
— Eu... acho que estou sempre preocupada com a segurança - Demi respondeu, tentando ater-se à verdade o mais que podia, pelo bem do seu futuro relacionamento com Selena. 
— Então foi por isso que fez um curso de defesa pessoal - Selena concluiu, e logo tentou tranquilizá-la com mais informações: — Se você ficar preocupada, pode ligar qualquer televisor da casa e verá o que as câmeras estão mostrando.  Sintonize no canal noventa, e depois siga até o canal número cem. Estes irão lhe mostrar todas as imagens captadas por todas as câmeras da propriedade. Isto é, eu acho que são estes canais, mas Gary poderá lhe dizer ao certo. Vou perguntar a ele. Papai e Gary planejaram todo o novo sistema de segurança.
— Obrigada... - Demi falou, baixinho. 
— Além disso, se você escutar ou ver algo que realmente a deixe assustada, pode pegar qualquer telefone da casa, apertar a tecla de asterisco e ficar pressionando. Mas não tente fazer isso a não ser que acredite que haja mesmo algum problema. Certa vez, apertei a tecla acidentalmente, logo que o sistema foi instalado. Estava tentando abrir os portões pelo interior da casa, mas esqueci de apertar a tecla do interfone antes de pressionar a tecla de asterisco. 
— E o que acontece quando isto é feito?
— Tudo - Selena respondeu com um risinho. — Um alarme soa direto na delegacia de polícia, as sirenes na casa começam a tocar, e todas as luzes da propriedade, de dentro e de fora, acendem-se e começam a piscar.
Demi concluiu que aquele sistema era muito semelhante às instalações de segurança integrada com telefone, que causaram tantos problemas e dissabores a Karen Althorp e ao dr. Pembroke, em Bell Harbor. 
Selena fez a volta pela casa até uma garagem com espaço para seis carros, e uma das portas abriu-se automaticamente.
— Não vi você usar nenhum aparelho para abrir os portões, nem esta porta da garagem - Demi comentou. 
— Há um dispositivo eletrônico escondido em algum lugar nos nossos carros. Quando nos aproximamos da garagem, o dispositivo no carro dá um aviso ao dispositivo instalado na porta, e ela se abre. O mesmo se aplica aos portões de entrada.
— Parece que ninguém que não deva estar aqui é capaz de entrar ou sair da propriedade - Demi observou quando Selena entrou em sua vaga na garagem.
— Qualquer pessoa pode sair, desde que Nordstrom tenha dado permissão para entrar. Existem sensores sob o pavimento da entrada, que abrem os portões quando o peso de um carro passa sobre eles. Do contrário, Nordstrom teria de ficar à disposição para abrir os portões sempre que um caminhão de entregas ou um criado precisassem sair.
— Vocês realmente fazem parte da era eletrônica - Demi comentou, sorrindo.
 — Papai é extremamente cuidadoso com a segurança. 
Demi temia que, provavelmente, ele tivesse mais do que um motivo para agir assim. 

Gary Dishler materializou-se no vestíbulo, vindo de um comodo perto da escada, assim que Selena e Demi entraram. 
— A Sra. Lovato esteve procurando por você - ele disse a Selena. — Ela está lá em cima, em seus aposentos. 
— Está tudo bem com ela? - Selena indagou, preocupada.
— Se estiver sofrendo de alguma coisa, só pode ser de tédio - Gary assegurou-lhe.
Enquanto Selena confirmava com ele se eram os canais noventa e cem que exibiam as imagens das câmeras de segurança, Demi ficou observando o mordomo, que estava ali perto. Nordstrom tinha quase dois metros de altura, cabelos loiros, olhos azuis, um rosto corado e o físico musculoso. Quando subiam as escadas, ela confiou seus pensamentos a Selena:
— Nordstrom parece mais um guarda-costas do que um mordomo. 
— Eu sei - Selena concordou, sorrindo. — Ele é realmente assustador.
Ainda estavam sorrindo quando entraram no quarto de Marie Lovato. A velha senhora estava sentada numa poltrona de veludo cor de vinho com franjas nas bordas, nos fundos de um quarto que era quase do tamanho da casa inteira de Demi, e entulhado com tantos móveis escuros e ornamentados que Demi sentiu-se ligeiramente claustrofóbica
A Sra. Lovato resmungou baixinho enquanto tirava os óculos e deixava o livro de lado. 
— Vocês ficaram fora a tarde toda - acusou. - Bem dirigiu-se a Selena -, — Como foi a aula de golfe de Demi? 
— Não fomos ao clube - Selena respondeu. 
As sobrancelhas brancas de Marie arquearam-se, mas antes que ela dissesse qualquer coisa Demi adiantou-se. Tentando ao mesmo tempo proteger Selena da desaprovação da senhora, bem como melhorar seu humor, Demi deliberadamente transformou sua recusa em jogar golfe numa brincadeira:
— Selena quis obrigar-me a jogar golfe, mas eu implorei por piedade; depois, recusei-me a sair do carro. Ela bem que tentou puxar-me para fora, mas sou mais forte. Ela até tentou me bater com um taco de golfe, mas então lembrei-a de que a senhora não aprovaria um espetáculo público como aquele, e ela teve de desistir.
— Você está sendo impertinente - Marie declarou, mas estava encontrando dificuldades em manter a expressão severa. 
Demi deixou que seu divertimento aflorasse. 
— Sim, senhora, eu sei. Mas parece que não consigo evitar.
— Já lhe disse para chamar-me de bisavó! 
— Sim, bisavó - Demi apressou-se em corrigir, pressentindo que, se cedesse naquele ponto, talvez pudesse atingir seu objetivo. E estava certa, pois os lábios de Marie curvaram-se num sorriso relutante.
— É também abusivamente teimosa
Demi assentiu, com um ar travesso.
— É o que minha mãe costuma dizer. 
Vendo-se a ponto de perder aquele embate verbal, Marie salvou-se dispensando Demi com um aceno de mão.
 — Pode sair. Já aguentei o bastante. Preciso falar com Selena em particular.

Satisfeita em saber que Selena não seria repreendida pela aula de golfe malograda, Demi fez o que a senhora dizia, mas não antes de reparar na expressão atônita da irmã.

