sussurros na noite: capítulo 23

Nicholas estava sentado perto da piscina, observando a equipe de investigadores vasculhar meticulosamente as sebes e arbustos nos fundos da casa. 

— Estão procurando a arma - disse a Demi, quando ela sentou-se na beirada de uma cadeira ao lado. 
Demi assentiu distraída e afastou os cabelos da testa. 
— Gary Dishler estava à sua procura - Nicholas acrescentou.
— Jonas ligou duas vezes e quer que você ligue para ele... imediatamente. A equipe de investigação da cena do crime não o deixa passar pelas barreiras. 
— Gary já me avisou. Vou até a casa de Joseph, mas primeiro preciso falar com você.
Nicholas percebeu a tensão na voz dela, viu como estava pálida, e sentiu-se mais culpado naquele momento do que se sentira em muitos anos. Demi estava passando por um inferno, e ele ainda iria tornar as coisas mil vezes piores para ela. Teve um súbito impulso de puxá-la para seu lado, erguer-lhe o queixo e implorar pelo seu perdão com antecedência. Perdoe-me, Demi. Você não merecia isso. Tenho me sentido tão orgulhoso de você, nestes últimos dias. Acho que você é maravilhosa.
 — O que é? - perguntou.
— Estive seguindo Selena e o tenente Fineman enquanto faziam a ronda pela casa, e consegui entreouvir algumas conversas sem ser percebida. Não está faltando nada, Nicholas. Ninguém arrombou a janela e nada foi roubado, exceto o anel de diamante. Vi quando a equipe de investigadores retirou os cacos de vidro da janela quebrada. A maior parte estava nos arbustos do lado de fora, e não dentro da sala. Alguém planejou assassiná-la. E acredito que pretendia simular um assalto que saiu errado. E também acredito que o assassino seja alguém que more nesta casa, alguém que ela conhecia.
Nicholas estava ouvindo com atenção, mas esta atenção foi desviada no instante em que Selena surgiu na varanda trazendo uma bandeja com refrescos.
— Concordo com você - ele disse. 
— Eu vou acabar me tornando a principal suspeita.
Ele fitou-a num relance. 
— Você? Por quê? 
— Sou a filha abandonada, lembra-se? Venho aqui pela primeira vez em minha vida, Marie é assassinada e o anel desaparece. 
— Um crime cometido por ressentimento, ou vingança? Ora, Demi, se este fosse um motivo, você teria escolhido o bom e velho Patrick, que a negligenciou até agora, ou talvez Selena, que desfrutou de todos os benefícios em seu lugar. 
Num certo sentido, Demi sabia que ele estava certo, e sentiu-se um pouco melhor. 
Nicholas continuou observando Selena por um momento, vendo-a parar para conversar gentilmente com cada um dos integrantes da equipe de buscas, e lhes oferecer um refresco gelado. Depois, voltou novamente a atenção para Demi e tentou infundir-lhe um pouco mais de confiança; 
— Agora, se você fosse beneficiária do testamento de Marie, o caso seria diferente. Demi sorriu com a lembrança. 
— Ela queria me tornar beneficiária. Chamou-me um dia destes no solário e tentou me dar uma jóia de família, antes de começar a falar sobre mudar o testamento. Eu me recusei a discutir o assunto, e também não aceitei a jóia. 
O sorriso de Nicholas desapareceu abruptamente.
— Por acaso você mencionou isso a Selena?
— Acho que não... sim, eu contei a ela. O assunto surgiu quando estávamos almoçando, naquele mesmo dia. 
A expressão de Nicholas ficou tensa, e ele virou-se novamente para Selena, observando-a com uma intensidade fulminante. 
— Filha da puta! - murmurou, furioso.
— Você não pode estar pensando o que eu acho que está pensando! 
Ele não parecia tê-la ouvido; era como se cada fibra de seu ser estivesse concentrada na cena que observava. 
— Aquela filha da puta! - repetiu, em voz baixa. 
— Você está sendo ridículo, Nicholas! - Demi agarrou-lhe o braço para obter sua atenção, e ele desviou os olhos de Selena. 
— Estou mesmo? - ironizou, num tom cortante. — Pare de agir como uma cega idiota em relação à sua irmã, Demi. Abra os olhos! Esta é a realidade: sua irmã não queria que você viesse para cá, desde o início. Nunca tive coragem de lhe dizer, mas fiquei sabendo pelo nosso informante. 
Demi não lhe deu a menor importância. 
— Eu já sabia disso, Marie me contou. Por toda sua vida, Selena foi levada a acreditar que minha mãe e eu éramos uma espécie de escória... ou algo pior. É claro que se sentiu assim, a princípio, mas tudo mudou depois que nos conhecemos. 
— Certo - ele zombou. — Selena precisou de menos de um dia para alterar por completo os sentimentos de uma vida inteira. Em um só dia, transformou-se na sua adorável irmã mais velha. Não acha que isso é ser um tanto ”boazinha” demais? 
— Não! Não acho!
— Então pense no seguinte: durante trinta anos ela foi submetida a uma escravidão emocional pelo seu pai e sua bisavó. Mas de repente você chega e, em menos de uma semana, a bisavó passa a esbanjar atenções e afeto por você; depois, quer dividir com você a parte do dinheiro que cabe a Selena. Você não apenas roubou de Selena o amor e o dinheiro da bisavó, mas também o homem com quem ela deveria se casar. E, depois de tudo isso, ainda acha que Selena não a odeia? E por falar nisso, não acha um tanto estranho que a ”doce, delicada e tímida” Selena pilote helicópteros como passatempo?
