27/11/2017

begin again: capítulo 23


What you want?

– Por que você acha que tem de escolher? – Louise pergunta. Deixo a cabeça cair para trás na cadeira e passo os olhos pelo consultório. Como sempre, está perfeitamente arrumado.
Já se passaram três semanas desde que beijei Joseph. O alívio que sinto por finalmente expressar minhas dúvidas é palpável.
– Isso é o que a gente faz, não é? Quando está dividida entre dois amantes? Não posso simplesmente ficar com dois homens, não dá.
– É interessante que você chame Joseph de “amante” ainda que só o tenha beijado uma vez. Por que você pensa assim?
– Não sei. – enrugo a testa e esfrego os olhos. – Acho que ele queria mais. – ou era eu que queria? Estou apenas projetando as emoções em Joseph? E se tudo o que ele queria era um caso rápido e descomplicado?
Ele com certeza teria escolhido a mulher errada para isso.
– Acha que a história que vocês tiveram juntos tem alguma coisa a ver com isso?
Contei tudo à Louise. Coloquei para fora todos os meus segredos como uma oferenda disfuncional. Compartilhei com ela assuntos que nunca tinha contado a alma nenhuma, nem mesmo à Selena. Ela ouve, sorri e mostra solidariedade. Sua aceitação me dá uma paz que eu não tinha antes.
– Talvez eu esteja colocando mais ênfase nisso do que deveria. Mas a maneira como ele olhou para mim quando fui embora, naquela noite, e o fato de não voltar à clínica por três semanas... – deixei a voz morrer. Nas últimas duas quintas, Joseph enviou um substituto. Michael é legal o suficiente. Bom com as crianças.
Mas ele não é nenhum Joseph.
– Certo, então vamos supor que ele queira algo mais. Ainda não é uma escolha simples entre dois homens. Você consegue pensar numa terceira opção, talvez?
– Ficar com os dois? – enrugo o nariz.
Louise começa a rir. É a primeira vez que eu a vejo ultrapassar um sorriso. Será que faz parte da sua formação tentar não demonstrar emoções violentas? Talvez só haja espaço para uma risada na sala de terapia.
– Não, eu não ia sugerir que você escolhesse poliamor, embora não descarte. Esse tipo de arranjo não é algo que a pessoa pode fazer inconsequentemente.
– Então o quê?
Ela não diz nada, outro truque. Louise usa silêncio da forma como um carpinteiro usa uma serra. Como se, aproveitando a deixa, eu apressadamente tentasse quebrá-lo.
– Escolher nenhum dos dois?
– Escolher você – ela corrige. – Concentre-se em si mesma. Descubra o que realmente quer. Ame-se, tanto quanto os outros amam.
Encaro-a como se ela estivesse falando uma língua estrangeira.
– Isso soa egoísta.
– Estudos mostram que os relacionamentos são mais propensos a ter sucesso se ambos os parceiros tiverem autoestima elevada. Não é egoísta cuidar de si mesma. Pense nisso como partir de bases fortes. Portanto, a pergunta que você tem de fazer a si mesma é: o que eu quero?.
Fico sentada em silêncio atordoado. Acho realmente que ninguém nunca me perguntou isso antes.

