30/04/2016

sussurros na noite: capítulo 13 (Parte 1)


Demi não tinha ideia do quanto o FBI sabia a respeito de Patrick Lovato e suas finanças, ou sobre o que suspeitavam que ele estivesse fazendo, mas achou que seria importante contar a Nicholas tudo o que ficara sabendo. Frustrada pelo fato de que aquela troca de informações era uma via de mão única, bateu na porta do quarto dele. Quando não houve resposta, seguiu pelo corredor até seu próprio quarto e descobriu que a porta estava trancada. Girou a maçaneta, perguntando: 
— Olá? Há alguém aí?
A porta abriu tão de repente que ela deu um passo para trás e arregalou os olhos para Nicholas, que estava de short e camiseta e segurava o livro dela na mão, com um dos dedos entre as páginas como se estivesse marcando o lugar onde havia parado. 
— O meu quarto não tem varanda, por isso achei que podia usar a sua para ler um pouco até você voltar - ele explicou. 
Demi sabia que ele estava mentindo, para o caso de haver alguém entreouvindo no corredor. Seguiu-o para dentro e fechou a porta. 
— O que está realmente fazendo
— Verificando se há algum ”grampo”. Não encontrei nada. A ideia de que uma residência particular pudesse ter sido ”grampeada” pelo seu proprietário era absurda, e foi o que Demi falou. 
— É apenas uma precaução. Seu pai tem a fama de ser um homem extremamente cauteloso. — Nem tanto, do contrário nós não estaríamos aqui - ela brincou. — E, por falar no porquê de estarmos aqui – acrescentou com um sorriso satisfeito -, — Acabei de ter uma conversa esclarecedora com minha bisavó. Você sabia que ela controla a maior parte do dinheiro da família? 
— Está se referindo ao Fundo de Investimento dos Hanover?  
Um tanto desapontada, Demi fez que sim. 
— O que ela lhe contou? Demi repetiu todos os trechos pertinentes da conversa com a bisavó, quase literalmente. 
— Nenhuma novidade - ele disse. — Nada de significativo, pelo menos. Vocês ficaram juntas por bastante tempo, sobre o que mais conversaram? 
Demi relatou o restante da conversa, e ele pareceu bem mais satisfeito com isso do que com a informação que ela julgara ser tão importante.
— Se Marie quer que você passe seu tempo com Selena, obedeça. Eu vou ficar por aqui, quem sabe consigo descobrir alguma coisa. 
— Sobre o quê? - Demi inquiriu, atirando as mãos para o alto num gesto de frustração. — O que suspeita que ele esteja fazendo? Creio que tenho direito a um mínimo de explicação. 
— Quando achar que você precisa saber de alguma coisa, eu lhe conto.
Tentando imitar o tom indiferente dele, ela retrucou: 
—  Então, quando eu descobrir alguma coisa que você precisa saber, creio que teremos de negociar. 
Demi esperava que ele reagisse com alguma brincadeira, ou que ficasse zangado. Mas a reação dele foi bem diferente. 
— Existem dois homens em Palm Beach com quem você nunca vai querer negociar, Demi. Eu sou um deles. 
— E quem é o outro? - ela perguntou, apanhada de surpresa pela ameaça velada que percebia na voz dele. 
— Joseph Jonas. Obrigado por me deixar usar a sua varanda - ele disse, para todos os efeitos, quando saiu para o corredor. 
Fechando a porta, Demi foi devagar para o banheiro a fim de tomar uma ducha.
Nicholas era completamente imprevisível, incompreensível e determinado, mas havia vezes em que também se mostrava encantador e até gentil. 
Agora, Demi tinha a desconfortável sensação de que tais qualidades pudessem ser apenas uma fachada. 



Palm Beach,
Flórida, 14:00 A.M


Selena estava esperando no vestíbulo, quando Demi desceu as escadas. 

