29/12/2017

begin again: capítulo 31


As long as it takes 

Passo a maior parte do fim de semana trabalhando. Em uma paródia estranha do que costumava ser o nosso casamento, Simon e eu nos sentamos à mesa da sala de jantar, olhando para nossos respectivos Notebook, parando de vez em quando para fazer uma xícara de chá um para o outro. Ele me fala sobre seu caso atual, uma disputa de uma década sobre os limites de uma propriedade e eu lhe ofereço histórias sobre encomendas de comida que tive de negociar. É tranquilo e leve, nada como a tensão dos últimos meses.
Em nenhum momento essa trégua me faz lamentar minha decisão. Se posso dizer alguma coisa, essa situação reforça que era o caminho certo. Renegociamos nossas posições, encontramos novas que nos deixam confortáveis na companhia um do outro. Se fôssemos adolescentes, eu diria que entramos na zona de amizade.
Na segunda-feira, luto contra a hora do rush matinal para me encontrar com Joseph. Ele me surpreendeu ao sugerir que nos encontrássemos às 9h, fazendo uma oferta de café e bolos. Concordei prontamente, embora eu sempre achasse que ele fosse do tipo que dorme até tarde.
Seu ateliê fica em um armazém antigo, convertido em uma série de salas pequenas, mas utilizáveis, a maioria das quais povoadas por um pessoal artista. Há ceramistas e tecelões de cestos, pintores e escultores. Quando vejo a luz entrar pelas janelas altas vitorianas, percebo exatamente por que eles todos ficam agrupados ali, o brilho do sol é como uma demão de cal sobre os tijolos marrons do armazém. Ilumina, faz tudo parecer muito claro. Lindo.
Ando pela varanda do primeiro andar e chego a um pequeno sótão no canto do prédio que abriga Joseph Jonas, o Artista. Embora eu esteja carregando uma bolsa enorme cheia de anotações e catálogos, a única coisa realmente pesada é essa sensação de desespero. A necessidade de vê-lo novamente puxa minha alma. Quanto mais me aproximo, mais meu coração começa a acelerar. Minha respiração fica rasa quando a porta dele entra no meu campo de visão. Tenho de me lembrar de que somos amigos, que esta é uma reunião de negócios. São 9h da manhã de uma segunda-feira, pelo amor de Deus, mas não consigo tirar esse sorriso bobo do rosto.
É o cheiro de café que me atinge primeiro. O aroma de grãos torrados escapa das frestas ao redor da porta metálica, sobrepujando o cheiro terroso de tinta e o odor marcante de terebintina, e me chama até que eu esteja batendo na porta dele.
– Oi. – ele parece sem fôlego quando abre, mas é seu sorriso que rouba o meu. A luz inunda pela janela atrás dele, projetando um brilho vago atrás de seu corpo.
– Oi para você também. Estou sentindo cheiro de café?
Ele balança a cabeça.
– Não, isso é o aroma amargo dos meus sonhos perdidos.
Ele pega minha bolsa sem perguntar e eu o sigo até o minúsculo enclave, olhando ao redor para me familiarizar. Uma das paredes é repleta de prateleiras cheias de tintas e pincéis e tudo o mais que ele possa precisar. A oposta tem desenhos pendurados em vários estágios de confecção: de leve rascunho a traços mais grossos a lápis. A terceira parede tem uma série de telas apoiadas umas sobre as outras, e são elas que chamam minha atenção. Lembro-me de como fiquei impressionada com as obras dele quando as vi pela primeira vez na galeria de Elise. As que estão aqui são tão incríveis quanto aquelas.
Quando olho para Joseph, ele está de costas para mim, mexendo com a cafeteira.
– Como você prefere? – pergunta, sem olhar em volta.
– O ateliê?
– Não, Demi, como você prefere o café? – ele se vira e olha para mim, com um divertimento que ilumina seus olhos.
– Bastante leite e dois cubos de açúcar, por favor.
Ele faz como pedi, resmungando algo sobre sacrilégio.
– O quê?
– Café não é sorvete. É para ser forte e amargo. – ele me dá uma caneca, e seus dedos tocam os meus por um breve instante. – Aposto que você adora um bom café com leite.
