03/08/2016

certain love: capítulo 32


— Joseph? - eu chamo, rolando para o outro lado da cama. Mais acordada, levanto a cabeça lentamente e vejo que ele não está ali.
Sinto cheiro de bacon.
Penso na noite que tivemos e não consigo tirar o sorriso evidente do rosto. Me desvencilho dos lençóis, me levanto e visto a calcinha e a camiseta.
Joseph está de pé diante do fogão quando entro na cozinha.
— Amor, por que acordou tão cedo?
Ando até a geladeira e abro a porta, procurando qualquer coisa para molhar a boca.
Preciso escovar os dentes, mas se ele está preparando o café da manhã, não quero que o gosto fique esquisito por causa do creme dental.
— Queria te levar café na cama.
Ele demorou alguns segundos a mais para responder do que eu acharia normal, e sua voz pareceu estranha. Tiro a cabeça da geladeira e olho para ele. Está parado ali, olhando para a frigideira.
— Amor, você tá bem?
Deixo a porta da geladeira se fechar e não recebo nenhuma resposta.
Ele mal levanta a cabeça para me olhar.
— Joseph?
Meu coração está batendo cada vez mais rápido, embora eu não saiba por quê. Me aproximo dele e ponho a mão no seu braço. Ele levanta a cabeça e me olha lentamente.
— Joseph...
Numa espécie de câmera lenta cruel, as pernas de Joseph se dobram e seu corpo desaba no chão de cerâmica branca, e a espátula que ele segurava cai junto com ele, espirrando óleo quente. Tento segurá-lo, mas não consigo mantê-lo de pé.
Tudo ainda está se movendo em câmera lenta: meu grito, minhas mãos segurando seus ombros, sua cabeça batendo no assoalho. Mas então, quando todo o seu corpo começa a tremer incontrolavelmente em convulsão, a ação acelera e fica apavorante.
— JOSEPH! MEU DEUS, JOSEPH!
Quero ajudá-lo, mas seu corpo não para de se agitar. Vejo o branco dos seus olhos, e seu maxilar crispado num esgar horripilante. Seus membros estão imóveis e rijos.
Grito de novo, com lágrimas chovendo dos meus olhos.
— Alguém me ajuda! - e então volto a mim e corro até o celular mais próximo. O dele está sobre o balcão. Digito 911, e nos dois segundos que levam para atender, fecho o gás do fogão.
— Por favor! Ele tá em convulsão! Por favor, alguém me ajuda!
— Moça, antes de mais nada, se acalme. Ele ainda está em convulsão?
— Sim!
Olho horrorizada para o corpo de Joseph se agitando no chão. Estou tão apavorada que sinto vontade de vomitar.
— Moça, quero que você tire de perto dele qualquer coisa com que ele possa se machucar. Ele está usando óculos? Sua cabeça pode bater em algum móvel ou objeto?
— Não! M-mas ele bateu a cabeça quando caiu!
— Tudo bem, ache alguma coisa para pôr debaixo da cabeça dele, uma almofada, algo para evitar que ele bata de novo.
Olho ao meu redor na cozinha primeiro, mas não encontro nada, então corro freneticamente para a sala de estar, pego uma almofadinha do sofá e trago de volta.
Solto o telefone tempo suficiente para enfiar a almofada por baixo de sua cabeça
agitada.
Oh, não... meu Deus, o que tá acontecendo com ele?
Encosto o telefone no ouvido de novo.
— Tá, já pus uma almofada debaixo da cabeça dele!
— Certo, moça - a atendente do serviço de emergência diz calmamente. — Há quanto tempo ele está em convulsão? Você sabe de algum problema que ele tem que possa causar convulsões?
— Eu-eu n-não sei, uns... dois minutos, talvez, três no máximo. E não, nunca vi nada assim acontecendo com ele. Ele nunca me contou de nenhum... - a ficha começa a cair: ele nunca me contou. Todo tipo de coisa começa a atacar minha mente, me fazendo apenas perder a calma de novo. — Por favor, manda uma ambulância! Por favor! Depressa! - estou engasgando com as lágrimas.
O corpo de Joseph para de se agitar.
Antes que a atendente possa responder, digo:
— Ele parou! O-o que é que eu faço?
— Tá, moça, quero que você vire o corpo dele de lado. Vamos mandar uma ambulância. Qual o endereço?
Enquanto o estou virando de lado, a pergunta me imobiliza.
