30/04/2016

sussurros na noite: capítulo 13 (Parte 2)


Sentada ao lado de Selena, enquanto enfrentavam o trânsito de fim de tarde a caminho de casa, Demi sentia-se como se a magia das últimas horas tivesse espargido sua beleza por toda a cidade de Palm Beach. Lá em cima, o céu era de um azul luminoso, as nuvens ainda mais brancas, mais macias. O mar estava mais majestoso, a praia mais bonita. As cores estavam mais vivas, os sons eram mais suaves, e o ar marinho que batia em seu rosto era como uma bênção, e não apenas uma brisa. 
No dia anterior, Selena e ela haviam sido duas pessoas estranhas que se consideravam adversárias. Agora, eram irmãs que pensavam uma na outra como aliadas. Olhou para Selena, e o sorriso que ela enviou-lhe em resposta estava repleto da mesma alegria e prazer que Demi sentia. 
— Não tivemos tempo de falar sobre você e Nicholas - Selena disse quando se aproximavam da casa. — O namoro de vocês é sério?
Demi hesitou, atingida pela súbita e desagradável percepção de que aquele novo, maravilhoso e frágil relacionamento com a irmã acabaria sendo comprometido, no futuro, pelas mentiras que ela e Nicholas eram forçados a lhe impingir. Se Nicholas não descobrisse nenhuma evidência capaz de incriminar Patrick, então ao menos Selena seria poupada da verdadeira razão de sua vinda a Palm Beach. Neste caso, Demi teria de inventar um motivo por ter mantido seu trabalho em segredo. Porem, se as evidências acabassem aparecendo, então Selena logo conheceria toda a extensão daquela farsa, e Selena tinha até medo de pensar em qual seria sua reação. 
De qualquer forma, Demi estava de mãos atadas. Não podia dizer nada que prejudicasse a investigação de Nicholas, portanto resolveu ater-se à verdade o máximo possível, para que Selena tivesse menos motivos para se sentir enganada, fosse lá qual fosse o desfecho com Patrick.
— Na verdade, somos apenas amigos - disse. — Eu estava... um pouco insegura com a ideia de vir para cá sozinha. Nicholas convenceu-me de que era a melhor coisa a fazer e... ofereceu-se para vir comigo. 
— Para lhe dar apoio moral - Selena concluiu. — Ele parece ser uma ótima pessoa. Alguém em quem a gente sabe que pode confiar.
Demi fez um lembrete mental de jamais guiar-se pelo julgamento de Selena acerca dos homens.
— E quanto a você e Joseph? - indagou, ansiosa em desviar o foco da conversa sobre si. - Patrick contou-me que vocês estão praticamente noivos. 
— Papai está determinado a fazer com que isso aconteça. Já lhe disse que não quero casar com Joseph, mas ele simplesmente não entende.
— Por que não quer se casar?
 Selena enviou-lhe um sorriso cativante. 
— Provavelmente porque Joseph é um homem belíssimo, brilhante e incrivelmente rico, e as mulheres caem aos seus pés. No entanto, ele também não quer casar comigo, por isso fizemos um acordo secreto que resolve todo o problema. 
— Que tipo de acordo? 
— Joseph não vai pedir-me em casamento - ela respondeu rindo, e fez a curva para os portões de entrada. Estes abriram-se automaticamente, sem que ela parasse para apertar nenhum botão, nem usasse qualquer tipo de dispositivo eletrônico. 
A atenção de Demi foi desviada para o sistema de segurança da casa, primeiro por pensar na segurança de Selena, e depois por perceber que tal informação também poderia ser muito útil para Nicholas. 
— Você nunca fica com medo, aqui?
— Medo de quê? 
— De ladrões, de pessoas que rondam à noite. Esta casa é do tamanho de um museu. Se eu fosse um bandido, calcularia que existe um bocado de coisas aí dentro que valem a pena ser roubadas.
— Estamos bem seguros - Selena afirmou. — Além das grades, temos raios infravermelhos cercando todo o perímetro do terreno. À noite, estes raios são ligados automaticamente com o sistema de alarme. Há também dez câmeras posicionadas em torno da propriedade. Você tem medo de ladrões?
— Eu... acho que estou sempre preocupada com a segurança - Demi respondeu, tentando ater-se à verdade o mais que podia, pelo bem do seu futuro relacionamento com Selena. 
— Então foi por isso que fez um curso de defesa pessoal - Selena concluiu, e logo tentou tranquilizá-la com mais informações: — Se você ficar preocupada, pode ligar qualquer televisor da casa e verá o que as câmeras estão mostrando.  Sintonize no canal noventa, e depois siga até o canal número cem. Estes irão lhe mostrar todas as imagens captadas por todas as câmeras da propriedade. Isto é, eu acho que são estes canais, mas Gary poderá lhe dizer ao certo. Vou perguntar a ele. Papai e Gary planejaram todo o novo sistema de segurança.
— Obrigada... - Demi falou, baixinho. 
— Além disso, se você escutar ou ver algo que realmente a deixe assustada, pode pegar qualquer telefone da casa, apertar a tecla de asterisco e ficar pressionando. Mas não tente fazer isso a não ser que acredite que haja mesmo algum problema. Certa vez, apertei a tecla acidentalmente, logo que o sistema foi instalado. Estava tentando abrir os portões pelo interior da casa, mas esqueci de apertar a tecla do interfone antes de pressionar a tecla de asterisco. 
— E o que acontece quando isto é feito?
— Tudo - Selena respondeu com um risinho. — Um alarme soa direto na delegacia de polícia, as sirenes na casa começam a tocar, e todas as luzes da propriedade, de dentro e de fora, acendem-se e começam a piscar.
Demi concluiu que aquele sistema era muito semelhante às instalações de segurança integrada com telefone, que causaram tantos problemas e dissabores a Karen Althorp e ao dr. Pembroke, em Bell Harbor. 
Selena fez a volta pela casa até uma garagem com espaço para seis carros, e uma das portas abriu-se automaticamente.
— Não vi você usar nenhum aparelho para abrir os portões, nem esta porta da garagem - Demi comentou. 
— Há um dispositivo eletrônico escondido em algum lugar nos nossos carros. Quando nos aproximamos da garagem, o dispositivo no carro dá um aviso ao dispositivo instalado na porta, e ela se abre. O mesmo se aplica aos portões de entrada.
— Parece que ninguém que não deva estar aqui é capaz de entrar ou sair da propriedade - Demi observou quando Selena entrou em sua vaga na garagem.
— Qualquer pessoa pode sair, desde que Nordstrom tenha dado permissão para entrar. Existem sensores sob o pavimento da entrada, que abrem os portões quando o peso de um carro passa sobre eles. Do contrário, Nordstrom teria de ficar à disposição para abrir os portões sempre que um caminhão de entregas ou um criado precisassem sair.
— Vocês realmente fazem parte da era eletrônica - Demi comentou, sorrindo.
 — Papai é extremamente cuidadoso com a segurança. 
Demi temia que, provavelmente, ele tivesse mais do que um motivo para agir assim. 

