Sempre que Demi imaginava aquele momento, visualizava seu pai abrindo a porta e recebendo-a em pessoa, por isso preparou-se para parecer cordial mas indiferente. Seu esforço foi bem-sucedido, porem totalmente desperdiçado com o mordomo alto e de cabelos muito loiros que, na verdade, foi quem abriu a porta, e que conseguiu parecer quase tão cordial e ainda mais indiferente do que ela.
— Boa tarde, Srta. Lovato. Boa tarde, Sr. Parker. - ele entoou com uma voz profunda, que continha um leve traço de sotaque nórdico. — A família os aguarda. Sigam-me, por favor.
Guiou-os através de um amplo corredor revestido de lajotas, com arcos de ambos os lados que se abriam para numerosos cômodos espaçosos, todos mobiliados com antiguidades europeias. No final do corredor uma porta abriu-se de repente, e Demi teve o primeiro vislumbre de seu pai quando ele adiantou-se para cumprimentá-la. Desde que ele havia sofrido um ataque cardíaco, e desde que estivera tão ansioso por uma oportunidade de reparar seus erros, era natural que Demi esperasse vê-lo abatido e cheio de remorsos, mas o homem que andava a passos largos na direção dela era ágil, bronzeado e muito atraente.
— Demi! - ele exclamou, parando à sua frente e estendendo-lhe a mão.
Num gesto automático Demi também estendeu a sua, presumindo que receberia um breve cumprimento, mas ele cobriu-a com as duas mãos e a manteve presa.
— Meu Deus, você é tão parecida com sua mãe que é quase espantoso - ele disse, com um sorriso acolhedor. Depois, acrescentou com simples sinceridade: — Obrigado por ter vindo.
O corpo inteiro de Demi tremia de tensão nervosa mas, de alguma forma, sua voz soou firme e normal:
— Este é meu amigo Nicholas Parker.
Os dois homens trocaram um aperto de mão, e o olhar de Patrick retornou para ela.
— Por algum motivo - ele admitiu, pesaroso -, presumi que você estivesse se referindo a uma moça, quando disse que traria uma ”pessoa amiga”. Nordstrom mandou preparar dois quartos de hóspedes, mas...
— Assim está ótimo - ela interrompeu rapidamente.
O sorriso dele alargou-se ainda mais, e Demi teve a impressão de que o pai estava satisfeito por ela não ser tão descarada a ponto de querer dividir o mesmo quarto com um ”amigo”, em sua casa.
Não estava bem certa de como ele conseguira lhe comunicar tal sensação, e teve de lembrar a si mesma que não ligava a mínima para o que ele pensava.
— Nordstrom vai cuidar da bagagem - ele informou.
— Agora, acompanhem-me. Sua irmã e sua bisavó estão no solário.
Quando começaram a se adiantar, um homem magro, de cerca de trinta e cinco anos, cabelos ralos e óculos de aros finos saiu de um comodo perto da escadaria principal, carregando um maço de papéis que estava lendo. Patrick o fez parar e apresentou-o a Demi e Nicholas como Gary Dishler.
— Gary é o meu assistente - Patrick explicou. — Enquanto estiverem aqui, sempre que precisarem de alguma coisa basta falar com Gary, se eu não me encontrar em casa.
Com um sorriso agradável e modos tão informais quanto a camisa esporte que estava usando, Gary cumprimentou a ambos com um aperto de mão.
— Por favor, não hesitem em me chamar, por qualquer motivo - disse. — Sou um tipo de ”faz tudo” por aqui.
O solário era um salão octogonal todo envidraçado que ficava nos fundos da casa, repleto de árvores de tamanho natural, plantas tropicais e uma pequena ponte chinesa que cruzava um riacho em miniatura. Poltronas de vime com fofas almofadas estavam agrupadas ao lado de vasos de plantas exóticas, e sob treliças cobertas de trepadeiras floridas. Perto da pontezinha, cercadas por árvores altas e orquídeas brancas, duas mulheres observavam o trio que se aproximava, e Demi preparou-se para um encontro que prometia ser tão excêntrico quanto o cenário onde se desenrolava.