Eu... eu não sei a porra do endereço! Puta que pariu!
— Eu-eu não sei o... - pulo de pé e corro até a pilha de correspondência sobre o balcão, descubro o endereço no primeiro envelope e leio para ela.
— Uma ambulância está a caminho. Quer continuar falando comigo até que ela chegue?
Não sei bem o que a atendente disse, ou se não disse nada, na verdade, e só imaginei, mas não respondo. Não consigo tirar os olhos de Joseph, deitado inconsciente no chão da cozinha.
— Ele tá inconsciente! Meu Deus, por que ele não acorda? - minha mão desocupada está sobre meus lábios.
— Isso não é incomum - ela diz, e finalmente volto a prestar atenção em sua voz. — Quer continuar na linha até a ambulância chegar aí?
— Sim, por favor, não desliga. Por favor.
— Tudo bem, estou aqui - ela diz, e sua voz é meu único consolo. Não consigo respirar. Não consigo pensar. Não consigo falar. Só consigo olhar para ele. Tenho medo até de me sentar no chão ao seu lado, e ele ter outra convulsão e eu estar no caminho.
Minutos depois, ouço uma sirene uivando na rua.
— Acho que chegaram - digo ao telefone com voz distante.
Ainda não consigo olhar para nada, a não ser para Joseph.
Por que isso está acontecendo?
Batem à porta e finalmente me levanto e vou correndo abri-la para os paramédicos.
Nem me lembro de ter largado o celular de Joseph no chão enquanto a atendente ainda estava na linha. Quando dou por mim, Joseph está sendo colocado numa maca e amarrado.
— Qual o nome dele? - uma voz pergunta, e tenho certeza que é de um dos paramédicos, mas não consigo ver o rosto dele. Só o que vejo é o de Joseph, enquanto o empurram porta afora na maca.
— Joseph Jonas - respondo baixinho.
Ouço vagamente o paramédico dizer o nome do hospital para onde ele será levado. E quando eles saem, fico parada ali, olhando para a porta, onde o vi pela última vez.
Levo vários longos minutos para voltar a mim, e a primeira coisa que faço é pegar o celular dele e procurar o telefone de sua mãe. Ouço-a chorar do outro lado quando conto o que aconteceu, e acho que ela derruba o telefone.
— Sra. Jonas? - sinto as lágrimas queimando meus olhos. — Sra. Jonas? - mas ela não responde mais.
Finalmente, visto uma roupa, nem sei o que vesti, pego a chave do carro de Joseph, minha bolsa e saio correndo. Dirijo o Chevelle por alguns minutos até me dar conta de que não sei aonde estou indo, nem onde estou. Encontro um posto de gasolina, pergunto como chegar ao hospital e eles me informam, mas mal consigo encontrar o caminho sem me perder. Minha cabeça não está funcionando bem.
Bato a porta do carro e corro para o pronto-socorro com a bolsa jogada no ombro. Se caísse, eu não iria nem notar. A enfermeira da recepção digita no teclado para conseguir informações, me aponta o caminho e vou parar numa sala de espera. E estou totalmente sozinha.
Acho que passou uma hora, mas posso estar errada. Uma hora. Cinco minutos. Uma semana. Não faz diferença, a sensação seria a mesma, para mim. Meu peito dói de tanto chorar. Já andei tanto de um lado para outro que comecei a contar as sujeirinhas do carpete enquanto vou e volto.
Mais uma hora.
Esta sala de espera é tão incrivelmente sem graça, com paredes marrons e bancos marrons bem dispostos em duas fileiras no meio da sala. Num relógio no alto da parede, por cima da porta, o ponteiro dos segundos gira e gira, e embora seja baixo demais para ouvir, minha mente acredita que consigo ouvi-lo. Há uma cafeteira e uma pia perto de mim. Um homem, acho acaba de entrar por uma porta lateral, encher um copinho de isopor e sair de novo.
Mais uma hora.
Minha cabeça dói. Meus lábios estão secos e rachados. Eu os lambo constantemente, o que só piora seu estado. Não vejo uma enfermeira passar por aqui há muito tempo, e começo a me arrepender de não ter parado a última que vi antes que ela desaparecesse no corredor longo, estéril e iluminado por lâmpadas fluorescentes que sai da sala de espera.
Por que essa demora? O que está acontecendo?
Bato a testa na palma da mão, e quando vou pegar o celular de Joseph na minha bolsa, ouço uma voz conhecida:
— Demi?