– E eu aposto que você só bebe café expresso. – tomo um gole, é quente e delicioso. – Você é um esnobe do café.
Quando ele ri, os cantos de seus olhos ficam vincados.
– Eu levo café muito a sério.
Eu percebo. Ele tem um canto no ateliê dedicado a isso. Um moedor, um pote com grãos, uma cafeteira e as canecas estão todos alinhados como um santuário à cafeína. Há algo muito característico de Joseph ali. Gosto dessas pequenas nuances em sua personalidade, os pequenos insights sobre que tipo de homem ele é. Um bom homem, eu acho. Gentil e forte.
– Em que você está trabalhando? – vou até a parede onde ele pendurou os esboços, estudando as linhas de seu lápis, querendo percorrê-las com os dedos.
Quando ele para atrás de mim, seu braço roça meu ombro, e ouço sua respiração suave enquanto ele observa os desenhos comigo.
– Um banco em Dublin encomendou dez quadros para o novo escritório. Estou trabalhando em algumas propostas para eles.
– Que legal. – viro-me e olho para ele, mas Joseph apenas dá de ombros.
– O garoto local se deu bem. Conta uma boa história, explica por que eles estão gastando tanto dinheiro em coisas inúteis.
– Não é qualquer garoto local – aponto. – Eles escolheram você. Isso tem de significar alguma coisa.
Ele é modesto demais para responder. Termino o café e lavo a caneca na pia.
Em seguida, sorrio para ele.
– Me mostra suas pinturas? – peço.
Ele começa a rir.
– O quê? Sem conversa fiada primeiro? Nenhuma discussão sobre técnicas ou seus artistas favoritos? Apenas um direto “põe pra fora”?
Inclino a cabeça de lado.
– Você quer preliminares artísticas? – um pequeno alarme começa a ecoar no meu cérebro. Eu o ignoro e em vez disso me concentro na forma como os lábios dele se curvam.
– Um artista gosta de ser cortejado. Palavras bonitas, pequenos elogios...
Quero dar um passo adiante e envolver seu pescoço com meus dedos, puxar sua cabeça para baixo até que os lábios pressionem os meus. Quero que ele tire tudo de cima da mesa velha com um movimento simples de braço e me deite sobre ela até ambos ficarmos ofegantes.
É por isso que recuo um passo.
– Nesse caso, por favor, você poderia me mostrar seus quadros, porque você é um artista incrivelmente talentoso e quero muito vê-los? – sarcasmo. Minha espada e meu escudo.
Ele percebe a mudança de tom e responde à altura.
– Eu só estava brincando. Sou como um homem que leva a foto dos filhos por aí. Basta tocar no assunto e começo a esfregar as fotos na sua cara, esperando que você me diga como são lindas as pinturas que faço. – ele indica a parede oposta com a cabeça. – Vou mostrar no que ando trabalhando.
Ele me fala sobre a exposição que está planejando para dali a alguns meses, vagamente intitulada “Corpos de arte”. Fico olhando para as pinturas que ele fez até agora, enquanto ele explica o conceito. Fico maravilhada com a forma como ele consegue escolher o tom certo de cor, como usa a textura certa para dar vida às suas pinturas. Ele me conta sobre o modelo que encontrou com queimaduras de terceiro grau, e o portador de psoríase cuja pele está praticamente saindo. Ele fala de densidade muscular e estrutura óssea, e me apego a cada palavra sua, como se fosse algum tipo de tiete de arte.
– Eu lhe mostrei isto? É o projeto do encarte de CD do Nicholas. – ele pega uma tela pequena, quadrada e segura-a para eu ver. O fundo branco está coberto com pinceladas coloridas, cada uma se curva sobre a seguinte. Os tons se misturam para formar uma silhueta no centro. – É um pássaro – diz ele, sorrindo ironicamente. – O álbum se chama Fear of Flying, ou seja, medo de voar.
– Igual ao nome da banda? É bonito. – na verdade, é lindo, mas sinto que já bajulei o suficiente. Como sempre, a maneira como ele sobrepõe as camadas de cores me faz querer tocá-las. Como se, ao senti-las, eu pudesse me conectar com Joseph.
Gostaria de saber se o desejo de tocá-lo nunca vai desaparecer.
– Eles parecem ter gostado. Vão usar camisetas da turnê. – seu olhar cruza com o meu. – Eu vou ser famoso.