Gary Dishler materializou-se no vestíbulo, vindo de um comodo perto da escada, assim que Selena e Demi entraram. 
— A Sra. Lovato esteve procurando por você - ele disse a Selena. — Ela está lá em cima, em seus aposentos. 
— Está tudo bem com ela? - Selena indagou, preocupada.
— Se estiver sofrendo de alguma coisa, só pode ser de tédio - Gary assegurou-lhe.
Enquanto Selena confirmava com ele se eram os canais noventa e cem que exibiam as imagens das câmeras de segurança, Demi ficou observando o mordomo, que estava ali perto. Nordstrom tinha quase dois metros de altura, cabelos loiros, olhos azuis, um rosto corado e o físico musculoso. Quando subiam as escadas, ela confiou seus pensamentos a Selena:
— Nordstrom parece mais um guarda-costas do que um mordomo. 
— Eu sei - Selena concordou, sorrindo. — Ele é realmente assustador.
Ainda estavam sorrindo quando entraram no quarto de Marie Lovato. A velha senhora estava sentada numa poltrona de veludo cor de vinho com franjas nas bordas, nos fundos de um quarto que era quase do tamanho da casa inteira de Demi, e entulhado com tantos móveis escuros e ornamentados que Demi sentiu-se ligeiramente claustrofóbica
A Sra. Lovato resmungou baixinho enquanto tirava os óculos e deixava o livro de lado. 
— Vocês ficaram fora a tarde toda - acusou. - Bem dirigiu-se a Selena -, — Como foi a aula de golfe de Demi? 
— Não fomos ao clube - Selena respondeu. 
As sobrancelhas brancas de Marie arquearam-se, mas antes que ela dissesse qualquer coisa Demi adiantou-se. Tentando ao mesmo tempo proteger Selena da desaprovação da senhora, bem como melhorar seu humor, Demi deliberadamente transformou sua recusa em jogar golfe numa brincadeira:
— Selena quis obrigar-me a jogar golfe, mas eu implorei por piedade; depois, recusei-me a sair do carro. Ela bem que tentou puxar-me para fora, mas sou mais forte. Ela até tentou me bater com um taco de golfe, mas então lembrei-a de que a senhora não aprovaria um espetáculo público como aquele, e ela teve de desistir.
— Você está sendo impertinente - Marie declarou, mas estava encontrando dificuldades em manter a expressão severa. 
Demi deixou que seu divertimento aflorasse. 
— Sim, senhora, eu sei. Mas parece que não consigo evitar.
— Já lhe disse para chamar-me de bisavó! 
— Sim, bisavó - Demi apressou-se em corrigir, pressentindo que, se cedesse naquele ponto, talvez pudesse atingir seu objetivo. E estava certa, pois os lábios de Marie curvaram-se num sorriso relutante.
— É também abusivamente teimosa
Demi assentiu, com um ar travesso.
— É o que minha mãe costuma dizer. 
Vendo-se a ponto de perder aquele embate verbal, Marie salvou-se dispensando Demi com um aceno de mão.
 — Pode sair. Já aguentei o bastante. Preciso falar com Selena em particular.