As fotos de Selena que vira nos jornais não lhe faziam justiça, Demi percebeu conforme adiantava-se na direção da glamourosa irmã. Com a pele de marfim, grandes olhos castanhos e os cabelos escuros e brilhantes que lhe caíam até os ombros, Selena era a epítome da elegância refinada, usando um vestido de linho verde de saia justa, mangas largas e punhos enfeitados com brilhantes botões dourados. Imóvel e silenciosa, tinha as mãos tranquilamente cruzadas no colo, pousadas sobre o que parecia ser um caderno de desenhos, e olhou para Demi sem revelar qualquer emoção.
Irritada com seu próprio ataque de nervosismo, Demi concentrou-se em colocar um pé na frente do outro. Desde que era incapaz de mostrar-se tão blasé quanto a irmã, focalizou a atenção na senhora idosa e magra sentada ao lado dela. Nicholas descrevera Marie Lovato como uma ”megera”, mas Demi achou que ela parecia mais com uma águia muito velha e frágil. Usando um rígido vestido preto e uma larga gargantilha de pérolas no pescoço, a velha senhora tinha um rosto estreito e nobre, a pele tão clara quanto as pérolas, sobrancelhas brancas e cabelos brancos puxados num coque severo. Os olhos azuis davam o único toque de cor a todo seu semblante, mas eram também tão cortantes e intensos quanto dois feixes de raios laser quando examinaram cada um dos traços do rosto de Demi. Também não havia nada de frágil em sua voz, quando interrompeu Patrick logo no início de sua tentativa de apresentação.
— Nossas identidades devem ser óbvias para ela, Patrick - ela disparou. Transferiu o olhar para Demi, como se a desafiasse a contradizê-la. Depois, acrescentou bruscamente: — Eu sou sua bisavó, esta é a sua irmã, e você é Demi.
Desde que a atitude dela beirava a grosseria, Demi limitou-se a assentir em resposta, o que fez com que a velha senhora parecesse um tanto desconcertada. Assim, ela decidiu voltar sua atenção, e seu ataque, para Nicholas:
— E você, quem é? - inquiriu.
Desta vez, a boa educação exigia que Demi se pronunciasse:
— Este é meu amigo Nicholas Parker - ela disse, com toda tranquilidade. Depois olhou para o pai, que parecia completamente despreocupado com a atitude bizarra da senhora. — Creio que deixei bem claro que traria uma pessoa comigo - acrescentou, dirigindo-se à senhora de cabelos brancos.
— Sim, mas é claro que imaginamos que esta pessoa seria do sexo feminino - Marie Lovato informou-a. — Espero que não estejam pensando em dividir o mesmo quarto, enquanto estiverem aqui.
Demi teve um rápido e súbito impulso de rir, ou de ir embora, mas desde que nenhuma destas reações adequava-se à personalidade que Nicholas queria que ela assumisse, tentou fingir que nem percebia a atitude provocadora da mulher.
— Não, senhora, não estamos pensando nisso.
— Não me chame de ”senhora” - ela disparou. — Pode dirigir-se a mim como bisavó - decretou, após um momento.
Soava como uma rainha concedendo relutantemente um favor não merecido a um súdito inferior, e no mesmo instante Demi decidiu que nunca, nunca, se dirigiria a ela daquela forma.
Sem perceber a revolta mental de Demi, Marie voltou seu olhar aguçado para Nicholas.
— Quantos anos você tem?
— Trinta e três.
— Neste caso, tem idade bastante para entender que, na minha casa, certas regras de conduta devem ser seguidas, não importa se haja ou não alguém observando. Entende o que quero dizer?