Depois que Demi saiu, Marie indicou a poltrona à sua frente.
— Sente-se. Quero saber o que vocês fizeram e sobre o que conversaram. 
— Almoçamos no Lê Gamin e conversamos sobre tudo - Selena respondeu, sentando-se.
Por mais de uma hora, tentou repetir o que Demi dissera, mas era constantemente interrompida pelas perguntas penetrantes da bisavó.
— Foi maravilhoso! - Selena exclamou quando a inquisição finalmente parecia encerrada. — Eu teria ficado ali o resto do dia e a noite inteira. Demi sentiu-se da mesma forma, eu sei.
 — E agora - Marie falou, com frieza -, — Suponho que esteja querendo ir até Bell Harbor para conhecer sua mãe. 
Selena preparou-se para uma enxurrada de oposições, mas não recuou como normalmente faria. 
— Sim, para dizer a verdade, eu gostaria. Demi contou-me tudo sobre ela, e não é nada como papai e a vovó descreveram. 
— Você conhece Demi há menos de dois dias, e está mais disposta a acreditar na palavra dela do que na de Patrick e sua avó
Selena concentrou-se no que ia dizer, para não gaguejar. 
— Não estou acreditando na palavra de ninguém. Simplesmente quero tirar minhas próprias conclusões. 
Em vez de lhe passar uma descompostura verbal, como Selena esperava, a bisavó recostou-se na poltrona e encarou-a. Após um silêncio tenso e prolongado, disse: 
— Parece que a teimosia e rebeldia de Demi são notavelmente contagiosas.
— Espero que sim - Selena afirmou, empinando o queixo. 
— Se ainda estiver interessada no conselho de alguém sobre qualquer coisa, sugiro que evite compartilhar com seu pai esta nova opinião que tem de sua mãe. Selena assentiu e levantou-se. 
— Posso sair agora? 
— Fique à vontade - Marie respondeu. 
Marie Lovato observou-a sair do quarto e, por vários minutos, permaneceu imóvel e quieta, perdida em pensamentos. Depois, pegou o telefone ao lado da poltrona e discou um número particular, que não constava da lista.
— Tenho um serviço para você, Wilson - disse ao homem que atendeu. — Terá de ser feito muito discretamente e o mais rápido possível. 
Então, explicou a ele o que queria. 

sussurros na noite: capítulo 13 (Parte 1)


Demi não tinha ideia do quanto o FBI sabia a respeito de Patrick Lovato e suas finanças, ou sobre o que suspeitavam que ele estivesse fazendo, mas achou que seria importante contar a Nicholas tudo o que ficara sabendo. Frustrada pelo fato de que aquela troca de informações era uma via de mão única, bateu na porta do quarto dele. Quando não houve resposta, seguiu pelo corredor até seu próprio quarto e descobriu que a porta estava trancada. Girou a maçaneta, perguntando: 
— Olá? Há alguém aí?
A porta abriu tão de repente que ela deu um passo para trás e arregalou os olhos para Nicholas, que estava de short e camiseta e segurava o livro dela na mão, com um dos dedos entre as páginas como se estivesse marcando o lugar onde havia parado. 
— O meu quarto não tem varanda, por isso achei que podia usar a sua para ler um pouco até você voltar - ele explicou. 
Demi sabia que ele estava mentindo, para o caso de haver alguém entreouvindo no corredor. Seguiu-o para dentro e fechou a porta. 
— O que está realmente fazendo
— Verificando se há algum ”grampo”. Não encontrei nada. A ideia de que uma residência particular pudesse ter sido ”grampeada” pelo seu proprietário era absurda, e foi o que Demi falou. 
— É apenas uma precaução. Seu pai tem a fama de ser um homem extremamente cauteloso. — Nem tanto, do contrário nós não estaríamos aqui - ela brincou. — E, por falar no porquê de estarmos aqui – acrescentou com um sorriso satisfeito -, — Acabei de ter uma conversa esclarecedora com minha bisavó. Você sabia que ela controla a maior parte do dinheiro da família? 
— Está se referindo ao Fundo de Investimento dos Hanover?  
Um tanto desapontada, Demi fez que sim. 
— O que ela lhe contou? Demi repetiu todos os trechos pertinentes da conversa com a bisavó, quase literalmente. 
— Nenhuma novidade - ele disse. — Nada de significativo, pelo menos. Vocês ficaram juntas por bastante tempo, sobre o que mais conversaram? 
Demi relatou o restante da conversa, e ele pareceu bem mais satisfeito com isso do que com a informação que ela julgara ser tão importante.
— Se Marie quer que você passe seu tempo com Selena, obedeça. Eu vou ficar por aqui, quem sabe consigo descobrir alguma coisa. 
— Sobre o quê? - Demi inquiriu, atirando as mãos para o alto num gesto de frustração. — O que suspeita que ele esteja fazendo? Creio que tenho direito a um mínimo de explicação. 
— Quando achar que você precisa saber de alguma coisa, eu lhe conto.
Tentando imitar o tom indiferente dele, ela retrucou: 
—  Então, quando eu descobrir alguma coisa que você precisa saber, creio que teremos de negociar. 
Demi esperava que ele reagisse com alguma brincadeira, ou que ficasse zangado. Mas a reação dele foi bem diferente. 
— Existem dois homens em Palm Beach com quem você nunca vai querer negociar, Demi. Eu sou um deles. 
— E quem é o outro? - ela perguntou, apanhada de surpresa pela ameaça velada que percebia na voz dele. 
— Joseph Jonas. Obrigado por me deixar usar a sua varanda - ele disse, para todos os efeitos, quando saiu para o corredor. 
Fechando a porta, Demi foi devagar para o banheiro a fim de tomar uma ducha.
Nicholas era completamente imprevisível, incompreensível e determinado, mas havia vezes em que também se mostrava encantador e até gentil. 
Agora, Demi tinha a desconfortável sensação de que tais qualidades pudessem ser apenas uma fachada. 



Palm Beach,
Flórida, 14:00 A.M


Selena estava esperando no vestíbulo, quando Demi desceu as escadas. 