— O carro está aqui na frente - ela avisou, e Demi seguiu-a para fora.
Um Jaguar conversível num tom de dourado pálido estava parado na entrada de veículos, e quando passaram pelos portões principais, Demi observou o sol reluzindo nos cabelos castanhos escuros de Selena. Estava pensando em como sua elegante irmã combinava perfeitamente com aquele carro elegante, quando Selena virou o rosto e percebeu que Demi a olhava. 
— Esqueceu alguma coisa? - Selena perguntou. 
— Não, por quê? 
— Está com uma expressão estranha. 
Depois de tudo o que vira e escutara sobre Selena naquele dia, Demi desejava desesperadamente derrubar a barreira de formalidade que as separava, e conhecer melhor a sua irmã. Aproveitou a chance que tal pergunta lhe oferecia. 
— Eu estava pensando que este carro é muito bonito e que combina com você. 
Selena quase perdeu o controle do volante, quando se virou novamente para olhá-la. 
— Não sei o que dizer.
— Pode dizer qualquer coisa que lhe vier à mente. 
— Bem, então, acho que eu estava pensando que esta era a última coisa que esperava que você dissesse.
Demi começava a duvidar que a conversa evoluiria para além disso, quando Selena acrescentou, num só fôlego:
— E também pensei que foi algo muito gentil, isso que você disse. - Ela infundiu a palavra com tanto calor que Demi soube que se tratava de um grande elogio.
Quando viraram à esquerda, entrando numa avenida larga, Selena prosseguiu, hesitante: 
— Não lhe parece estranho estarmos aqui neste carro sabendo que somos... irmãs? 
Demi assentiu. 
— Eu estava pensando a mesma coisa. 
— Você não é nem um pouco como eu imaginava. 
— Eu sei. 
— Sabe? 
— Sim. Sua bisavó contou-me o que você disse a ela. 
Selena enviou-lhe um olhar rápido e tímido. 
— Ela é sua bisavó, também. 
Algum diabinho maldoso fez com que Demi retrucasse: 
— Por algum motivo, acho mais fácil aceitar que você seja minha irmã, do que ela seja minha bisavó. 
— Ela é um pouco difícil de se conhecer. Costuma intimidar as pessoas. 
Incluindo você, Demi pensou. 
— Ela a intimida? - Selena perguntou. 
— Não muito. Bem, um pouquinho, talvez - Demi admitiu. 
— A maioria das pessoas fica aterrorizada na presença dela. 
— Ela não é exatamente uma bisavó típica, pelo menos não do jeito que imagino. 
— Como é a sua avó?
— Quer dizer, a mãe da nossa mãe? - Demi perguntou, com gentileza. 
— Sim.
— Ela faleceu quando eu tinha sete anos, mas lembro-me que era muito... aconchegante. E estava sempre cheirando a biscoitos.
— Biscoitos?  Demi fez que sim.
— Ela adorava cozinhar, fazer doces, bolos. Era um pouco gordinha, talvez seja por isso que penso nela como ”aconchegante”. Sempre tinha biscoitos prontos para Sara e para mim. 
— Sara? 
— É uma amiga de infância, que até hoje é a minha melhor amiga. 
Um silêncio incomodo se seguiu, aquele tipo de silêncio entre duas pessoas que desejam avançar, mas que se sentem tão aliviadas por atingir o ponto em que estão que receiam dar os passos seguintes. Demi respirou fundo e rezou para que estivesse dizendo a coisa certa. 
— Você gostaria de saber como é a nossa mãe? 
— Se quiser me dizer. Você é quem sabe. - Levantando o rosto para o vento, Demi olhou para o lado e refletiu sobre a resposta evasiva de Selena. 
— Se não formos honestas e francas uma com a outra - disse, com tranquila sinceridade -, não teremos a chance de nos conhecermos de verdade, e eu não quero perder esta oportunidade. O que acha de fazermos um pacto de dizer somente a verdade uma para a outra, e tudo o que realmente estamos sentindo? Isso vai exigir uma boa dose de confiança, mas estou disposta a tentar. E você?
As mãos de Selena fecharam-se em torno do volante, enquanto considerava aquela ideia.
— Sim - murmurou, afinal. — Sim! - declarou em voz alta, com um sorriso tímido e assentindo com vigor. 
Demi fez o primeiro teste no novo pacto. 
— Neste caso, gostaria de saber como é a sua mãe? 
— Gostaria, sim. 
— Isso é fácil - Demi começou, com uma expressão de contentamento. — Ela é muito parecida com a impressão que, até agora, eu tive de você. É bondosa, não gosta de ferir os sentimentos das pessoas. Adora roupas bonitas e trabalha na butique mais elegante de Bell Harbor. Todos que a conhecem a adoram, exceto Lydia, que é a dona da loja. Lydia a maltrata e amedronta terrivelmente e está sempre aproveitando-se da sua bondade, mas mamãe inventa desculpas para tal comportamento. - Demi interrompeu-se ao ver a entrada do clube de campo. - Selena, não vamos jogar golfe. Vamos fazer qualquer outra coisa, em vez disso. 
— Mas papai quer que você tenha uma aula. 