— Creio que sim. - ele acrescentou, quando ela fez uma careta zangada.
— Pode dirigir-se a mim como Sra. Lovato.
— Obrigado, Sra. Lovato - ele respondeu muito educado, conseguindo soar mais como um estudante que acabara de ser punido do que como um agente do FBI capaz de provocar um desastre em toda aquela família.
O pai de Demi finalmente intercedeu.
— Selena - encorajou à filha -, — Sei o quanto você estava ansiosa por este momento...
Selena pegou a deixa e levantou-se com um movimento gracioso e fluido, os olhos fixos em Demi com gentileza.
— Sim, é verdade - disse, numa voz lindamente modulada, mas cautelosa. Estendeu a mão cujas unhas eram manicuradas com perfeição. — Como vai? - perguntou.
Como vou aonde? Demi pensou, irreverente (ou um tanto desesperada). A frase do romance Stepford Sister perpassou-lhe pela mente, rápida como um raio.
— Também estava ansiosa por conhecê-la - respondeu, apertando a mão daquela sofisticada estranha que era sua irmã.
Marie Lovato já estava farta de tais amenidades sociais.
— Tenho certeza de que Demi e o sr. Parker gostariam de se refrescar um pouco e descansar antes do jantar - disse.
— Selena irá lhes mostrar os seus aposentos - informou a Demi. — Nós nos reunimos para o jantar às sete horas. Não se atrase. E não use calças compridas.
Demi havia esperado, e temido, uma longa e constrangedora conversa com o pai e a irmã assim que chegasse, por isso ficou surpresa, e um tanto aliviada, ao saber que por duas horas seria poupada da presença da velha megera. No entanto, seus instintos lhe diziam que se Marie Lovato desconfiasse de que ela precisava daquela folga, provavelmente teria insistido na conversa.
— Selena vai se certificar de que vocês fiquem confortavelmente instalados - Patrick Lovato intercedeu com um sorriso caloroso e conciliatório. — Tornaremos a nos ver na hora do jantar.
Demi seguiu Selena, e Nicholas foi andando a seu lado, a mão tocando-lhe o braço de um jeito delicado e familiar, como convinha ao seu papel de amigo. Ela estava tão confusa e espantada com aquelas pessoas peculiares que mal reparou nos cômodos pelos quais iam passando, quando atravessaram o vestíbulo e subiram pela longa escadaria em curva, com o aparador de ferro trabalhado e corrimão de bronze reluzente. Até agora, o mais ”humano” dos três fora Patrick Lovato, justamente quem ela esperava ser o mais detestável.
No topo da escada, Selena virou para a esquerda e continuou andando, até que chegaram quase ao final do corredor.
— Este é o seu quarto, Sr. Parker - cantarolou enquanto abria a porta para um cômodo espaçoso, decorado em tons de verde-jade com pesados móveis italianos. As valises dele estavam abertas sobre a cama. — Se precisar de qualquer coisa, basta apertar a tecla do intercomunicador no telefone - disse, encerrando o discurso impecavelmente educado com um sorriso igualmente cortês, antes de voltar para o corredor.
Nicholas dissera que as pessoas consideravam-na fria e distante. Mas Selena era pior do que isso - era completamente sem vida, Demi concluiu, sentindo uma pontada de desapontamento tão aguda que até se surpreendeu. Selena movia-se como se o simples ato de caminhar fosse, na verdade, um balé orquestrado com perfeição: os pés equilibrados nos saltos altos das sandálias, pouco movimento dos quadris, nenhum balanço nos braços, ombros para trás, cabeça erguida.
— Nos vemos na hora do jantar, Demi - Nicholas chamou-a, baixinho.
Sobressaltada por haver esquecido, por um instante, de atuar em seu papel naquela farsa, Demi virou-se e disse a primeira coisa que lhe surgiu na mente:
— Tenha um bom cochilo.
— Você também.