— O carro está aqui na frente - ela avisou, e Demi seguiu-a para fora.
Um Jaguar conversível num tom de dourado pálido estava parado na entrada de veículos, e quando passaram pelos portões principais, Demi observou o sol reluzindo nos cabelos castanhos escuros de Selena. Estava pensando em como sua elegante irmã combinava perfeitamente com aquele carro elegante, quando Selena virou o rosto e percebeu que Demi a olhava. 
— Esqueceu alguma coisa? - Selena perguntou. 
— Não, por quê? 
— Está com uma expressão estranha. 
Depois de tudo o que vira e escutara sobre Selena naquele dia, Demi desejava desesperadamente derrubar a barreira de formalidade que as separava, e conhecer melhor a sua irmã. Aproveitou a chance que tal pergunta lhe oferecia. 
— Eu estava pensando que este carro é muito bonito e que combina com você. 
Selena quase perdeu o controle do volante, quando se virou novamente para olhá-la. 
— Não sei o que dizer.
— Pode dizer qualquer coisa que lhe vier à mente. 
— Bem, então, acho que eu estava pensando que esta era a última coisa que esperava que você dissesse.
Demi começava a duvidar que a conversa evoluiria para além disso, quando Selena acrescentou, num só fôlego:
— E também pensei que foi algo muito gentil, isso que você disse. - Ela infundiu a palavra com tanto calor que Demi soube que se tratava de um grande elogio.
Quando viraram à esquerda, entrando numa avenida larga, Selena prosseguiu, hesitante: 
— Não lhe parece estranho estarmos aqui neste carro sabendo que somos... irmãs? 
Demi assentiu. 
— Eu estava pensando a mesma coisa. 
— Você não é nem um pouco como eu imaginava. 
— Eu sei. 
— Sabe? 
— Sim. Sua bisavó contou-me o que você disse a ela. 
Selena enviou-lhe um olhar rápido e tímido. 
— Ela é sua bisavó, também. 
Algum diabinho maldoso fez com que Demi retrucasse: 
— Por algum motivo, acho mais fácil aceitar que você seja minha irmã, do que ela seja minha bisavó. 
— Ela é um pouco difícil de se conhecer. Costuma intimidar as pessoas. 
Incluindo você, Demi pensou. 
— Ela a intimida? - Selena perguntou. 
— Não muito. Bem, um pouquinho, talvez - Demi admitiu. 
— A maioria das pessoas fica aterrorizada na presença dela. 
— Ela não é exatamente uma bisavó típica, pelo menos não do jeito que imagino. 
— Como é a sua avó?
— Quer dizer, a mãe da nossa mãe? - Demi perguntou, com gentileza. 
— Sim.
— Ela faleceu quando eu tinha sete anos, mas lembro-me que era muito... aconchegante. E estava sempre cheirando a biscoitos.
— Biscoitos?  Demi fez que sim.
— Ela adorava cozinhar, fazer doces, bolos. Era um pouco gordinha, talvez seja por isso que penso nela como ”aconchegante”. Sempre tinha biscoitos prontos para Sara e para mim. 
— Sara? 
— É uma amiga de infância, que até hoje é a minha melhor amiga. 
Um silêncio incomodo se seguiu, aquele tipo de silêncio entre duas pessoas que desejam avançar, mas que se sentem tão aliviadas por atingir o ponto em que estão que receiam dar os passos seguintes. Demi respirou fundo e rezou para que estivesse dizendo a coisa certa. 
— Você gostaria de saber como é a nossa mãe? 
— Se quiser me dizer. Você é quem sabe. - Levantando o rosto para o vento, Demi olhou para o lado e refletiu sobre a resposta evasiva de Selena. 
— Se não formos honestas e francas uma com a outra - disse, com tranquila sinceridade -, não teremos a chance de nos conhecermos de verdade, e eu não quero perder esta oportunidade. O que acha de fazermos um pacto de dizer somente a verdade uma para a outra, e tudo o que realmente estamos sentindo? Isso vai exigir uma boa dose de confiança, mas estou disposta a tentar. E você?
As mãos de Selena fecharam-se em torno do volante, enquanto considerava aquela ideia.
— Sim - murmurou, afinal. — Sim! - declarou em voz alta, com um sorriso tímido e assentindo com vigor. 
Demi fez o primeiro teste no novo pacto. 
— Neste caso, gostaria de saber como é a sua mãe? 
— Gostaria, sim. 
— Isso é fácil - Demi começou, com uma expressão de contentamento. — Ela é muito parecida com a impressão que, até agora, eu tive de você. É bondosa, não gosta de ferir os sentimentos das pessoas. Adora roupas bonitas e trabalha na butique mais elegante de Bell Harbor. Todos que a conhecem a adoram, exceto Lydia, que é a dona da loja. Lydia a maltrata e amedronta terrivelmente e está sempre aproveitando-se da sua bondade, mas mamãe inventa desculpas para tal comportamento. - Demi interrompeu-se ao ver a entrada do clube de campo. - Selena, não vamos jogar golfe. Vamos fazer qualquer outra coisa, em vez disso. 
— Mas papai quer que você tenha uma aula. 
— Eu sei, mas suponha que eu lhe diga que me recuso terminantemente a jogar. Neste caso, o que ele poderia fazer? 
Demi imaginou se ele iria esbravejar, enfurecer-se, ou coisa pior. O homem tinha um temperamento imprevisível. 
— Ele vai zangar-se com você? 
Selena ficou chocada com tal sugestão.
— Não, mas ficará extremamente desapontado.
— Entendo. Você diz ”desapontado” do jeito que ele ficou na quadra de tênis, hoje cedo?
— Sim, mas desta vez ele ficaria muito desapontado com nós duas. Hoje cedo, foi só comigo. — Ele não consegue superar os desapontamentos com a mesma rapidez e facilidade que outras pessoas - Selena explicou, como se este fosse um problema dela, e não do pai. Como se fosse um fato justificável que Demi deveria aceitar e compreender, da mesma forma que ela compreendia e aceitava.
Demi entendia perfeitamente: seu pai não era do tipo que se valia da violência física. Em vez disso, utilizava-se da tirania emocional, uma forma mais sutil porem igualmente eficiente de dominação brutal. 
— Se eu me recusasse terminantemente, então ele não poderia ficar desapontado com você, certo? 
— Não, creio que não.
— Você quer jogar golfe?
A hesitação de Selena prolongou-se tanto que Demi não teve certeza se ela não queria responder, ou se simplesmente não sabia o que queria. 
— Não, para dizer a verdade, não quero. Não gosto de jogar golfe tanto quanto papai desejaria. 
— Se pudéssemos fazer qualquer coisa que você quisesse, agora, o que seria? 
— Poderíamos almoçar em algum lugar, e ficar conversando. 
— Eu adoraria! E, desde que me recuso terminantemente a jogar golfe, ele não pode ficar desapontado com você, portanto vamos almoçar e conversar. 
Mordendo o lábio, Selena hesitou. Depois, virou o carro subitamente, entrando por uma rua lateral. 
— Conheço um lugar perfeito. É um tipo de café, e podemos almoçar na parte de fora. Ninguém irá nos incomodar ou nos apressar
Em Bell Harbor, um café era um lugar para lanches rápidos e informais, um tipo de lanchonete. Mas em Palm Beach, o ”café” para onde Selena a levara era um pretensioso restaurante francês, com uma pérgula na porta de entrada, um átrio envidraçado e uma fonte, e manobrista. 