 — Você não a entende... 
— Nem você - ele disparou. — Seria necessária uma equipe inteira de psiquiatras para entendê-la, e eu teria até medo de ler os seus relatórios. 
Assombrada com tudo aquilo, Demi encarou-o. 
— Você a odeia, não é?
— Odiá-la? - Nicholas emitiu um risinho tenso. — Na maior parte do tempo, morro de medo dela.
— Meu Deus, eu acho que ela está apaixonando-se por você, e você a considera um tipo de monstro! 
— Ou ela é um monstro, ou é uma santa. Como não acredito em santas, sobra apenas o monstro. 
Demi balançou a cabeça, perplexa e imensamente triste. 
— Pensei que você gostasse dela. Pensei, mesmo. - Não conseguia tirar os olhos do rosto dele, tentando encontrar alguma pista do homem que ele realmente seria. — Sei que esta missão é apenas ”trabalho” para você, mas muitas vezes o apanhei observando Selena com um sorriso engraçado... um sorriso quase afetuoso.
 — Ela é fácil de se observar - ele retrucou, ríspido — Olhe só para ela... - Fez um gesto indicando Selena que conversava com um dos investigadores. — É linda, graciosa, bem-nascida. E um pouquinho tímida, até conhecê-la melhor, e então desabrocha bem diante dos seus olhos, e faz você acreditar que seja por sua causa.
Demi ficava cada vez mais surpresa. Não havia se enganado ao julgar que Nicholas se sentia atraído por Selena. Ele estava muito atraído... só que contra a própria vontade. Demi achou aquela situação encorajadora e divertida.
— Diga-me uma coisa - falou. — Se Selena fosse todas as coisas boas que você mencionou, e nenhuma das coisas más e doentias que você pensa que seja, então, como você a descreveria? 
Os olhos de Nicholas desviaram-se com certa relutância do objeto da discussão no instante em que ela tornou a entrar na casa.
— Eu a descreveria como um milagre.  
Demi levantou-se, reprimindo um sorriso. 
— Para mim isso basta - disse. Nicholas encolheu os ombros. 
— Infelizmente, não acredito em milagres.
Enfiando as mãos nos bolsos de trás da calça, Demi encarou o homem à sua frente. 
— Selena é igualzinha à minha mãe... As duas são como pequenos salgueiros. Parecem frágeis e inclinam-se sob a menor brisa, mas nem o vento mais forte é capaz de quebrá-los. Elas são assim. De alguma forma, sempre encontram um motivo, um meio para continuar lutando. No início, dão a impressão de ser fracas e de que precisam de cuidados, e precisam mesmo. Só que, enquanto você está cuidando delas, elas é que cuidam de você. Minha mãe sempre me surpreendeu, e até agora eu nunca havia encontrado ninguém como ela. Mas minha irmã Selena é exatamente igual a ela. 
Nicholas olhou-a com firmeza, tentando decidir se lhe mostraria ou não a verdade, e decidiu que sim. 
— Você está enganada, Demi - disse, em voz baixa. — Esta pessoa que descreveu não é Selena. É você. 
Levantou-se e se afastou, deixando-a parada ali, atônita e boquiaberta.
— Sr.Parker? - Nicholas vírou-se ao ouvir a voz do mordomo. — Há um telefonema urgente para o senhor, do seu escritório. 
Nicholas correu para seu quarto e pegou o telefone. Era a ligação que tanto estivera esperando, e a notícia não apenas era boa, como também chegara um dia antes.
— Nicholas - o outro agente falou, usando termos que fariam sentido somente para Nicholas, enquanto relatava que um juiz federal acabara de assinar um mandado de busca autorizando o FBI a revistar todas as embarcações pertencentes a Jonas. — Desculpe atrapalhar suas férias, mas tenho ótimas notícias. O cliente assinou o contrato. Está bem aqui, na minha mão. Quer deixar para amanhã ou prefere que eu vá até aí hoje mesmo, para que você também assine?
— Hoje mesmo, sem dúvida. A família Lovato não sentirá minha falta, nem se incomodará se eu sair, porque houve uma morte na família.
— Sim, eu fiquei sabendo. Muito triste. - O homem fez uma pausa de um instante, para dar a impressão de que se importava. Depois, perguntou a Nicholas se ele queria que apenas o FBI estivesse envolvido quando abordassem as embarcações, ou se Nicholas desejava também a participação da Guarda Costeira e/ou do Departamento de Álcool, Tabaco e Armas de Fogo: — Há uns dois detalhes sobre a apólice de seguro em grupo que não estão bem claros. Você quer uma cláusula de exclusão para os fumantes? 
— Não, não precisa excluí-los. 
— E quanto à cobertura para morte por acidente?
— Pode incluir, também. Isso nos dará maior segurança e uma menor margem de erros, não importa o que aconteça. A que horas você acha que conseguirá fechar todo o pacote?
 — Já havíamos adiantado nossos planos, na esperança de que o cliente assinaria o contrato. Terei tudo pronto em uma ou duas horas, se me apressar.
— Então se apresse. Encontro você no local do serviço e lhe mostro tudo pessoalmente. Se pudermos concluir antes do anoitecer, melhor ainda. 
Nicholas desligou o telefone e exalou um suspiro de alívio.

E aí gente o que acharam? E o Nicholas desconfiando da Selena e ainda vai investigar a vida do Joseph? O que acham que vai acontecer? Comentem, bjs lindonas <3