24/04/2016

sussurros na noite: capítulo 7


Já estava escurecendo quando Patrick Lovato desligou o telefone do seu escritório em casa e virou a cadeira giratória, olhando pela grande janela circular atrás dele. Os edifícios de San Francisco estendiam-se à sua frente, encobertos pela neblina - misteriosos, excitantes. Dali a duas semanas teria de trocar tudo isso pelos monótonos céus azuis de Palm Beach no mês de março, uma peregrinação que sua família fazia há gerações, uma tradição que sua avó não permitiria que fosse quebrada.
Nos últimos tempos, ele passara a encarar as idas de duas vezes por ano a Palm Beach como cada vez mais irritantes, como inevitáveis intromissões em sua vida, mas depois daquele telefonema que acabara de receber a viagem subitamente tornou-se repleta de possibilidades inusitadas. Permaneceu onde estava por quase uma hora, contemplando a complexa variedade de paisagens; depois, girou novamente a cadeira e apertou a tecla no telefone que ativava o interfone da residência.
 — Onde está a Sra. Lovato? - perguntou ao criado que atendeu.
— Creio que está descansando no quarto antes do jantar, senhor.
— E a minha filha?
— Creio que está com a Sra. Lovato, lendo para ela, senhor.
Satisfeito porque as duas estavam juntas, ele levantou-se e foi para o terceiro andar, onde, quarenta anos atrás, o arquiteto contratado pelo seu avô decidira que as suítes da família deviam se localizar. Ignorando o elevador, subiu pela larga escadaria cujo corrimão era de ferro negro trabalhado; depois virou à direita, seguindo por um corredor onde os retratos de seus ancestrais encaravam-no de suas molduras pesadas e ricamente ornamentadas.
— Fico contente por encontrá-las juntas - disse, quando Selena abriu a porta logo depois que ele bateu. 
O quarto sempre lhe provocava claustrofobia, com suas cortinas de brocado cor de vinho perpetuamente fechadas a fim de bloquear a luz das janelas, e o enjoado perfume de lavanda pairando no ar. Tentando não permitir que isso o deprimisse, passou o braço em torno dos ombros de Selena e sorriu para a avó, que estava sentada numa poltrona rebuscada perto da lareira. Com os cabelos brancos presos num coque e o corpo frágil coberto por um vestido cinzento, cuja gola alta era fechada com um enorme broche de rubis e filigranas, Marie Lovato parecia uma abastada Whistler’s Mother, exceto que sua coluna era bem mais rígida. 
— O que foi, Patrick? - ela inquiriu com sua voz imperiosa. — Seja breve, sim? Selena estava lendo para mim, e estamos numa parte muito boa da história. 
— Tenho uma ótima novidade para vocês duas - ele disse, e esperou educadamente que Selena se sentasse. — Demi acabou de me ligar - prosseguiu. — Ela mudou de ideia e decidiu juntar-se a nós em Palm Beach. Ficará conosco por duas semanas. 
A avó relaxou, recostando-se na cadeira, e Selena levantou-se da sua num pulo, suas expressões tão opostas quanto as reações físicas à notícia. 
— Você agiu muito bem - a avó lhe disse, com um majestoso inclinar de cabeça e um leve estreitamento nos lábios, que era o mais próximo que podia chegar de um sorriso. 
A Selena fitou-o como um tenso puro-sangue prestes a saltar um obstáculo. 
— O senhor... o senhor não pode simplesmente entrar aqui e dar uma notícia destas na última hora! Pensei que ela não iria. Isso não é justo. Eu não deveria ser obrigada a lidar com essas coisas. Não quero ir a Palm Beach! 
— Selena, não seja ridícula. É claro que você vai para Palm Beach. - Patrick virou-se para a porta, dizendo as últimas palavras com toda educação, mas com o silencioso poder de um decreto. — E quando estivermos lá - acrescentou, voltando-se para encará-la -, espero que passe o maior tempo possível em companhia de Joseph. Como espera casar com o sujeito se o evita em todas as oportunidades possíveis?
— Eu não estive evitando-o. Ele estava na Europa! 
— Pois estará em Palm Beach. Você pode compensar o tempo perdido, enquanto estiver lá.