O manobrista sabia o nome de Selena, bem como o maitre que as recebeu.
— Gostaríamos de almoçar lá fora, Jean - Selena informou, com aquele sorriso bem-educado que Demi passara a admirar depois de descobrir que era genuíno. 
— Posso lhes trazer algo para beber? - o maitre perguntou, depois que se sentaram a uma mesa perto da fonte, com vista para as lojas no outro lado da rua.
Selena olhou para Demi como se esperasse que ela decidisse, mas subitamente respondeu:
— Acho que vamos tomar champanhe. Traga-nos o melhor que tiver, para comemorarmos uma ocasião especial. 
— Um aniversário? - ele tentou adivinhar.
 Selena balançou a cabeça e olhou timidamente para Demi. 
— Digamos que seja um renascimento - disse. 
Quando o homem se afastou, seguiu-se uma pausa silenciosa, enquanto as duas tentavam pensar em como começariam a se conhecer. Na calçada ali em frente, passou uma jovem mãe empurrando um sofisticado carrinho de bebé, e um adolescente ultrapassou-a correndo com a bicicleta. 
— Ganhei minha primeira bicicleta de duas rodas quando tinha cinco anos - Demi falou para quebrar o silêncio. — Era grande demais para mim, e eu trombava com todos por quem passava, até que finalmente aprendi a me equilibrar. O guarda de trânsito da escola dizia que eu era um perigo.
—  Você sempre soube que queria ser uma designer de interiores? 
Embora Demi tivesse de ocultar algumas coisas sobre sua vida atual, estava determinada a ser honesta com Selena em tudo o mais. 
— Na verdade - confessou -, — Eu sempre quis seguir uma carreira do tipo Super mulher, ou Batgirl. E você? 
—  Assim que ganhei a minha primeira boneca, comecei a pensar num enxoval apropriado para ela - Selena admitiu. — Por isso, creio que sempre estive interessada em moda.
Um garçom chegou trazendo uma garrafa de champanhe num balde de prata, e Demi esperou que ele terminasse de servir as bebidas enquanto observava um casal de adolescentes passeando pela calçada de mãos dadas. 
— Eles parecem jovens demais para estar namorando, não acha? - comentou e, quando Selena assentiu, aproveitou a chance de mudar de assunto. — Quantos anos você tinha quando saiu com um rapaz pela primeira vez?
— Dezesseis - Selena respondeu. — O nome dele era David, e levou-me ao baile de formatura da escola. Eu queria ir com um garoto chamado Richard, mas papai conhecia a família de David e achou que seria um acompanhante mais aceitável. 
Aquilo deixou Demi intrigada.
— E como foi? 
— Terrível - Selena confessou com um sorriso e um estremecimento. — Depois do baile, quando me levou para casa, ele ficou bebendo o tempo todo. Então, parou o carro e começou a me beijar. E não queria parar, até que finalmente desatei a chorar. E o seu primeiro encontro, como foi? 
— Bem parecido com o seu - Demi respondeu, rindo. — Saí com Butch Bellamy, que era muito mais alto do que eu e não sabia dançar. Passou a maior parte da noite no vestiário, bebendo com os companheiros do time de futebol da escola.
 A caminho de casa, parou o carro e começou a me beijar e a me agarrar. 
Rindo, Selena adivinhou o fim da história: 
— E você também caiu no choro, para que ele a levasse para casa.
— Não. Disse-lhe que, se não me deixasse sair do carro, eu diria a todos os seus amigos do time que ele era gay. Então, tirei o meu primeiro par de sapatos altos e fui andando por quase três quilômetros, destruindo meu primeiro par de meia-calças. Você nem imagina como estavam, quando cheguei em casa. 
Selena tornou a rir, e Demi ergueu a taça para um brinde. 
— A nós, por termos sobrevivido aos nossos primeiros encontros - disse, sorrindo solenemente. 
O garçom retornou naquele instante, entregando-lhes um cardápio aberto. Ansiosa por manter a alegre camaradagem que se instalara entre elas, Demi espiou-a por cima do cardápio.
— Qual é a comida que você menos gosta?
— Couve-de-bruxelas. E você? 
— Fígado. 
— Dizem que se o fígado for preparado com... - Demi balançou a cabeça. 
— Não existe nenhuma maneira de se preparar fígado e deixá-lo comestível. Talvez não sejamos irmãs de sangue, no fim das contas. Talvez eu tenha sido adotada e... Por que está rindo? 
— Porque eu estava apenas repetindo o que as pessoas costumam dizer. Detesto fígado. Fico enjoada, só de pensar.
— O reflexo do enjoo é a prova definitiva. Somos parentes, não há mais dúvida - Demi decretou com animação, mas Selena ficou séria. 
— Ainda não temos certeza - ela sentenciou. — Esta é a pergunta definitiva, por isso pense bem antes de responder: como se sente em relação à sopa de tomate? 
Demi estremeceu e as duas caíram na risada. 
O garçom deixara uma cesta de pãezinhos frescos na mesa, e Selena pegou um.
—  Você já foi casada? - perguntou. 
— Não - Demi respondeu. — E você?
— Quase. Fiquei noiva aos vinte e cinco anos. Henry tinha trinta e dois, e nos conhecemos numa festa em Santa Barbara. Dois meses depois, ficamos noivos.
Demi fez uma pausa, enquanto escolhia um pãozinho. 
— E o que aconteceu? 
— No dia seguinte ao nosso noivado, papai descobriu que Henry tinha uma ex-mulher e dois filhos morando em Paris. Eu não me importaria com isso, contanto que ele não tivesse mentido quando me disse que nunca havia se casado.
— Deve ter sido horrível para você. 
— Foi, no início. Papai não havia confiado nele desde o começo.
Demi podia imaginar que tipo de apoio Selena devia ter recebido de Patrick Lovato, e sentiu uma pontada de tristeza e raiva, por sua irmã não ter podido contar com ela mesma, nem com sua mãe, para ajudá-la a atravessar um momento tão difícil. 
— E como seu pai descobriu tudo?
— Ele também é seu pai - Selena lembrou-a, com um sorriso maroto. Depois, respondeu: — — Quando Henry e eu começamos a namorar, papai decidiu investigá-lo, mas o relatório vindo da Europa só chegou depois que anunciamos o noivado. 
Demi tentou não demonstrar a desconfiança que os motivos e a integridade de Patrick começavam a lhe provocar.
— Ele costuma mandar investigar os seus amigos? 
Para choque de Demi, Selena assentiu como se esta fosse a coisa mais natural do mundo.
— Não apenas os meus amigos, mas também outras pessoas que ele não conhece e que começam a passar tempo demais em nossa companhia. Papai acredita que é melhor ser cuidadoso, no que se refere às pessoas com quem nos relacionamos. Ele não confia com muita facilidade. - Selena olhou para o pãozinho que tinha nas mãos, e depois novamente para Demi.
— Vamos mudar de assunto. O rompimento do meu noivado não merece nem mais um minuto do nosso tempo precioso. 