Eu me viro.
O irmão mais novo de Joseph, Nicholas, está entrando na sala.
Quero me sentir aliviada por alguém finalmente ter aparecido para falar comigo, para interromper essa sensação de um nada profundo e doloroso, mas não consigo ficar aliviada, pois só posso esperar que ele me conte algo terrível a respeito de Joseph.
Nicholas nem estava no Texas, até onde eu sei, e se ele apareceu aqui de repente, significa que pegou o primeiro voo de onde quer que estivesse, e as pessoas só fazem isso quando algo ruim acontece.
— Nicholas? - digo, com as lágrimas prendendo minha voz.
Nem hesito e corro para os seus braços. Ele me abraça forte.
— Por favor, me diz o que tá acontecendo? - pergunto, com lágrimas correndo novamente dos meus olhos. — O Joseph tá bem?
Nicholas segura a minha mão e me leva até uma cadeira, e me sento ao lado dele, apertando minha bolsa no colo, só para poder me segurar em alguma coisa. Nicholas é tão parecido com Joseph que meu coração dói.
Ele sorri com ternura para mim.
— Ele tá bem agora - diz, e essa frase tão curta basta para encher todo o meu corpo de energia. — Mas provavelmente não vai continuar assim.
E com a mesma rapidez, aquela energia esperançosa se esvai novamente, levando com ela outras partes de mim: meu coração, minha alma, aquele fiapo de esperança que mantive todo esse tempo, desde que tudo começou. O que Nicholas está dizendo... o que ele está tentando me dizer?
Meu peito estremece com as lágrimas.
— Como assim? - mal consigo dizer essas palavras.
Ele respira calmamente.
— Há mais ou menos oito meses - Nicholas diz com cuidado. — Meu irmão ficou sabendo que tinha um tumor no cérebro...
Meu coração se foi. Minha respiração se foi.
Minha bolsa cai no chão, espalhando tudo, mas não consigo me mover para pegála.
Não consigo mover... nada.
Sinto a mão de Nicholas pegando a minha.
— Por causa da doença do nosso pai, Joseph se recusou a fazer outros exames. Ele tinha outra consulta com o Dr. Marsters naquela mesma semana, mas não quis ir.
Mamãe e Kevin tentaram de tudo para que ele fosse se consultar. Até onde eu sei, ele chegou a concordar, mas acabou não indo porque o estado de papai piorou.
— Não... - balanço a cabeça sem parar, sem querer acreditar no que ele está me contando. — Não... - só quero expulsar as palavras dele da minha cabeça.
— Por isso Joseph e Kevin brigavam tanto - Nicholas continua. — Kevin queria que ele fizesse o que precisava fazer, e Joseph, teimoso como sempre, brigava com Kevin toda vez.
Olho para a parede e digo:
— Por isso ele não queria ver o pai no hospital... - a revelação me deixa ainda mais atordoada.
— Sim - Nicholas diz em voz baixa. — Por isso, também, ele não quis ir ao enterro.
Olho para Nicholas agora, com um olhar penetrante, mexendo meus dedos sobre os lábios.
— Ele tem medo. Tem medo que a mesma coisa aconteça com ele, que seu tumor seja inoperável.
— Sim.
Me levanto da cadeira num salto, quebrando um batom com o pé.
— Mas e se não for tão grave? - digo freneticamente. — Ele tá no hospital agora, eles podem fazer o que é preciso - começo a marchar para a saída. — Vou obrigar Joseph a fazer esses testes. Vai fazer forçado! Ele vai me ouvir!
Nicholas segura meu braço. Eu me viro.
— Pelo que estão verificando agora, as chances dele são muito pequenas, Demi.
Vou vomitar. Minhas bochechas parecem sentir milhares de agulhas quando mais lágrimas abrem caminho para a superfície. Minhas mãos estão tremendo também.
Toda a porra do meu corpo está tremendo!
Nicholas diz baixinho:
— Ele adiou demais.
Cubro o rosto com as mãos e soluço nelas, meu corpo inteiro se agitando, descontrolado. Sinto os braços de Nicholas me apertando.
— Ele quer te ver.
Suas palavras me fazem olhar para cima.
— Já foi levado pra um quarto, vou te levar pra lá. Espera aqui mais alguns minutos, e quando minha mãe sair do quarto, a gente vai pra lá.