— Eu sei, mas suponha que eu lhe diga que me recuso terminantemente a jogar. Neste caso, o que ele poderia fazer? 
Demi imaginou se ele iria esbravejar, enfurecer-se, ou coisa pior. O homem tinha um temperamento imprevisível. 
— Ele vai zangar-se com você? 
Selena ficou chocada com tal sugestão.
— Não, mas ficará extremamente desapontado.
— Entendo. Você diz ”desapontado” do jeito que ele ficou na quadra de tênis, hoje cedo?
— Sim, mas desta vez ele ficaria muito desapontado com nós duas. Hoje cedo, foi só comigo. — Ele não consegue superar os desapontamentos com a mesma rapidez e facilidade que outras pessoas - Selena explicou, como se este fosse um problema dela, e não do pai. Como se fosse um fato justificável que Demi deveria aceitar e compreender, da mesma forma que ela compreendia e aceitava.
Demi entendia perfeitamente: seu pai não era do tipo que se valia da violência física. Em vez disso, utilizava-se da tirania emocional, uma forma mais sutil porem igualmente eficiente de dominação brutal. 
— Se eu me recusasse terminantemente, então ele não poderia ficar desapontado com você, certo? 
— Não, creio que não.
— Você quer jogar golfe?
A hesitação de Selena prolongou-se tanto que Demi não teve certeza se ela não queria responder, ou se simplesmente não sabia o que queria. 
— Não, para dizer a verdade, não quero. Não gosto de jogar golfe tanto quanto papai desejaria. 
— Se pudéssemos fazer qualquer coisa que você quisesse, agora, o que seria? 
— Poderíamos almoçar em algum lugar, e ficar conversando. 
— Eu adoraria! E, desde que me recuso terminantemente a jogar golfe, ele não pode ficar desapontado com você, portanto vamos almoçar e conversar. 
Mordendo o lábio, Selena hesitou. Depois, virou o carro subitamente, entrando por uma rua lateral. 
— Conheço um lugar perfeito. É um tipo de café, e podemos almoçar na parte de fora. Ninguém irá nos incomodar ou nos apressar
Em Bell Harbor, um café era um lugar para lanches rápidos e informais, um tipo de lanchonete. Mas em Palm Beach, o ”café” para onde Selena a levara era um pretensioso restaurante francês, com uma pérgula na porta de entrada, um átrio envidraçado e uma fonte, e manobrista. 
O manobrista sabia o nome de Selena, bem como o maitre que as recebeu.
— Gostaríamos de almoçar lá fora, Jean - Selena informou, com aquele sorriso bem-educado que Demi passara a admirar depois de descobrir que era genuíno. 
— Posso lhes trazer algo para beber? - o maitre perguntou, depois que se sentaram a uma mesa perto da fonte, com vista para as lojas no outro lado da rua.
Selena olhou para Demi como se esperasse que ela decidisse, mas subitamente respondeu:
— Acho que vamos tomar champanhe. Traga-nos o melhor que tiver, para comemorarmos uma ocasião especial. 
— Um aniversário? - ele tentou adivinhar.
 Selena balançou a cabeça e olhou timidamente para Demi. 
— Digamos que seja um renascimento - disse. 
Quando o homem se afastou, seguiu-se uma pausa silenciosa, enquanto as duas tentavam pensar em como começariam a se conhecer. Na calçada ali em frente, passou uma jovem mãe empurrando um sofisticado carrinho de bebé, e um adolescente ultrapassou-a correndo com a bicicleta. 
— Ganhei minha primeira bicicleta de duas rodas quando tinha cinco anos - Demi falou para quebrar o silêncio. — Era grande demais para mim, e eu trombava com todos por quem passava, até que finalmente aprendi a me equilibrar. O guarda de trânsito da escola dizia que eu era um perigo.
—  Você sempre soube que queria ser uma designer de interiores? 
Embora Demi tivesse de ocultar algumas coisas sobre sua vida atual, estava determinada a ser honesta com Selena em tudo o mais. 
— Na verdade - confessou -, — Eu sempre quis seguir uma carreira do tipo Super mulher, ou Batgirl. E você? 
—  Assim que ganhei a minha primeira boneca, comecei a pensar num enxoval apropriado para ela - Selena admitiu. — Por isso, creio que sempre estive interessada em moda.
Um garçom chegou trazendo uma garrafa de champanhe num balde de prata, e Demi esperou que ele terminasse de servir as bebidas enquanto observava um casal de adolescentes passeando pela calçada de mãos dadas. 
— Eles parecem jovens demais para estar namorando, não acha? - comentou e, quando Selena assentiu, aproveitou a chance de mudar de assunto. — Quantos anos você tinha quando saiu com um rapaz pela primeira vez?
— Dezesseis - Selena respondeu. — O nome dele era David, e levou-me ao baile de formatura da escola. Eu queria ir com um garoto chamado Richard, mas papai conhecia a família de David e achou que seria um acompanhante mais aceitável. 
Aquilo deixou Demi intrigada.
— E como foi? 
— Terrível - Selena confessou com um sorriso e um estremecimento. — Depois do baile, quando me levou para casa, ele ficou bebendo o tempo todo. Então, parou o carro e começou a me beijar. E não queria parar, até que finalmente desatei a chorar. E o seu primeiro encontro, como foi? 
— Bem parecido com o seu - Demi respondeu, rindo. — Saí com Butch Bellamy, que era muito mais alto do que eu e não sabia dançar. Passou a maior parte da noite no vestiário, bebendo com os companheiros do time de futebol da escola.
 A caminho de casa, parou o carro e começou a me beijar e a me agarrar. 
Rindo, Selena adivinhou o fim da história: 
— E você também caiu no choro, para que ele a levasse para casa.
— Não. Disse-lhe que, se não me deixasse sair do carro, eu diria a todos os seus amigos do time que ele era gay. Então, tirei o meu primeiro par de sapatos altos e fui andando por quase três quilômetros, destruindo meu primeiro par de meia-calças. Você nem imagina como estavam, quando cheguei em casa. 
Selena tornou a rir, e Demi ergueu a taça para um brinde. 
— A nós, por termos sobrevivido aos nossos primeiros encontros - disse, sorrindo solenemente. 
O garçom retornou naquele instante, entregando-lhes um cardápio aberto. Ansiosa por manter a alegre camaradagem que se instalara entre elas, Demi espiou-a por cima do cardápio.
— Qual é a comida que você menos gosta?
— Couve-de-bruxelas. E você? 
— Fígado. 
— Dizem que se o fígado for preparado com... - Demi balançou a cabeça. 
— Não existe nenhuma maneira de se preparar fígado e deixá-lo comestível. Talvez não sejamos irmãs de sangue, no fim das contas. Talvez eu tenha sido adotada e... Por que está rindo? 
— Porque eu estava apenas repetindo o que as pessoas costumam dizer. Detesto fígado. Fico enjoada, só de pensar.
— O reflexo do enjoo é a prova definitiva. Somos parentes, não há mais dúvida - Demi decretou com animação, mas Selena ficou séria. 
— Ainda não temos certeza - ela sentenciou. — Esta é a pergunta definitiva, por isso pense bem antes de responder: como se sente em relação à sopa de tomate? 
Demi estremeceu e as duas caíram na risada. 
O garçom deixara uma cesta de pãezinhos frescos na mesa, e Selena pegou um.
—  Você já foi casada? - perguntou. 
— Não - Demi respondeu. — E você?
— Quase. Fiquei noiva aos vinte e cinco anos. Henry tinha trinta e dois, e nos conhecemos numa festa em Santa Barbara. Dois meses depois, ficamos noivos.
Demi fez uma pausa, enquanto escolhia um pãozinho. 
— E o que aconteceu? 
— No dia seguinte ao nosso noivado, papai descobriu que Henry tinha uma ex-mulher e dois filhos morando em Paris. Eu não me importaria com isso, contanto que ele não tivesse mentido quando me disse que nunca havia se casado.
— Deve ter sido horrível para você. 
— Foi, no início. Papai não havia confiado nele desde o começo.
Demi podia imaginar que tipo de apoio Selena devia ter recebido de Patrick Lovato, e sentiu uma pontada de tristeza e raiva, por sua irmã não ter podido contar com ela mesma, nem com sua mãe, para ajudá-la a atravessar um momento tão difícil. 
— E como seu pai descobriu tudo?
— Ele também é seu pai - Selena lembrou-a, com um sorriso maroto. Depois, respondeu: — — Quando Henry e eu começamos a namorar, papai decidiu investigá-lo, mas o relatório vindo da Europa só chegou depois que anunciamos o noivado. 
Demi tentou não demonstrar a desconfiança que os motivos e a integridade de Patrick começavam a lhe provocar.
— Ele costuma mandar investigar os seus amigos? 
Para choque de Demi, Selena assentiu como se esta fosse a coisa mais natural do mundo.
— Não apenas os meus amigos, mas também outras pessoas que ele não conhece e que começam a passar tempo demais em nossa companhia. Papai acredita que é melhor ser cuidadoso, no que se refere às pessoas com quem nos relacionamos. Ele não confia com muita facilidade. - Selena olhou para o pãozinho que tinha nas mãos, e depois novamente para Demi.
— Vamos mudar de assunto. O rompimento do meu noivado não merece nem mais um minuto do nosso tempo precioso. 

Depois disso as horas voaram, repletas de perguntas hesitantes, respostas sinceras e sorrisos calorosos, enquanto as duas estranhas, que se dispuseram a formar um laço de amizade, descobriam que este laço já existia. Ignorando os garçons, a comida e os olhares admirados dos homens que passavam, duas lindas morenas ficaram um longo tempo naquela mesa sob um guarda-sol listrado e, cautelosamente, construíam uma ponte para transpor trinta anos de distância. 

Esse capítulo ficou bem grande então irei dividi-ló em duas partes, o que acharam do capítulo? Bjs lindonas!!!

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