No final do corredor, Selena parou na frente de outra porta, abriu-a e fez um discurso idêntico ao que fizera a Nicholas, inclusive com as mesmas inflexões de voz e com idêntico sorriso superficial. Porem, desta vez, demorou-se um pouco mais na soleira da porta, como se esperasse por alguma coisa. Provavelmente esperava por algum tipo de reação diante das acomodações, Demi presumiu enquanto olhava em volta da suíte espetacular, toda decorada em tons de rosa pálido, com cortinas de seda creme e delicados móveis de estilo francês reluzindo com os ornamentos dourados. Sob seus pés, o tapete oriental era tão espesso que era como se estivesse andando na areia.
— É... adorável - disse devagar, virando-se para encarar a irmã parada na porta.
Selena fez um gesto gracioso na direção das portas francesas.
— O balcão dá de frente para o mar, e a vista é ainda mais bonita ao nascer do sol.
— Obrigada - Demi falou, sentindo-se cada vez mais desconfortável.
— Nordstrom já trouxe sua bagagem - Selena observou, indicando a cama de dossel no outro lado do quarto com uma inclinação de cabeça que foi quase majestosa. — Devo mandar alguém para ajudá-la a desfazer as malas?
— Não, obrigada.
Demi esperou que ela saísse, queria que ela saísse, mas Selena continuou hesitando na porta, com a mão pousada na maçaneta. Um tanto atrasada, Demi deu-se conta de que as regras de etiqueta social que pareciam governar os pensamentos, palavras e atos de sua irmã talvez exigissem que, agora, ela iniciasse algum tipo de conversa. Assim, disse a única coisa em que pôde pensar:
— Você é artista plástica?
Selena encarou-a como se ela estivesse falando num idioma estrangeiro.
— Não, por que pergunta?
Demi mostrou o grande bloco que Selena tinha nas mãos.
— Pensei que isto fosse um bloco de desenhos.
— Ah, até me esqueci que o estava carregando. Sim, é um bloco de desenhos. Mas não sou artista.
Frustrada com a resposta conclusiva, Demi olhou para a esguia morena que se postava na soleira da porta como se fosse uma modelo da Vogue e, de repente, imaginou se na verdade Selena não seria tímida, em vez de distante. De qualquer forma, puxar conversa com ela parecia ser tão difícil quanto tentar coçar as próprias costas, mas Demi tentou novamente:
— Se não é artista, para que usa este bloco de desenho?
Selena hesitou. Então, entrou no quarto e ofereceu o bloco a Demi, como uma rainha estendendo seu cetro.
— Estou desenhando minha própria linha de vestuário feminino.
Roupas! Demi pensou gemendo por dentro. Sara adorava falar sobre roupas; Dianna adorava falar sobre roupas; ela, no entanto, não tinha nem sequer uma célula interessada em moda, em todo seu ser. Aceitou o bloco e seguiu Selena até a cama, onde se sentou e abriu a capa dura.
Mesmo para os olhos ”leigos” de Demi, ficou imediatamente óbvio que Selena não desenhava roupas para mulheres comuns. Estava criando trajes de alta moda e alto estilo, vestidos formais que Demi sabia, por instinto, deveriam custar tanto quanto um bom carro usado. Tentando desesperadamente pensar em alguma coisa articulada e adequada para dizer, foi virando as páginas em silêncio até chegar num vestido de musselina e, de repente, lembrou-se como Sara descrevera o seu próprio vestido vermelho.
— Ah! Gosto muito deste aqui - exclamou, um tanto entusiasmada demais, pensou. — É ”ousado” mas não ''atrevido”.
Selena espiou no bloco para ver o que a agradara tanto, e não ocultou um leve desapontamento.