Não digo nada. Fico ali parada, sem palavras... morrendo por dentro, é a pior dor que já senti.
Nicholas me olha mais uma vez para se assegurar de que o ouvi bem, e então diz cautelosamente:
— Volto já pra te buscar. Espera aqui.
Nicholas sai, e para não cair, me seguro na cadeira mais próxima e me sento. Não consigo nem enxergar direito, as lágrimas estão queimando meus olhos, escorrendo pelas minhas bochechas. Parece que alguém enfiou a mão no meu peito e arrancou meu coração.
Não sei se vou conseguir vê-lo sem perder completamente o juízo.
Por que ele fez isso?
Por que isso está acontecendo?
Antes que eu fique completamente louca e comece a quebrar tudo ou bater nas coisas e me machucar, engatinho procurando minha bolsa no chão. Nem notei que Nicholas recolheu tudo, devolveu dentro e deixou a bolsa na cadeira. Procuro meu celular e ligo para Selena.
— Alô?
— Selena, eu-eu preciso que você faça uma coisa pra mim.
— Demi... você tá chorando?
— Selena, por favor, me escuta.
— Tá, sim, eu tô aqui. O que aconteceu?
— Você é minha melhor amiga - digo. — E preciso que você venha pra Galveston. Assim que puder. Você vem? Preciso de você. Por favor.
— Meu Deus, Demi, o que tá acontecendo? O que foi? Você tá bem?
— Não aconteceu nada comigo, mas preciso de você aqui. Preciso de alguém, e só tenho você. Minha mãe não vai en... Selena, por favor!
— T-tudo bem - ela diz, com a voz cheia de preocupação. — Vou pegar o primeiro voo. Eu vou pra aí. Não desgruda do celular.
Deixo a mão cair para o lado, esmagando o celular no meu punho, e olho para a parede pelo que parece uma eternidade até que a voz de Nicholas me tira do transe.
Olho para ele. 
Nicholas vem até mim e pega minha mão, sabendo que vou precisar disso. Minhas pernas parecem frágeis, como se eu estivesse andando com próteses e não soubesse usá-las direito. Nicholas aperta minha mão tão forte. Saímos para o corredor iluminado e vamos até um elevador.
— Preciso me acalmar - digo em voz alta, mais para mim mesma do que para Nicholas.
Tiro minha mão da dele, passo no rosto e corro os dedos pelo cabelo no alto da minha cabeça. 
— Não posso ficar histérica na frente dele. A última coisa que ele precisa agora é ficar tentando me acalmar.
Nicholas não diz nada. Não olho para ele. Vejo nossa imagem refletida na porta do elevador, distorcida e sem cor. Noto que os números no elevador indicam que subimos dois andares, e então ele para. 
A porta se abre. 
Fico ali parada, de início, com medo de sair, mas então respiro bem fundo e enxugo os olhos de novo. Andamos para o meio do corredor, até um quarto com uma grande porta de madeira que está semiaberta. Nicholas abre completamente a porta, mas eu olho para o
chão, para a linha invisível que me separa, no corredor, de Joseph, dentro do quarto, e estou com tanto medo de cruzá-la. Sinto que quando eu o fizer, verei que tudo isso é real e que não tem volta mesmo. Fecho os olhos com força e contenho uma nova onda de lágrimas, respirando profundamente, com a bolsa nos punhos cerrados.
E então abro os olhos quando a mãe de Joseph aparece.
Seu rosto suave está esgotado pela emoção, como sei que o meu também deve estar.
Seu cabelo está desgrenhado. Suas pálpebras estão inchadas. Mas ela consegue sorrir amorosamente para mim, tocando meu ombro com delicadeza.
— Que bom que você está aqui, Demi.
E então ela sai do quarto, de mãos dadas com Nicholas.
Olho para eles por um breve momento enquanto se afastam pelo corredor, mas suas silhuetas parecem se confundir com o resto.
Da porta, olho para dentro do quarto e vejo o pé da cama onde sei que Joseph está deitado.
Entro no quarto.
— Amor, vem cá - Joseph diz ao me ver.
De início fico imóvel no lugar, mas quando olho nos seus olhos, naqueles olhos inesquecíveis que têm tanto poder sobre mim, largo a bolsa no chão e corro para a cama.

Esse capítulo quebrou meu coração :( O que acham que vai acontecer? Ta acabando :(
Comentem e até o próximo, bjs lindonas <3

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