Depois disso as horas voaram, repletas de perguntas hesitantes, respostas sinceras e sorrisos calorosos, enquanto as duas estranhas, que se dispuseram a formar um laço de amizade, descobriam que este laço já existia. Ignorando os garçons, a comida e os olhares admirados dos homens que passavam, duas lindas morenas ficaram um longo tempo naquela mesa sob um guarda-sol listrado e, cautelosamente, construíam uma ponte para transpor trinta anos de distância. 

Esse capítulo ficou bem grande então irei dividi-ló em duas partes, o que acharam do capítulo? Bjs lindonas!!!

29/04/2016

sussurros na noite: capítulo 12


Palm Beach
Flórida, 8:30 A.M

Na quadra de tênis, o pai e a irmã de Demi não apenas estavam esplêndidos com seus trajes brancos e corpos bronzeados, como também possuíam a graciosidade e a força de dois puros sangues perfeitamente integrados, e ela não pôde evitar de sentir-se muito impressionada no início do primeiro game do set. 
Mas, ao final daquele game, Demi já percebera mais uma coisa: seu pai jogava tênis como se a quadra fosse um campo de batalha e não tinha a menor piedade do inimigo, mesmo sendo tão óbvio que o jogo de Nicholas e Demi era irremediavelmente inferior. Além disso, tampouco demonstrava piedade em relação à sua parceira. Sempre que Selena cometia o que ele julgava ser um erro, não importava quão insignificante, ele a repreendia ou criticava. 
Tal atitude fez com que Demi se sentisse tão desconfortável que teve vontade de gritar de alegria, quando faltava apenas um game para terminar o set. Porem, em vez disso, ficou junto de Nicholas em seu lado da rede, tentando fingir que não ouvia o pai criticar Selena pela maneira como ela fizera o último ponto.
— Você ficou perto demais da rede a manhã inteira! Nicholas só perdeu o seu último saque porque você teve muita sorte. Apenas os perdedores contam com a sorte, Selena. Os vencedores dependem da própria habilidade. Você sabe disso, não é? 
— Sei, sim - Selena respondeu, tão controlada e educada como sempre. 
Porem, Demi sabia que ela devia estar se sentindo profundamente envergonhada, e imaginou se Patrick costumava comportar-se daquela forma quando jogavam com outras pessoas e em outros lugares.
— Isso é incrível! - Demi cochichou para Nicholas. — Por que ela não o enfrenta e diz que estava fazendo o melhor possível? 
— Ela não está fazendo o melhor possível - Nicholas respondeu. — Está tentando jogar bem o bastante para agradá-lo, mas não tão bem a ponto de nos fazer sentir totalmente deslocados aqui.
Demi sentiu um aperto no peito. Tivera a mesma impressão, mas quando Nicholas expressou-a com palavras transformou-a em fato, tornando impossível que ela continuasse ignorando a contrariada simpatia que nutria por Selena.
A personalidade de Patrick sofreu uma alteração completa para melhor, assim que a partida terminou. Com todo o charme cordial que exibira no dia anterior, marchou para perto da rede e enviou um sorriso de aprovação para Demi.
— Você tem um talento natural, Demi - disse. — Com a ajuda de um bom treinador, poderia tornar-se uma tenista de verdade. Posso ensinar-lhe algumas coisas, enquanto estiver aqui. 
Melhor ainda, vou lhe dar uma aula agora mesmo. 
Tal declaração provocou um riso aterrorizado em Demi.
— É muita bondade sua, mas acho que vou recusar.
— Por quê? 
— Porque não gosto muito de jogar tênis. 
— Mas isso é porque você não explora ao máximo toda sua capacidade. 
— Talvez o senhor esteja certo, mas prefiro não tentar.
— Tudo bem. Mas vejo que está em excelentes condições físicas. Gosta de correr, não é? E o que mais você faz?
— Não muita coisa.
— E quanto aquele curso de defesa pessoal que você frequentou? Deve ter aprendido taekwon-do ou jiu-jítsu?
— Sim, um pouco - Demi respondeu, evasiva. 
— Ótimo. Eu pratiquei artes marciais durante alguns anos. Vamos até ali e você poderá me mostrar o que sabe fazer. 
O sujeito não era apenas do tipo atlético, era um competidor compulsivo, Demi concluiu chocada, e não desistiria até que ela cedesse, de um jeito ou de outro. Ela também sabia que Patrick Lovato não gostava de perder, e desde que seu objetivo ali era cair nas boas graças dele, não lhe parecia uma boa ideia humilhá-lo. 
— Não sei se é uma boa ideia... 
— Não se preocupe, iremos devagar - ele insistiu. Ignorando seus protestos, deixou a raquete de tênis na grama e deu alguns passos para a frente. — Vamos lá.
Demi lançou um olhar pedindo socorro a Nicholas, e reparou que Joseph Jonas cruzava o gramado na direção deles, trazendo na mão um grande envelope de papel pardo. 
Patrick também o avistou, e acenou.
— Não sabia que você viria hoje cedo, Joseph.
— Trouxe alguns papéis para você e Marie assinarem - o outro explicou. 
— Estarei com você num instante. Demi fez um curso de defesa pessoal recentemente e está prestes a mostrar-me o que aprendeu. 
— Fiquem à vontade.
Com grande relutância, Demi deixou a raquete de tênis no chão, ao lado da de seu pai. Selena parecia nervosa, mas ficou em silêncio. Nicholas também parecia nervoso, mas Demi não sabia se ele estava preocupado com a possibilidade de ela se machucar, ou com a possibilidade de ela machucar o anfitrião deles. Joseph Jonas cruzou os braços no peito com uma expressão cética, o que deixou Demi ainda mais tensa.
— Não quero atrapalhar a reunião de vocês - disse a Joseph, esperando suscitar uma desistência de última hora. — Tenho certeza de que estes documentos são muito mais importantes do que isso aqui. 
— Não para mim - ele disse, e fez um gesto de cabeça na direção de Patrick. — Fiquem pelo tempo que for necessário. 
Demi achou aquela atitude um tanto estranha, mas não tinha escolha, exceto fazer o que ele sugeria. Encaminhou-se para o pai, lembrando-se de que não importava como ele se comportasse, não deveria derrubá-lo no chão.
— Está pronta? - ele perguntou, com uma breve e solene inclinação. 
Demi assentiu e retribuiu a mesura. 
Patrick moveu-se tão subitamente que Demi não teve tempo de reagir, e ele marcou um ponto com uma facilidade vergonhosa.
— Você não estava atenta - ele disse, no mesmo tom irritante de censura com que falara com Selena durante a partida de tênis. Em vez de lhe dar tempo para voltar à sua posição, tornou a atacá-la, apanhando-a de surpresa. — Demi, você não está se concentrando. 