***

É estranho como a vida continua mesmo que esteja caindo aos pedaços. Às vezes me pergunto como minha avó lidou com os tempos de guerra. Separada do marido por seis anos, sem saber se ele estava vivo ou morto, mas ainda assim teve de varrer o chão, comprar os mantimentos e limpar os banheiros. Imagino que tenha comido bolo com amigas quando tinha os cupons de racionamento e que pensasse sobre as coisas mais mundanas. De alguma forma, os seres humanos têm a capacidade de sobreviver, não importa o que está jogado sobre eles.
Vendo Daisy levar lentamente o copo aos lábios, mãos trêmulas como as de um velho, fico maravilhada que mesmo ela tenha um instinto de sobrevivência que a obriga a seguir em frente. Poucas semanas depois de beijar Joseph, meu próprio instinto de sobrevivência é uma questão diferente. Eu o sufoco com preocupações com outras pessoas. Afogo-o com lágrimas alheias.
– Como ela estava? – pergunta Daisy. Está puxando a pele ao redor da unha do polegar. Uma pequena gota de sangue reluz ao sol antes que ela a limpe, uma manchinha cor de rubi escorrendo pelo polegar.
– Ela sente sua falta. – acho que Daisy precisa ouvir isso. – Ela quer voltar para casa, para você. A Grace comentou se isso está nos planos? – sei que Daisy se encontra com a assistente social todas as semanas.
Daisy dá de ombros.
– Ela não diz. Estamos com visitas supervisionadas apenas no momento. Até que eu possa provar que estou sóbria e que Darren não vai voltar, eles não vão deixá-la vir morar comigo. – sua voz é abafada pelo barulho de um motor de moto. Nós duas estamos esperando que passe.
– Ele não vai voltar, vai? – tento engolir a bile que vem subindo. A memória do corpo de Daisy sem vida passa por minha mente como um lampejo.
– Ele disse que não. – sua voz diminui e se torna um sussurro. – Quando eles o deixaram... sabe.
Acontece que não foi Darren que a espancou, não que isso importe, na realidade. Praticamente foi ele que a jogou nas mãos dos companheiros. Foi ele que ficou lá olhando-os acabar com ela e a deixar com um fio de vida. Darren envenena tudo o que toca, e não culpo a assistente social de Charlotte por querer mantê-lo longe dela.
– Por que você volta para ele toda vez? – dentre todas as pessoas, não deveria ser eu a fazer essa pergunta. É como perguntar a um viciado por que ele usa drogas.
Ou por que eu não consigo manter Joseph Jonas fora da minha mente.
– Eu o amo. – a resposta é tão simples que me faz querer chorar. Porque isso não é amor. É doentio e perverso e me deixa de coração partido. Daisy foi tão negligenciada quando criança que qualquer atenção significa amor no conceito dela.
– Mas o que dizer de Charlotte? E se ele algum dia deixar que a machuquem como ele machucou você?
Seu rosto se retorce diante da pergunta, seus lábios se transformam numa linha fina.
– Você está me dizendo que eu não amo minha filha? – uma mecha de seu cabelo loiro sujo cai nos olhos quando ela se inclina para frente. – Não se atreva a dizer isso, porra.
Recuo às pressas.
– Claro que não. Eu não quis dizer isso.
– É fácil pra cacete você me julgar, não é? Com seu marido rico, sua casa encantadora e nenhuma preocupação na vida. Talvez Darren estivesse certo sobre você.
Meu coração dispara. Nunca sou boa com enfrentamento.
– O que você quer dizer?
– Ele acha que sou o seu rascunho. Seu projeto. Ele acha que você não dá a mínima para mim e Charlotte, que você só fica perto de nós para se sentir melhor.
Suas palavras são um tapa na cara. Sinto a injustiça delas como se fosse uma coisa física.
– Isso não é verdade. Eu amo você e Charlotte. – quero dizer mais, mas minha voz enrosca na garganta, arranha a pele.
– Então por que você me julga? Só porque tem a maldita vida perfeita. Você nunca passou necessidade.
– Eu não queria passar essa impressão. Não posso suportar nem a ideia de Darren algum dia ferir vocês duas. Você merece coisa melhor.
– Se você acha que eu algum dia vou deixar qualquer pessoa machucar meu bebê, você não sabe de porra nenhuma. Não posso acreditar que sequer tenha dito isso. – ela puxa um cigarro e o desliza entre os lábios secos. – Se eu ficar sabendo que você disse qualquer coisa para os assistentes sociais, vou acabar com você.