— Acho este um pouco comum. Demi não fazia ideia se o comentário pretendia soar como um insulto proposital ao seu gosto por roupas, mas fechou o bloco e optou por ser simplesmente sincera:
— Na verdade, não entendo muito disso - explicou. — Minha mãe e minha amiga Sara adoram roupas, mas eu estou sempre ocupada demais para comprá-las. Quando vou fazer compras, nunca consigo decidir se algo vai mesmo ficar ”bem” em mim, por isso acabo comprando sempre o mesmo estilo de roupas. Depois, uso as peças até que fiquem quase puídas, só para não ter de sair e fazer compras novamente. Sara diz que a única maneira de saber que comprei uma roupa nova é quando a cor é diferente.
Demi percebeu que dissera algo que captara o interesse de Selena, mas só se deu conta do que foi quando parou de falar e Selena perguntou:
— Ela adora roupas? A sua mãe, quero dizer. Sua mãe. Nossa mãe.
A estranha ironia daquela situação atingiu Demi com uma força súbita, mas qualquer empáfia que pudesse sentir por Selena foi apagada pelo fato de que Selena podia dar-se ao luxo de ter todas as roupas que ”adorava”, enquanto a mãe ”delas” tinha de trabalhar numa loja e vender as roupas que adorava para outras mulheres.
— Sim - afirmou. — Ela adora.
Levantou-se e fez a volta pela cama, como se de repente decidisse desfazer as malas. Pressentindo que estava sendo dispensada, Selena também se levantou.
— Encontro você lá embaixo, às sete - disse, num tom igualmente firme.
Sentindo-se absurdamente culpada por cortar a conversa de maneira tão abrupta, Demi abaixou-se e abriu o zíper da grande mala dobrável de Sara, enquanto via Selena sair do quarto e fechar a porta. Preocupada com os próprios pensamentos, abriu a mala, retirou um vestido preto de coquetel preso num cabide, e virou-se à procura de um armário, quando finalmente percebeu que algo estava errado...
Não havia emprestado a mala grande e dobrável de Sara, porque não precisaria dela.
E nunca pusera os olhos naquele vestido preto, com uma saia de chiffon curta e rodada, que estava segurando pelo cabide.
Girou de volta para a cama e arregalou os olhos para a mala aberta. Uma saia longa, de seda azul, pendia de outro cabide. Demi também não a reconheceu, e nem tampouco a blusa combinando que estava logo abaixo, ou o vestido vermelho de verão...
— Ah, mamãe, não - Murmurou furiosa enquanto afundava na cama, ao lado da mala.
Sem precisar olhar, já sabia que todo o restante do conteúdo da mala era novo, e sabia exatamente como a mãe conseguira pagar por tudo aquilo. Havia um envelope branco enfiado entre as tiras de um par de sandálias novinho em folha, e ela pegou-o enquanto decidia devolver cada uma das peças assim que voltasse para casa. Contanto que não usasse nada daquilo, as lojas certamente devolveriam o dinheiro de sua mãe. Demi estava convencida disto, até que leu o bilhete.
— Querida, - Dianna escrevera, com sua letra tão bonita e arredondada — Sei que vai ficar zangada quando encontrar todas estas roupas, mas não usei meu cartão de crédito, portanto não precisa se preocupar com aqueles juros terríveis que parecem crescer a cada mês, não importa quantos pagamentos a gente faça. Em vez disso, usei o dinheiro que estava guardando para o cruzeiro de navio.
Demi gemeu, mas tornou a dizer a si mesma que as roupas poderiam ser devolvidas.
Você queria que eu fizesse a viagem dos meus sonhos, nas minhas férias, mas neste exato momento você está tornando real o maior sonho que tive em minha vida. Depois de todos estes anos, seu pai finalmente irá conhecê-la, e quero que você se mostre tão linda por fora quanto é por dentro.
Este é o único sonho que me restou, querida. Todos os outros você já transformou em realidade, apenas sendo você mesma.
Agora, divirta-se em Palm Beach! Tenha apenas bons pensamentos, fique despreocupada e use as lindas roupas que lhe comprei.