Demi decidiu que, afinal, seria uma boa ideia derrubá-lo no chão. Ele adiantou-se, pensou ter visto uma abertura e atacou. Demi rodopiou para o lado e com um chute alto e rápido enviou-o direto para a grama.
— Acho que desta vez me concentrei um pouco mais - ela disse, docemente.
Um tanto mais abatido, agora, ele levantou-se e andou em círculos, procurando um novo alvo para o ataque. Mentalmente, Demi reconheceu que ele era realmente muito bom, mas também autoconfiante demais. Ele atacou; ela aparou o golpe com um bloqueio e atingiu-o na altura do diafragma, fazendo-o perder o fôlego. 
— E fiquei mais atenta desta vez - ela confessou. Demi estava acostumada com atacantes furiosos e, quando marcou o ponto seguinte, deu-se conta de que ele se tornara um deles. Ele vergou o corpo, o rosto rubro de vergonha e raiva, e seus movimentos perderam toda a graça e estilo. Esperou por uma abertura; depois girou e chutou para o alto, mas sem conseguir atingi-la. No instante em que ele se recuperou Demi acertou outro golpe, e então decidiu que já era hora de encerrar a ”exibição”, antes que fosse forçada a machucá-lo, ou correr o risco de ser atingida. 
Pousando as mãos nos quadris, afastou-se dele. 
— Para mim já chega - riu, tentando dissipar a tensão — O senhor joga duro demais.
— Ainda não acabamos - ele falou, limpando a grama da roupa.
— Acabamos, sim. Estou exausta. 
Para surpresa de Demi, foi Joseph Jonas quem veio em seu socorro.
— Patrick, é indelicadeza ficar agredindo os convidados no segundo dia de visita. 
— É verdade - Demi brincou. — Deve-se esperar pelo menos até o terceiro dia. - Virou-se para pegar a raquete caída aos pés de Joseph mas ele apanhou-a primeiro, e lhe entregou. 
— Meu pai mandou-lhe lembranças - disse, e o encanto de seu sorriso lento foi tão irritante que Demi teve dificuldade de entender suas palavras, enquanto pegava a raquete. 
— Desculpe? 
— Meu pai disse que teve uma conversa fascinante com você, hoje cedo. Ficou muito impressionado. 
— Eu não sabia que ele era seu pai - Demi balbuciou, horrorizada. 
— Foi o que pensei. - Joseph voltou-se para Patrick, dando a Demi a oportunidade de escapar dali. — Patrick, se quiser comparecer ao seu jogo de pôquer de todas as quintas, eu gostaria de levar Demi, Nicholas e Selena para jantar esta noite. 
Demi já se encaminhava para a casa ao lado de Nicholas, mas ouviu o pai responder: 
— Que ótima ideia! Demi... - ele chamou. — Está tudo bem, para você e Nicholas? 
Não era uma ”ótima ideia”, e não estava ”tudo bem”. Demi virou-se mas continuou andando, numa tola compulsão de afastar-se de Joseph Jonas o máximo que pudesse.
—  Sim, está ótimo - respondeu em voz alta. Para Nicholas, acrescentou, baixinho: - Queria que dessemos um jeito de escapar disso. 
Ele enviou-lhe um rápido olhar. 
— Pois eu gostaria de saber que documentos são aqueles que Jonas quer que eles assinem.
— Joseph Jonas é suspeito de alguma coisa? 
— Todos são suspeitos, exceto você e eu. — E - ele brincou, não estou completamente seguro quanto a você. - Mais sério, juntou: — Fico imaginando que tipo de documentos exigiriam a assinatura de Marie Lovato. Se soubéssemos, talvez isso nos indicasse um rumo que nem sequer pensávamos em tomar.
Demi tinha a sensação de que ele não lhe falava toda a verdade, mas sabia que seria inútil questioná-lo. 
— Como foi que se encontrou com o pai de Jonas esta manhã? 
— Quando estava voltando da minha corrida vi um homem trabalhando no jardim e, quando ele se levantou, era evidente que estava sofrendo dores. Parei para ajudá-lo e fiquei conversando por alguns minutos. No início, pensei que fosse um jardineiro.
— Você não lhe contou nada, não é?
— Nada que possa nos prejudicar, e nada além do necessário. Na verdade, disse-lhe apenas o meu primeiro nome, mas não pude evitar de lhe contar onde estava hospedada. Será que criei algum tipo de problema? 
Nicholas pensou por um instante
— Não, absolutamente - respondeu, com um sorriso inexplicável. — O pai de Jonas não foi o único que ficou fascinado por você hoje. Creio que o filho também está impressionado. E um pouco intrigado, também.
— Comigo? É impossível!
— Reparei no jeito que ele a olhava. E você também reparou. Ficou toda nervosa. 
Demi riu diante do absurdo de tal conclusão. 
— Homens como Joseph Jonas geram uma energia sensual suficiente para iluminar a cidade de Nova York, e sabem disso. É uma forma de poder que possuem, e usam este poder em qualquer uma que esteja por perto. Eu estava por perto. Senti-me um pouco chocada, e por isso fiquei ”nervosa”. 
— É assim mesmo que funciona? Quantos ”homens como Joseph Jonas” você já conheceu?
— Tenho um conhecimento hereditário deste tipo de homens - Demi afirmou. — E, portanto, uma imunidade genética a eles.
— Sobre o que está falando?
— Sobre minha mãe. Baseada no que ela me contou, e no que vi com meus próprios olhos, meu pai deve ter sido igualzinho a Joseph Jonas. Você sabia que Selena está apaixonada por ele? Estão praticamente noivos. 
Estavam perto da escadaria que levava à varanda, e Nicholas baixou a voz.
— Selena não está apaixonada por ele. Seu pai é que está insistindo para que ela se case com Jonas. Mas ela não quer. Infelizmente - acrescentou, filosófico -, — Ela vai acabar submetendo-se e casando-se com ele. Os dois homens a dominam e intimidam por completo. 
— Como sabe de tudo isso? 
— A primeira parte ela confidenciou-me esta manhã, durante o desjejum. A segunda eu deduzi. 
— Ela lhe contou tudo isso? - Demi repetiu, surpresa. —  É difícil imaginá-la abrindo-se tanto com alguém. E por que com você?
— Porque não se sente dominada por mim. Por outro lado, sou homem e ela se intimida na presença dos homens, por isso quando lhe fiz uma pergunta de forma gentil e inocente, ela sentiu-se compelida a responder. 
— Isso é tão triste - Demi falou baixinho, quando pararam junto à entrada da casa. — Eu não esperava gostar dela. Não quero gostar dela.
Nicholas deu uma risadinha.
— Mas você gosta, e vai gostar ainda mais. E também vai tentar protegê-la dos dois homens, enquanto estiver aqui. 
Às vezes aquela atitude de ”sabe-tudo” de Nicholas dava-lhe nos nervos. 
—  Por que tem tanta certeza? - perguntou. — O que o faz pensar que farei qualquer coisa desse gênero?
A raiva dela não o perturbou nem um pouco.
— Porque você será incapaz de evitar - ele afirmou num tom implacável, mas não rude. — Porque você tem uma compulsão para socorrer as pessoas que necessitam de ajuda.
— Você não é psiquiatra. 
— É verdade - ele disse, sorrindo e adiantando-se para abrir-lhe a porta dos fundos. — Mas sei reconhecer um coração mole, e o seu é mais mole do que marshmallow tostado. 
— Isso me parece horrível.
— Na verdade foi um elogio - ele retrucou calmamente. — Sou louco por marshmallow tostado. Mas não deixe que este seu coração mole interfira com seu julgamento, ou com o trabalho que tem a fazer.