Não acho que queira intimidar. É apenas o jeito dela, o jeito como ela tem de ser para conseguir sobreviver. A vida lhe ensinou que ou se luta ou se foge, e ela escolheu seguir seu caminho com violência nos momentos ruins. Parte de mim está feliz que ela esteja saindo dessa com os punhos erguidos, que ela não vai deixar que as coisas a derrubem. Contudo, quando sou eu na linha de tiro, é assustador.
A porta da cafeteria se abre com uma pancada, e a garçonete sai com a nossa comida. Um bolinho para Daisy e uma torrada para mim. Daisy tira as passas antes de espalhar manteiga no bolo, empilhando-as no canto de seu prato branco, até que pareçam um monte de moscas mortas. Passo uma camada fina de manteiga sobre minha torrada, embora não tenha apetite. O som da faca sobre o pão crocante é melhor do que o silêncio.
– Eu não quis me intrometer entre você e Charlotte – digo, terminando o restinho do chá morno. – Eu sei o quanto ela quer voltar para casa.
Daisy parece amolecer, embora eu não tenha certeza se são minhas palavras ou a comida em seu estômago que a suaviza.
– Quero que ela volte para casa. Não vou fazer nada que ponha isso em risco. – quando olho para Daisy, ela está me observando com olhos lacrimejantes, e sinto os meus também começarem a arder. Odeio que nada nunca venha fácil para elas. Era para ser tão simples, Charlotte uer estar em casa e Daisy quer que ela volte. Mas depois há as drogas e um namorado idiota e tudo fica confuso.
Como diabos a vida pode ser tão complicada?
– Então me ajude – Daisy pede. – Me ajude a trazer meu bebê para casa.
– Como?
– Diga à Grace que agora estou melhor. Diga que sou uma mãe adequada. Só quero ela de volta. Ela odeia ficar lá no abrigo.
– Eu sei. – meus dedos flexionam-se instintivamente com a lembrança da mão temerosa de Charlotte segurando a minha. – Quero que ela saia de lá tanto quanto você. Mas você vai ter de convencê-los de que está sóbria e que vai continuar assim.
– Eu estou. – a resposta de Daisy é veemente. – Eu não arriscaria Charlotte por causa de um barato.
Tento não pensar em todas as ocasiões em que ela fez exatamente isso. As vezes em que Charlotte encontrou a mãe gelada no chão, ou as noites em que Daisy desaparecia por horas, deixando a menina de 8 anos sozinha no escuro. A história nos ensina que a vida segue um padrão, que as coisas se repetem de novo e de novo. No entanto, a natureza humana nos faz ter esperanças de que isso não é verdade. Que dessa vez vai ser diferente.
– Você precisa provar que Darren não vai voltar mais. – quase vacilo dizendo o nome dele, esperando que ela brigue comigo novamente.
– Bom, ele não me quer de volta – diz ela.
Percebo que ela não está negando que ainda tenha sentimentos por ele, ou que vá sair correndo se ele estalar os dedos. Ela está presumindo que ele não vai voltar. Pelo que sei de Darren, é uma suposição perigosa de se fazer. Tento engolir o gosto ácido do medo dentro da minha boca, o amargor ardendo na minha língua. Só consigo pensar em Charlotte e no quanto sua vida é difícil, mesmo que sua idade não tenha ainda atingido a casa da dezena. Quando me vejo prometendo à Daisy que vou ajudar, é na súplica da filha que estou pensando. Minhas promessas parecem fracas, mesmo para meus próprios ouvidos. Mas o rosto de Daisy se ilumina como se eu tivesse acabado de lhe oferecer o mundo.
O mal-estar no ar é só meu e, mesmo que eu tente enterrá-lo, ele ainda perdura.

o que acham que a Demi vai decidir da vida dela?
a Louise tem ajudado bastante ela nas terapias de amor hahaha.
será que a Charlotte irá voltar para Daisy? e o Darren será que volta?
me digam o que acharam nos comentários, ok?
espero que gostem do capítulo, volto em breve.
respostas do capítulo anterior aqui.

2 comentários:

  1. Eu ainda não acredito que você escreva coisas tão maravilhosas assim. Que capítulo!
    Continua, tá? Amei!! Amo sua fanfic. Não desiste. ❤

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    1. Fico muito feliz que você goste amor, muito obrigada.
      Vou postar mais hoje e não vou desistir.
      Beijos, Jessie.

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