Amo você.
Mamãe.
PS: Apenas para o caso de você ficar tentada a usar somente algumas das roupas novas, acho bom reparar que tirei todas as etiquetas, portanto nada pode ser devolvido. Divirta-se!
Rindo por entre as lágrimas, Demi ficou olhando para as letras embaçadas da carta. Depois, olhou novamente para as roupas na mala. Não poderia ficar ”despreocupada” em Palm Beach, nem ”ter apenas bons pensamentos”, mas, enquanto estivesse ali espionando seu pai, definitivamente iria usar as ”lindas roupas”. Com sua típica generosidade, e com um rasgo de astúcia bem pouco característico, sua mãe não lhe deixara escolha quanto a isso.
Enxugou as lágrimas dos olhos e, com todo cuidado, foi tirando da mala todas as lindas peças, antes de dar-se conta de que havia mais uma mala de Sara no chão, que ela não tinha arrumado. Colocou-a sobre a cama, abriu as travas e levantou a tampa.
A primeira coisa que viu foi o vestido de musselina vermelha de Sara. A segunda foi um outro envelope branco. Dentro do envelope havia uma cartinha de Sara.
Você está sempre cuidando de todo mundo, mas Mamãe e eu queríamos cuidar de você, desta vez. Por isso, não fique zangada quando perceber que as minhas roupas estão nesta mala. E também não fique zangada quando perceber que as suas roupas não estão em nenhuma mala.
Com amor, Sara.
PS: Tiramos fotos de todos os trajes e as guardamos no seu estojo de maquiagem. Desta forma, você não precisará ficar pensando nos acessórios que terá de usar com cada traje.
Furiosa, Demi manteve os olhos fixos na carta. Não podia acreditar que as duas haviam feito uma coisa dessas com ela, sem trair nem mesmo um leve sinal de todo o plano!
A fúria logo foi substituída por um sorriso impotente e, depois, por uma gargalhada.
Assim que acabou de desfazer as malas, abriu as portas duplas e saiu para o balcão. Seu quarto estava localizado no lado norte da casa, com vista para um extenso gramado que terminava numa faixa de praia, a cerca de 600 metros da casa. Uma cerca viva, alta e bem aparada, marcava os limites dos dois lados da propriedade e estendiam-se quase até a praia, disfarçando o cercado de arame. Demi não conseguiu vê-lo.
Agrupamentos de palmeiras, murtas e hibiscos gigantes espalhavam-se pelo terreno, com as quadras de tênis situadas na extremidade à esquerda, próximas a uma piscina olímpica e uma cabana. No meio do gramado, uma bandeirinha esvoaçava num mastro curto, indicando o centro do campo de golfe cuja grama aparada e espessa parecia ter sido cortada com uma tesourinha de unhas.
Achando graça nas incríveis extravagâncias a que os super-ricos se entregavam, Demi apoiou-se no parapeito do balcão e olhou para a direita, por toda a extensão da casa, imaginando se o quarto de Nicholas também teria uma varanda, e se ele estaria para fora. Podia avistar vários parapeitos de ferro como aquele onde se apoiava, mas os balcões ficavam todos numa reentrância da estrutura da casa, portanto era impossível ver se havia mais alguém no lado de fora.
Desapontada por não ter podido trocar nem mesmo um aceno com seu companheiro de conspiração, virou-se de costas para a paisagem. Além de duas espreguiçadeiras com grossas almofadas, sua varanda também possuía uma mesinha de ferro redonda e um par de cadeiras, mas o ar estava tão úmido e abafado que ela perdeu a vontade de ficar lá fora.
Desejando que houvesse alguma maneira de descobrir se a primeira impressão do agente do FBI sobre a família fora parecida com a sua, Demi voltou para dentro e caminhou até a cama. A casa era do tamanho de um hotel, e o telefone instalado na mesa-de-cabeceira possuía seis linhas e doze outras teclas que não estavam demarcadas. Mesmo se descobrisse como ligar para o quarto dele, percebeu que não poderiam conversar à vontade, pois correriam o risco de alguém pegar uma extensão e ouvi-los.