Gary Dishler interceptou-os na cozinha, por isso Demi viu-se privada da oportunidade de responder aquela última provocação. 
— Foi uma manhã muito divertida - ela mentiu. — Vou subir para tomar um banho e... 
— Desculpe, Srta. Lovato - Dishler interrompeu. — Mas a Sra. Lovato quer vê-la no solário. 
— Ah... - Demi olhou para o short sujo de grama e para os braços salpicados de terra. — Primeiro preciso tomar um banho e mudar de roupa. Pode dizer a ela que estarei lá o mais breve possível? 
— A Sra. Lovato disse que quer vê-la imediatamente - ele informou. 
A intimação soava terrível, e Nicholas também reparou nisso.
— Vou com você - ele disse. 
Gary balançou a cabeça e tornou a falar com firmeza: 
— A Sra. Lovato disse que quer vê-la sozinha
O solário dava para os fundos da casa, e quando Demi viu a expressão azeda no rosto de Marie Lovato logo concluiu que a senhora assistira à breve competição de autodefesa, e não aprovara.
— Que belo espetáculo vocês deram! - Fez uma pausa para enviar um olhar crítico aos cabelos despenteados de Demi e à sua roupa suja. — Jovens bem-educadas não ficam rolando na grama, nem andam por aí com as roupas manchadas de terra.
Demi empertigou-se diante da injustiça daquele ataque. 
— Eu não queria dar um espetáculo. Na verdade, fiz tudo o que podia para evitá-lo, mas seu neto insistiu nisso. Além do mais, eu teria mudado de roupa antes de vir para cá, mas o sr. Dishler insistiu que a senhora queria ver-me imediatamente. 
O rosto da senhora gelou diante da rebelião de Demi. 
— Já terminou? - Demi fez que sim. 
— Você tem um gênio e tanto.
— Tive uma manhã e tanto. 
— Foi o que vi. Nas últimas poucas horas, você correu pela praia, e tentou salvar Paul Jonas, pelo que Joseph contou. Depois voltou a tempo de jogar tênis, mas não muito bem, e completou a manhã atarefada derrubando seu pai ao solo, não uma, mas duas vezes. Se ainda tiver energia sobrando depois do almoço, sugiro que dedique algum tempo para praticar seu saque. 
— O quê? 
— Seu jogo de tênis precisa ser melhorado. 
— Sra. Lovato, eu não faço parte do seleto grupo de ricos ociosos. Trabalho para viver e meu tempo é precioso. Por isso, prefiro passar meus momentos de lazer fazendo o que gosto, e não gosto de jogar tênis! 
— Ganhei muitos troféus, na minha época. A família Lovato sempre se destacou no tênis. Integrantes da nossa família participam de campeonatos nos clubes de campo mais exclusivos do país. O seu jogo é uma desgraça para o nome da família, mas acredito que, com muita prática, você conseguirá atingir nossos padrões.
— Não tenho intenção nem desejo de fazer nada disso - Demi informou-a, sarcástica. — Não faço parte da família Lovato. 
— Que garota tola! Você não se parece conosco, mas no fundo é uma Lovato, muito mais do que Selena. De quem acha que herdou esta rebeldia orgulhosa que acabou de demonstrar? Por que acha que se recusou a permitir que Patrick a humilhasse, lá fora? Olhe para si mesma, neste exato momento: inflexível, segura de si, mesmo estando toda suja e desarrumada, confiante como uma rainha, julgando que tem todo o direito de enfrentar-me em minha própria casa apenas porque acha que está certa, e eu errada. Se isso não é a superioridade dos Lovatos, então não sei como você descreveria.
— Se a senhora pensa que me sinto lisonjeada com isso, devo lhe assegurar que não. 
— Hah! - Marie exclamou, dando uma palmada no braço da poltrona com um ar triunfante. — Falou como uma verdadeira Lovato! Você acredita que é melhor do que nós, embora sejamos ricos o bastante para comprar a cidade em que você mora. Como eu queria que a mãe de Patrick estivesse viva para ver isso. Quando ela veio para a Flórida a fim de levá-lo de volta para casa, pretendia ficar com a criança que mais se parecesse conosco. A despeito de toda sua astúcia, aquela mulher diabólica e tola escolheu a criança errada! 
— O que, sem dúvida, foi sorte minha. 
— Já basta de amenidades. Creio que nos entendemos muito bem, e a partir de agora poderemos chegar rapidamente a um entendimento mais profundo. Sente-se, por favor. Dividida entre a raiva e o divertimento pelo uso que Marie fizera da palavra ”amenidades” para descrever o que estiveram fazendo até então, Demi afundou na poltrona de vime ao lado dela. 
— Vou parar de ”pisar em ovos” e ir direto ao ponto - a senhora anunciou, provocando em Demi um novo fluxo de divertido temor. — Insisti para que você fosse convidada para vir aqui, e fiz isso por vários bons motivos... Por que parece tão surpresa?
— Tive a impressão de que o convite havia partido do meu pai. Ele disse que sofrera um ataque cardíaco e queria me conhecer enquanto houvesse tempo. 
Ela hesitou, brincando com o sempre presente colar de pérolas no pescoço. Depois, falou, relutante: 
— Pois teve a impressão errada. A princípio, ele rejeitou a ideia com mais firmeza do que Selena. 
— Selena rejeitou a ideia? 
— É claro que sim. E ficou extremamente aflita quando soube que você decidira aceitar o convite. 
Demi desviou os olhos, fixando-os no vaso de azaleias ao lado da sua poltrona enquanto tentava assimilar tudo aquilo sem sentir nenhuma emoção. 
— Entendo. 
— Creio que não. Quando Selena ainda era pequena, a mãe de Patrick fez de tudo para convencê-la de que a sua mãe era incapaz de cuidar de crianças, e que um juiz fizera uma lei especial para mantê-la bem afastada. Mais tarde, Selena foi levada a acreditar que você, naturalmente, acabaria sendo igualzinha à sua mãe. 
Marie fez uma pausa para que suas palavras penetrassem, depois continuou: 
— Quanto a Patrick , tinha diversos motivos para não querer trazê-la de volta à família tão tardiamente. Primeiro, por achar que seria injusto apresentá-la a um tipo de vida que você nunca pôde ter. Mas, acima de tudo, desconfio que ele sentia-se culpado por tê-la abandonado. Neste caso, é compreensível que não desejasse ficar frente a frente com alguém a quem prejudicara. Eu gostaria de ter feito esta pequena reunião de família há muito tempo, mas só pude concretizá-la depois que a mãe de Patrick, minha nora, fez o surpreendente favor de preceder-me na morte. 
— Por quê? 
— Porque ela teria rechaçado você daqui em dez minutos. Você jamais suportaria o tratamento que ela teria lhe dispensado, e eu não queria submetê-la a isso. Suponho que eu poderia ter ido vê-la, mas isto não faria com que os laços entre você, Selena e Patrick fossem restabelecidos. E o meu objetivo é este. 
Demi ficou atônita ao descobrir que o objetivo dela era restabelecer os laços da família, quando tudo o que fizera até agora fora humilhá-la, criticá-la e irritá-la. 
— Assim que a mãe de Patrick faleceu, percebi que poderia trazê-la até nós, e obriguei Patrick a ir em frente com o plano. Ele não teve outra escolha. 
— Não? 
— É claro que não - Marie anunciou com uma risada rouca. — Porque sou eu quem paga as contas, por aqui. 
Demi piscou os olhos e limpou a garganta. 
— A senhora faz o quê