Desta vez nós dois rimos.
Uma tela velha no canto, uma que não olhamos, chama minha atenção.
– O que é essa?
Ele guarda de novo a pintura que estava segurando e rapidamente responde:
– Nada.
Claro, sua resposta vaga me faz querer ver o quadro com mais detalhe. Dou um passo à frente e curvo os dedos em torno da moldura de madeira, tirando-a da parede. A primeira coisa que vejo é pele cor de creme, em seguida, um pescoço delgado, curvando-se em ombros delicados.
Um nu. Não sei por que me afeta. Talvez porque seja muito realista, e sei que ele precisou de uma modelo. Uma pontada de ciúme crava as garras no meu estômago assim que percebo que a imagem mostra praticamente tudo, exceto o rosto.
Joseph quase corre para arrancá-la das minhas mãos. Suas bochechas ficaram tão vermelhas quanto as minhas.
– Eu posso explicar...
– Você não me deve nada.
Ele continua como se eu não tivesse dito uma palavra.
– Eu terminei naquele verão. Foi provavelmente a única coisa que me manteve são depois que Digby morreu. Fiz esboço após esboço de memória, e de alguma forma finalmente a imagem surgiu. – ele ergue os olhos e parece envergonhado. – Eu nunca tinha mostrado a ninguém.
Levo um momento para registrar o que suas frases confusas querem dizer.
Pego a tela suavemente de suas mãos e a observo. Sigo com os olhos a curva dos meus seios, a maciez das minhas coxas. Quero chorar, porque é lindo. A garota que eu era, antes de tudo dar errado, está capturada para sempre em óleo e tela.
Pele sem mácula, sonhos intactos estão todos ali para serem vistos.
– Você guardou. – minha voz fica embargada, mas tento não chorar.
– Foi a única coisa que guardei. A única coisa boa daquele tempo. Aquelas últimas semanas passaram em branco. Tomamos droga demais e fizemos coisas loucas demais. Mas em algum lugar havia uma pequena semente de algo incrível.
Ele parece tão desolado que pego sua mão. Imediatamente, seus dedos envolvem os meus.
– É verdade – concordo.
Ficamos em silêncio por um instante. Estou consciente da maneira como ele está me segurando. Da maneira como ele está olhando para mim. A batida do meu coração é quase ensurdecedora.
– E agora? Ainda existe alguma coisa aqui? – ele pergunta.
Minha voz é um sussurro.
– Acho que sim.
Com cuidado, ele pega a tela e a coloca de volta no lugar. Em seguida, passa os dedos pelo meu rosto. Fico olhando para seus lábios, absorvendo a cor, a forma como eles tremem. Não consigo nem mesmo respirar, com tanto medo de que eu vá fazer alguma coisa, ou dizer alguma coisa, que estrague o momento. Em vez disso, fecho os olhos, sentindo o cheiro dele quando sua testa repousa na minha.
– Eu vou esperar o tempo que for preciso – ele me diz. – Vou estar aqui, você só tem que dizer as palavras.
Joseph tem cheiro de café e hortelã. Os dois perfumes se misturam enquanto ele respira lentamente, dentro e fora. Abro os olhos e o encontro olhando diretamente para mim. Tenho que engolir em seco antes de encontrar forças para falar.
– Você vai esperar por mim? – pergunto. – Porque não estou pronta, não agora. Com a separação e... – minha voz some.
Ele segura meu rosto nas mãos ásperas e beija minha testa suavemente. Seus lábios continuam ali quando ele começa a falar:
– O tempo que for preciso.

eu amei este capítulo, eu amo esses dois <3
Joseph sempre guardou a pintura dela.
ele vai esperar por ela, que lindo.
agora falta só a Demi saber o que ela quer.
espero que vocês tenham gostado do capítulo.
me digam o que acharam nos comentários.
respostas do capítulo anterior aqui.

2 comentários:

  1. velho, ele guardou a tela dela!! que coisa mais maravilhosa.
    nem preciso dizer nada, ne?
    ta incrivel, eu amei! continuar ❤

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  2. Sim, amo esses dois <3
    Fico muito feliz que esteja gostado amor.
    Vou postar mais hoje.
    Beijos, Jessie.

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