Demi considerou a ideia de ir até o quarto dele, mas não queria arriscar-se a ser apanhada em flagrante por algum criado assustador que tivesse sido designado a relatar quaisquer infrações das regras à velha dominadora que realmente pensava que merecia ser chamada de bisavó por Demi.
Relutante, adiou para mais tarde a ideia de conferenciar com seu co-conspirador, quando tivesse uma oportunidade e um local mais apropriados.
Agitada demais para dormir, decidiu ler o romance policial que começara antes que Nicholas Parker aparecesse em Bell Harbor e desintegrasse toda a sua vida. Dobrou a colcha da cama, recostou alguns travesseiros na cabeceira e esticou as pernas. Lembrando-se do ríspido aviso de Marie Lovato para que não se atrasasse para o jantar, estendeu o braço e acertou o rádio-relógio para as seis da tarde, caso pegasse no sono. No telefone, uma luzinha piscava agora, indicando que uma das seis linhas estava ocupada, e ela imaginou se o telefone seria simplesmente isso, ou se fazia parte de um sistema que operava a casa inteira.
Em Bell Harbor, quando os prósperos novos residentes construíam uma nova mansão, ou reformavam uma antiga, quase sempre instalavam modernos sistemas telefônicos de linhas múltiplas. Os telefones que vinham com alguns destes sistemas não apenas forneciam o serviço de comunicação interna para todos os cômodos, mas também capacitavam o proprietário da casa a controlar tudo, desde a iluminação e sistemas de segurança até os sistemas de calefação e ar-condicionado tudo com o telefone.
Contanto que o dono da casa lembrasse que códigos devia usar, os telefones cumpriam bem a função, mas quando o proprietário cometia um erro, as consequências podiam ser caóticas, e as histórias resultantes de tais incidentes, que circulavam entre os bombeiros e os policiais de Bell Harbor, eram frequentemente hilariantes.
Com um sorriso de divertida nostalgia, Demi lembrou-se do ocorrido no mês anterior, quando Karen Althorp sem querer discou o número cinco, para o alarme de incêndio, quando pretendia discar o número seis, que acionava a piscina de hidromassagem. Quando os bombeiros irromperam por uma janela e investiram pela casa até o quintal, encontraram a curvilínea divorciada saracoteando nua na piscina aquecida, em companhia do jardineiro. Nua, porem indignada, ela ameaçou processar os infelizes bombeiros por danos à sua propriedade, e expulsou-os para fora da casa.
Uma semana depois, em vez de discar um seis, discou um nove, que enviou um alarme silencioso à polícia. Jess Smith foi o primeiro a chegar na casa às escuras e encontrou Karen Althorp deitada junto à piscina, admirando as estrelas, completamente nua.
Ela ficou tão assustada quando Jess anunciou sua presença que começou a gritar, mas logo convidou o atraente policial a tirar suas roupas e reunir-se a ela.
O dr. Pembroke e a esposa também instalaram um sistema semelhante na nova casa, que acabou sendo o responsável pelo divórcio do casal. Mais tarde, o dr. Pembroke tentou processar os fabricantes, exigindo sete milhões de dólares - a quantia que teve de entregar à sra. Pembroke no acordo do divórcio.
Afastando tais lembranças, Demi abriu o seu livro. O alarme súbito e insistente fez com que Demi desse um pulo na cama. Determinada a terminar o capítulo, estendeu a mão às cegas e desligou o despertador. Poucos minutos depois, relutante, deixou o livro aberto na mesinha-de-cabeceira e levantou-se.
Esse capítulo ficou bem grande então irei dividi-ló em duas partes, o que acharam do capítulo? Bjs lindonas!!!
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