— Eu controlo o Fundo de Investimento dos Hanover, que possui a maior parte da fortuna dos Lovatos - ela declarou, como se esta única informação esclarecesse tudo para Demi.
— Desculpe, mas não estou entendendo.
— É muito simples. Meu pai, James Hunsley, era um patife sem um tostão. Ele nasceu de uma família rica, mas perdeu toda sua herança no jogo quando tinha vinte e cinco anos. A fim de sustentar seu estilo de vida, tinha de casar com uma mulher rica e escolheu minha mãe, que era herdeira da fortuna dos Hanover. Meu avô logo percebeu o golpe e recusou-se a consentir no casamento, mas mamãe o amava e era uma jovem mimada e voluntariosa. Ameaçou fugir de casa, e meu avô acabou cedendo, mas não antes de acertar tudo de forma que meu pai jamais tivesse o controle total da fortuna de mamãe. Vovô Hanover estabeleceu um fundo de investimento que ela controlaria depois de sua morte, mas mamãe só poderia utilizá-lo com o parecer e consentimento dos curadores que ele havia nomeado. Sob os termos deste fundo, o controle permanece nas mãos do descendente mais velho dos Hanover, e nunca do seu cônjuge. No momento, eu sou esta descendente.
Demi achou melhor não fazer comentários sobre tal revelação. 
— O seu pai deve ter ficado desapontado, quando soube deste fundo.
— Ele ficou furioso, mas tão logo percebeu que sua vida não iria melhorar a não ser que ganhasse seu próprio dinheiro, tratou de pôr mãos à obra. Juntou uma fortuna modesta, nada parecida com a dos Hanover, mas é claro que metade dela pertencia à minha mãe e acabou sendo acrescentada ao fundo de investimento. Patrick herdou o tino para negócios da minha família e aumentou em muito a fortuna dos Lovato - ela afirmou com orgulho. — No entanto, não a chamei aqui para falarmos sobre Patrick. É sobre Selena que desejo conversar. Veja bem, apesar de tudo o que foi levada a acreditar sobre sua mãe e você, ontem à noite ela disse-me que achava que você parecia ser uma boa pessoa.
Até agora, tudo o que Marie lhe dissera havia sido tão negativo que Demi estava completamente despreparada para o elogio que se seguiu. 
— Para mim está claro que você possui muita coragem e uma boa índole, e eu gostaria que Selena tivesse um pouco mais destas qualidades. Quem sabe você possa ter isso em mente, 
Marie interrompeu-se ao ouvir o som dos passos de Selena, e esperou em silêncio até que a bisneta lhe desse um beijo na face.
— Seu jogo estava péssimo esta manhã - disse, ríspida. 
— Você estava jogando perto demais da rede. O que foi que lhe deu? 
— Acho que não estava num bom momento.
— Bobagem. Estava tentando não ferir os sentimentos de Demi, porque o jogo dela é deplorável. Mas já chega disso - interrompeu, quando Selena começou a responder. — Creio que você e Demi têm um jogo de golfe marcado ainda hoje? 
— Sim, marcamos uma partida para mais tarde.
— Ótimo, quero que vocês duas passem bastante tempo juntas. Quais são os planos para a noite?
— Joseph quer nos levar para jantar fora. 
— Excelente. - Marie assentiu, enfática. — Seu pai está decidido a fazer o casamento de vocês no Natal. Você também precisa passar mais tempo com Joseph. 
Demi não queria jogar golfe e sabia que Selena não queria casar com Joseph.  Patrick e Marie Lovato aparentemente não davam a mínima para os desejos daqueles que viviam sob seu controle. Porem, Demi nem tinha certeza do que queria, pois ainda estava se recuperando do choque causado por tudo o que Marie dissera, e ansiosa para relatar a Nicholas as partes mais pertinentes. Além disso, a única coisa que sabia ao certo era que queria conhecer Selena melhor.
— Preciso tomar um banho - disse. Enquanto se levantava, sorriu diretamente para Selena. — De minha parte, e também de Nicholas, gostaria de lhe agradecer por ter-nos poupado na quadra de tênis. Foi muita gentileza sua.
 — Bobagem! - Marie interrompeu. — Ela devia ter aproveitado o tempo para aperfeiçoar as jogadas e não deixar que enferrujassem!
Demi deu-se conta de que aquela mulher não iria respeitar ninguém que ela, ou seu neto, pudessem dominar, mesmo julgando ter todo o direito e privilégio de tal domínio.
— Selena está ciente de que Nicholas e eu somos seus convidados, portanto é natural que se preocupe em nos deixar à vontade. Acho que li numa coluna de etiqueta de um jornal que esta é a primeira e mais importante obrigação de um anfitrião. Não é? - Demi concluiu, tentando parecer inocente.
Marie Lovato não se deixou enganar. 
— Minha jovem, por acaso está pretendendo ensinar-me boas maneiras? 
Havia algo de indefinível em seu tom de voz; embora fosse indignado, não era zangado. Demi mordeu o lábio para ocultar um sorriso. 
— Sim, senhora, acho que estou. Só um pouquinho. 
— Que garota atrevida! - Marie resmungou, mas sem exibir uma irritação genuína. — Não suporto mais vê-la assim toda suja. Saia daqui e vá tomar seu banho. 
Dispensada, Demi virou-se para sair. 
— E não desperdice água - Marie avisou, rispidamente. Quando Demi se foi, Marie focalizou os olhos azuis em Selena. 
— Ela é uma jovem muito impertinente. Não tem respeito pela autoridade, e menos ainda pelo dinheiro. O que acha dela? 
Muito tempo atrás, quando era criança, Selena aprendera que era inútil e imprudente que qualquer pessoa, incluindo ela própria, se opusesse a um membro da família. Eles eram indômitos e imperdoáveis, enquanto que ela covarde e fraca. Ainda assim, naquela última hora, havia testemunhado sua irmã mais nova impondo-se por si mesma e por ela. Em vista disso, parecia imperativo que fizesse o mesmo. O nervosismo deixava as palmas de suas mãos úmidas, e ela esfregou-as no short. 
— Eu... me desculpe, bisavó - disse, com a voz trémula pelo pouco costume de tomar uma posição contrária. — Mas e-e-ela... 
— Pare de gaguejar, menina! Você já superou este problema de fala há anos. 
Nervosa, mas ainda determinada, Selena ergueu a cabeça, encarou a bisavó firmemente, como Demi fizera, e anunciou: 
—  Acho que ela é sensacional! 
— Bem, então por que não disse logo? 
Incapaz de responder, ou ver-se obrigada a ouvir um sermão, Selena olhou no relógio.
— Preciso correr para tomar um banho, senão vamos perder a hora da nossa partida de golfe no clube. 
— Dê uma olhada nas roupas que ela trouxe - Marie instruiu. — Certifique-se de que não há perigo de Demi envergonhar a si mesma, ou a nós, enquanto estiver aqui. Ela vai conhecer nossos amigos no clube e na cidade. Se estiver precisando de roupas, providencie.
Selena virou-se para a bisavó, com um ar consternado. 
— Não posso bisbilhotar no armário dela e dizer que as roupas não são adequadas. 
— É claro que pode. Você tem um excelente senso de estilo. Você desenha roupas. 
— Sim, mas... 
— Selena! Cuide deste assunto. E, Selena... - ela chamou, quando a bisneta começava a se afastar. — Não há necessidade de jogar dinheiro fora nestas lojas de roupas caras, a não ser que você não tenha nada que possa emprestar a ela. 

Hoje teve encontro de novo da Demi e do Joe, segredos da família lovato e aí gostaram? Comentem, bjs lindonas!!!