Courtney Jonas encarapitou-se no braço de uma poltrona de couro diante da escrivaninha do irmão, observando-o guardar várias pastas de papéis em duas maletas de mão. 
— Você acabou de chegar da Europa e já está indo embora novamente - queixou-se. — Passa mais tempo fora do que aqui em casa.
Joseph dispensou um rápido olhar para a meia-irmã de dezessete anos, que usava uma saia preta justa e brilhante, que mal lhe cobria as coxas, e uma blusinha pink que mal lhe cobria os seios. Tinha a aparência de uma adolescente linda, intratável e super mimada com uma constrangedora preferência por roupas indecentes, o que, na opinião dele, aplicava-se a ela perfeitamente.
— Afinal, onde é que você compra estas roupas? - ele inquiriu.
— Acontece que estou vestida na última moda, a minha moda - ela informou. 
— Pois parece uma prostituta. - Courtney ignorou o comentário. 
— Quanto tempo vai ficar fora, desta vez? 
— Seis semanas. 
— Negócios ou prazer?
— Um pouco de cada. 
— Foi assim que descreveu aquela viagem que fiz com você para Colômbia - ela disse, com um estremecimento eloquente. 
— Choveu o tempo todo, e seus amigos ”empresários” carregavam metralhadoras. 
— Isso não é verdade. Os guarda-costas deles tinham metralhadoras. 
— Os empresários também tinham armas. Pistolas. Eu vi. 
— Ora, você teve uma alucinação. 
— Tudo bem, você está certo, eu estou errada. Foi no Peru que seus sócios nos ”negócios” tinham armas aparecendo nos bolsos dos paletós, e não em Colômbia.
— Agora me lembro porque desisti de levá-la comigo nas minhas viagens de negócios. Você é uma chata.
 — Sou observadora. - Uma folha de papel escorregou da mesa para o chão, e Courtney abaixou-se para pegá-la e entregou a ele. 
— Seja o que for, dá na mesma - ele disse enquanto pegava o papel, dava uma olhada e o juntava aos outros na maleta. — No entanto, acontece que estou indo para Palm Beach desta vez, não para Colômbia ou Peru. Palm Beach... lembra-se? É onde nós temos uma casa. Vamos todos os anos, nas suas férias de inverno. Seu pai está lá agora, e você e eu estaremos lá amanhã. 
— Este ano eu não vou. Papai vai passar o tempo todo no campo de golfe. Você vai passar o tempo todo numa sala fechada, seja numa porção de reuniões ou em conversas pelo telefone. E, quando não estiver fazendo isso, estará a bordo do apparition... numa porção de reuniões ou em conversas pelo telefone.
— Do jeito que fala, parece que sou o sujeito mais sem graça do mundo. 
— Você é sem graça... - Joseph ergueu os olhos para ela e a mudança quase imperceptível em sua expressão fez com que Courtney se corrigisse rapidamente: — Quero dizer que tem uma vida sem graça. Só trabalho, nenhuma diversão.
— Um contraste gritante com a sua vida. Não é de admirar que não veja nenhum mérito na minha. 
— Que dama de sorte será o fugaz objeto de sua atenção sexual, enquanto estiver em Palm Beach?
— Você está pedindo umas palmadas. 
— Estou velha demais para palmadas. Além disso, você não é meu pai, nem minha mãe. 
— Isto só reafirma minha fé em Deus. - Ela decidiu mudar de assunto. 
— Ontem encontrei com Selena na Saks Fifth Avenue. Eles também estão partindo para Palm Beach. Sabe, Joseph, se não tomar cuidado um dia desses você acorda e vê que está casado com Selena. 
Ele jogou uma caneta-tinteiro de ouro e um lápis dentro da maleta e fechou-a com um gesto rápido. Depois, girou a trava com uma combinação secreta.
— Seria o casamento mais breve da História.
— Você não gosta de Selena? 
— Gosto, sim.
— Então por que não casa com ela?
— Porque não.
— Mas se Selena também quisesse casar como você, então se casaria com ela? 
— Não. 
— Por que não? 
— Cuide da sua própria vida, está bem? 
— Você faz parte da minha vida - ela retrucou, com doçura.
— Você é a coisa mais próxima que tenho de um parente. 
Aquela era uma manobra deliberada para amolecê-lo e manipulá-lo, e Joseph sabia disso. Era também bastante eficiente, de forma que ele ficou em silêncio e decidiu poupar o fôlego para a batalha que estava prestes a ter com ela sobre a viagem a Palm Beach. Seu pai estava pensando em ficar por lá permanentemente e matricular Courtney numa escola local, mas Joseph não tinha a menor intenção de envolver-se nesta guerra. 
— Você não quer casar-se com ninguém? 
— Não. 
— Por que não?
— Porque já tive esta experiência uma vez, e não gostei. 
— Blanda fez com que você ficasse completamente contra o casamento, não é? Selena acha que Blanda o fez desencantar-se de todas as mulheres. 
Joseph levantou os olhos dos arquivos que estava separando, com um franzido de impaciência na testa. 
— Ela acha o quê
— Selena não sabe nada a respeito das mulheres que você leva para o iate, ou sobre aquelas que se esgueiram para fora dos quartos de hotel, como eu vejo nas raras ocasiões em que você me leva para algum lugar. Ela acredita que você é um homem ferido, nobre e celibatário. 
— Ótimo. Deixe que ela continue acreditando nisso. 
— Tarde demais. Desculpe. Eu contei tudo a ela, sobre estas mulheres. Toda a terrível, sinistra verdade. 
Joseph estava escrevendo um bilhete para a secretária, mas não parou de escrever, nem perdeu a concentração. 
— Vou levá-la comigo para Palm Beach. 
— De jeito nenhum! Você não pode me obrigar! 
Ele parou de escrever e enviou-lhe o olhar fulminante que fazia seus contemporâneos estremecerem. 
— É o que veremos - disse, calmamente. — Agora, comece a arrumar as malas.
— Não. 
 — Tudo bem. Vou levá-la do jeito que está, e você terá de passar o resto de seus dias com essa roupa horrível que está usando agora. Você decide.
— Você está blefando.
— Eu nunca estou blefando. Você devia saber disso melhor do que ninguém, depois de todos estes anos de confrontação. 
— Odeio você, Joseph. 
— Não ligo a mínima para isso. Agora, vá arrumar as malas e me encontre lá embaixo amanhã cedo.
Ela escorregou do braço da poltrona, os olhos brilhando com as lágrimas contidas. Mas as lágrimas eram inúteis. Ele era inflexível.

gente finalmente o Joseph apareceu e logo terá o encontro Jemi, espero que estejam gostando. 
bjs lindonas <3

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