Satisfeita em saber que Selena não seria repreendida pela aula de golfe malograda, Demi fez o que a senhora dizia, mas não antes de reparar na expressão atônita da irmã.

Depois que Demi saiu, Marie indicou a poltrona à sua frente.
— Sente-se. Quero saber o que vocês fizeram e sobre o que conversaram. 
— Almoçamos no Lê Gamin e conversamos sobre tudo - Selena respondeu, sentando-se.
Por mais de uma hora, tentou repetir o que Demi dissera, mas era constantemente interrompida pelas perguntas penetrantes da bisavó.
— Foi maravilhoso! - Selena exclamou quando a inquisição finalmente parecia encerrada. — Eu teria ficado ali o resto do dia e a noite inteira. Demi sentiu-se da mesma forma, eu sei.
 — E agora - Marie falou, com frieza -, — Suponho que esteja querendo ir até Bell Harbor para conhecer sua mãe. 
Selena preparou-se para uma enxurrada de oposições, mas não recuou como normalmente faria. 
— Sim, para dizer a verdade, eu gostaria. Demi contou-me tudo sobre ela, e não é nada como papai e a vovó descreveram. 
— Você conhece Demi há menos de dois dias, e está mais disposta a acreditar na palavra dela do que na de Patrick e sua avó
Selena concentrou-se no que ia dizer, para não gaguejar. 
— Não estou acreditando na palavra de ninguém. Simplesmente quero tirar minhas próprias conclusões. 
Em vez de lhe passar uma descompostura verbal, como Selena esperava, a bisavó recostou-se na poltrona e encarou-a. Após um silêncio tenso e prolongado, disse: 
— Parece que a teimosia e rebeldia de Demi são notavelmente contagiosas.
— Espero que sim - Selena afirmou, empinando o queixo. 
— Se ainda estiver interessada no conselho de alguém sobre qualquer coisa, sugiro que evite compartilhar com seu pai esta nova opinião que tem de sua mãe. Selena assentiu e levantou-se. 
— Posso sair agora? 
— Fique à vontade - Marie respondeu. 
Marie Lovato observou-a sair do quarto e, por vários minutos, permaneceu imóvel e quieta, perdida em pensamentos. Depois, pegou o telefone ao lado da poltrona e discou um número particular, que não constava da lista.
— Tenho um serviço para você, Wilson - disse ao homem que atendeu. — Terá de ser feito muito discretamente e o mais rápido possível. 
Então, explicou a ele o que queria. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário